Não há Manezinho “de raiz” que não tenha brincado o Carnaval na veneranda rua Augusta – a João Pinto, onde navegava o velho “galeão” do Clube Doze de Agosto. Vendo as mulheres quase nuas nos blocos e nas Escolas de Samba de hoje, imagino o juízo que fariam dessas licenças as nossas bisavós da “Sociedade União Catharinense”, embrião do “Clube Doze”, lá pelos idos de 1851.

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A “Sociedade” incluía em seus regulamentos um severo artigo, segundo o qual “criados e escravos que acompanhassem os sócios aos salões (certamente para carregar algum peso ) não poderiam passar da primeira porta – e ali deveriam aguardar a volta dos seus senhores”.

Os códigos municipais proibiam, também, a participação de escravos no Carnaval, dispondo que “não se consentirá cativos no Entrudo, ou utilizados por seus patrões neste divertimento, sob pena de 24 horas de cadeia”. Aqui, a ameaça incluía os “senhores” e as “sinhazinhas”, que se valiam dos escravos para atirar “limões de cheiro” em figuras da sociedade, o negro funcionando não como um limão, mas como um “laranja” – só pra pagar o pato pelo patrão.

Improvável um encontro furtivo depois do baile, tantos eram os “olheiros”.

 A vila compensava a pouca animação com uma prodigiosa agilidade linguo-dental, a fofoca, só comparável aos estalidos da “matraca”, aquele chocalho de madeira usado para acompanhar as procissões do “Santo Calvário”.

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Tirar a roupa era exercício quase impossível, tamanha a “guarnição” íntima das gentis senhorinhas. Espartilho de barbatana de baleia, bustier, camisolão de cambraia, blusa, anágua, duas saias “de reserva”, mais um vestido inteiriço de pregas “fofas” e “mangas bufantes”.

Não era só. Meiões de algodão branco subiam até a altura das coxas. E debaixo de toda essa fortaleza restavam “calções” de jogador bretão, à guisa de proteção para o chamado “último reduto”.

Carná na rua Augusta era bom para brincar. Pra namorar era difícil, tamanho o número de olheiros e alcagüetes. Os sons ainda emanam ali da velha João Pinto, clarins ecoando pela cidade, convocando para o tríduo, que se inaugura daqui a pouco, nos primórdios de fevereiro.

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