O professor de física e meteorologia na UFSC, mestre e doutor em meteorologia e geociência pela USP,  Reinaldo Haas, não é otimista em relação às manifestações climáticas em Santa Catarina. Ele participou do programa Conversas Cruzadas da CBN Floripa, nesta terça-feira (28), e disse que o Estado fica em uma “região complicada do globo” e que “devemos nos inspirar em nosso passado para estarmos preparados, pois, infelizmente, podemos ter coisas terríveis pela frente”.

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Confira imagens da chuva em Florianópolis:

Hass fez um relato, a pedido da coluna, sobre o que a chuva que atinge Santa Catarina desde outubro. confira:

Não é Mudança Climática…

Em “Alice no País das Maravilhas”, o Coelho Branco ensina que, se não temos um destino específico em mente, qualquer caminho serve. Em relação às super enchentes que estão ocorrendo em Santa Catarina, parece que estamos seguindo qualquer caminho.

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Com base nos meus 40 anos de estudo sobre o clima nesta região, já era possível antecipar as possíveis ocorrências desses eventos em 2021. Isso tem sido comunicado a colegas de profissão e autoridades governamentais desde então. Este é o motivo pelo qual busquei um pós-doutorado.

No entanto, é necessário esclarecer que antever não é realizar previsões exatas, mas sim compreender e analisar as “mudanças climáticas” e o aumento das “variações climáticas” que vêm ocorrendo ao longo do tempo.

Diante disso, gostaria de enfatizar que é fundamental deixarmos de lado os medos infundados em relação às mudanças climáticas, mas sim nos aprofundarmos em seus fatores causadores e empreender mudanças necessárias para evitar que nossas profecias se tornem autorrealizáveis.

O atual padrão climático é principalmente influenciado por um El Niño forte, embora não tão intenso como em 1983, 1997 e 2016. Esse fenômeno se acopla às mudanças climáticas em curso, alterando o formato e intensidade temporal e espacial das tempestades. Essas mudanças se caracterizam mais por extensos escorregamentos e enchentes com muitos detritos, algo possível de se prever apenas com base em tendências dos histogramas de precipitações ao longo dos anos.

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Contudo, vale ressaltar que nem todos os fatores climáticos possíveis têm contribuído para a desgraça que enfrentamos. Por exemplo, a alta estratosférica está relativamente quente em relação aos anos anteriores, em uma atividade que parece ser benéfica do vulcão Hunga Tonga. Sim, esse vulcão submarino é possivelmente o novo vilão do nosso clima. Trata-se de um dos principais candidatos a responsável por nossas “Terríveis Lestadas”.

Em 1838, um evento de Lestada deixou a Ilha de Santa Catarina sem vegetação, e existem evidências de que tenha matado 15% da população da Ilha na época. Contudo, é bom salientar que os registros de mega catástrofes estão sendo encontrados em todo o Estado de Santa Catarina, o que torna a ideia de vivermos tempos terríveis sem tanto sentido. Vivemos em uma região complicada do globo e prosperamos; assim, devemos nos inspirar em nosso passado para estarmos preparados, pois, infelizmente, podemos ter coisas terríveis pela frente.

Portanto, apesar da destruição que vemos agora no Alto Vale, é importante fazermos uma análise aprofundada desses fatores climáticos e suas interações, buscando entender melhor as mudanças que estão ocorrendo e que podem acontecer em Santa Catarina.

Por exemplo, em 1982 e 1983, algumas pontes foram reconstruídas cinco vezes, pois não entendíamos o que causou as enchentes. Na época, o Prof. Amaro de Seixas Netto acusava a construção de Itaipu. Na literatura científica, isso foi desvendado em 1987 por Ropelewski e Halpert. Até esse ano, Blumenau havia sobrevivido e prosperado a 75 de suas 101 enchentes. Mas as baixas perdas econômicas e de vidas nos mostram como a previsão do tempo e clima são importantes.

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Por falta de outros projetos, cada vez que ocorrem enchentes, são lembrados os projetos da JICA. Embora devamos agradecer essa sugestão deles e nos inspirar na cultura de prevenção e resiliência do Japão, não podemos esquecer que o Brasil construiu Itaipu na década de 1970 e que nossa geografia e solos são muito diferentes do Japão. Nós temos uma plataforma oceânica muito rasa e longa. Já perdemos a navegação na maioria dos nossos rios devido a detritos e mau uso do solo. Assim, na minha opinião, o projeto pode inviabilizar economicamente o porto de Itajaí devido aos transportes de detritos. Não menos importante, temos que lembrar que os atuais quase 300 mm de chuva registrados no dia 16/10/2023 teriam provocado uma enchente quase igual, pois a chuva foi abaixo das represas projetadas.

Isso não é desculpa para a falta de manutenção e muito menos para deixar o projeto da JICA de lado. A sociedade catarinense tem que exigir que seus políticos façam bom uso dos nossos recursos e isto, no caso de proteção civil, longe dos ventos eleitoreiros. Isto significa que as decisões de construção e operação de obras de proteção contra enchentes devem ser feitas por descrições técnicas testadas exaustivamente e um processo de contínuo aprendizado com as mudanças.

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