Reuniões maçantes em salas a portas fechadas deram lugar a videoconferências assistidas no conforto do lar. O trânsito não é mais um obstáculo no caminho até o trabalho, a mesa com a lista de tarefas do dia agora divide espaço com outros móveis da casa e, sim, trabalhar de pijama finalmente é um sonho possível – não em todos os casos, claro. Ao forçar o distanciamento social, afastando as pessoas do convívio físico, a pandemia do novo coronavírus abriu caminho para consolidar uma nova maneira de trabalhar para muita gente.

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Por necessidade sanitária – e para estancar a sangria do contágio – nunca antes se falou e se recorreu tanto ao home office. Uma pesquisa feita pela SAP Consultoria em RH, encomendada pela Sociedade Brasileira de Teletrabalho e Teleatividades (Sobratt) e divulgada em dezembro, mostrou que o modelo está cada vez mais em alta. Cerca de 550 empresas de todo Brasil foram consultadas. Pouco mais da metade delas informou ter adotado o formato em função da pandemia. Destas, 72% disseram que vão mantê-lo e 94% consideraram os resultados positivos (veja mais detalhes abaixo).

Os benefícios mencionados incluem aumento de produtividade das equipes e redução de despesas com a manutenção de um espaço físico – menos gastos com energia elétrica e com o cafezinho, por exemplo. Por outro lado, as empresas ouvidas citaram desafios para fazer o home office funcionar, entre eles a gestão a distância das atividades, o acesso externo a sistemas, a segurança da informação e até mesmo a natural resistência à mudança. Foi o quarto levantamento sobre home office no país feito pela Sobratt, e o primeiro a já considerar mudanças provocadas pela pandemia.

A disseminação do modelo, em atividades onde ele é possível e viável, se soma a uma conjuntura econômica transformada pela Covid-19. Como em todas as crises, quem produz e vende precisou se adaptar para garantir a própria sobrevivência. Neste caso, por não haver precedentes na história recente, foi quase como caminhar no escuro, sem saber exatamente como seria o dia de amanhã. Para o consultor Roberto Vilela, especialista em estratégias comerciais e negócios, o cenário acelerou nas empresas a capacidade de aceitar o novo.

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— Antigamente você tinha muita dificuldade de apresentar um projeto novo, alguma mudança ou evolução dentro das organizações. A resistência era muito grande. Hoje o pessoal se mostra mais receptivo. Paralelo a isso, mudou também a velocidade na resposta. Todo mundo está mais rápido, atento e não querendo perder oportunidades — analisa.

Confira detalhes da pesquisa sobre home-office feita com cerca de 550 empresas:

Sem o físico, solução foi ampliar o digital

Rápido foi justamente o que o comércio precisou ser diante da nova realidade imposta. Do dia para a noite, lojistas se viram obrigados a fechar as portas enquanto o coronavírus desembarcava em Santa Catarina. A maior parte do setor ficou pelo menos duas semanas sem poder abrir depois de o governo decretar o primeiro lockdown, em março do ano passado. Outras atividades levaram mais tempo ainda para retornar. Muitas não são mais as mesmas.

Nesse período de suspensão, a internet ajudou a salvar muitos negócios, principalmente os de pequeno porte. Quem ainda não utilizava WhatsApp ou redes sociais para divulgar produtos e serviços acabou descobrindo na marra que a vitrine virtual, além de barata e eficiente, é infinitamente maior do que aquela disponível na fachada da loja.

— Hoje existem soluções disponíveis para todos os tipos e tamanhos de empresas. As empresas de informática foram muito ágeis em colocar à disposição novas ferramentas para o comércio e os serviços — avalia Bruno Breithaupt, presidente da Fecomércio-SC.

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Um levantamento da Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (ABComm), em parceria com a Neotrust, apontou crescimento de 68% nas vendas pela internet em 2020, na comparação com 2019. Com o resultado, o e-commerce dobrou a participação no faturamento total do varejo, de 5% para 10%. A título de comparação, o volume de vendas geral do varejo brasileiro no último ano avançou apenas 1,2%, segundo o IBGE.

Na gastronomia, empresários encararam desafio semelhante. Com restrições de capacidade de funcionamento, o movimento de bares e restaurantes caiu drasticamente. Durante a temporada de verão, 63% empresas catarinenses do ramo consultadas em uma pesquisa da Abrasel, associação que representa o setor, relataram queda superior a 30% no período que historicamente é o de maior receita do ano.

— É um dos setores em que o orçamento doméstico é mais contingenciado em momentos assim — lamenta Raphael Dabdab, presidente da regional catarinense da entidade.

O delivery e a possibilidade de o cliente retirar o pedido no balcão evitaram quebradeira maior no segmento, que chegou a perder 40 mil postos de trabalho no Estado em 2020, conforme a Abrasel. Ao mesmo tempo, mostraram que um dos caminhos futuros para quem trabalha com gastronomia é transferir a experiência de quem come em um restaurante para dentro de casa.

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Leonardo Biz e Kaiser Novelli
Biz e Novelli: pandemia acelerou projeto antigo dos sócios (Foto: Patrick Rodrigues)

Mudar para sobreviver

Nenhum setor da economia agonizou tanto na pandemia quanto o de eventos. Feiras, congressos, festas e espetáculos pagaram o pato por reunirem grandes públicos em espaços normalmente fechados – um cenário ideal para a propagação do coronavírus. No início do ano, a Associação Brasileira dos Promotores de Eventos (Abrape) estimou que o segmento acumulou perdas de R$ 90 bilhões desde fevereiro de 2020, com 400 mil trabalhadores demitidos.

Os sócios Leonardo Biz e Kaiser Novelli estão nesta lista de quem contabiliza os prejuízos. Eles administram o Ahoy, uma casa de festas e shows de Blumenau que, assim como tantas outras, precisou suspender a programação logo no início da pandemia. Sem um único centavo entrando em caixa, lembra Kaiser, a dupla precisou vender o estoque ainda disponível para bancar parte das despesas fixas. Em busca de algum fôlego financeiro, foram atrás de crédito. Depois de toda a burocracia enfrentada, conseguiram pegar emprestado apenas uma pequena quantia, aquém da necessária.

Mesmo com tudo jogando contra, Biz e Novelli seguiram adiante e decidiram acelerar uma ideia que já estava rabiscada no papel. Antes mesmo da pandemia chegar, eles imaginavam criar um novo espaço anexo à casa de shows. O projeto original acabou sofrendo algumas alterações. Um contêiner com uma cozinha, biqueiras de chope e algumas mesas transformaram o que antes era um terreno com vagas de estacionamento em um bar a céu aberto.

— As pessoas estão buscando cada vez mais ambientes externos. Já era uma tendência antes da pandemia — conta Biz.

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Entre planejamento e execução das obras, criação da identidade visual e definição do cardápio foram cerca de 30 dias. O Backstage, como o bar foi chamado, abriu em setembro, cerca de seis meses depois de o Ahoy suspender festas e shows. O projeto rendeu aos sócios o troféu na categoria Comércio do Prêmio Gustav Salinger, principal reconhecimento ao empreendedorismo da região, concedido pela Associação Empresarial de Blumenau (Acib), e não para por aí. Os sócios estudam agregar outros serviços no espaço que “façam sentido” para o público roqueiro da casa, como uma barbearia ou um estúdio de tatuagem.

Um novo perfil de consumo

As restrições de convivência social e o medo da contaminação fizeram com que mais gente passasse mais tempo dentro de casa. Isso desencadeou uma mudança no perfil do consumidor, diz Mario Cezar de Aguiar, presidente da Federação das Indústrias de Santa Catarina (Fiesc). Com os gastos “na rua” limitados, o dinheiro das famílias foi direcionado para o próprio lar.

— Houve uma demanda muito forte de determinados tipos de produtos, como eletrodomésticos, aparelhos de TV, móveis, cortinas, e também em pequenas melhorias como pinturas e reformas — considera o dirigente.

O pagamento do auxílio emergencial, que injetou R$ 7,4 bilhões no Estado ao longo de 2020, ajudou a reaquecer a economia, gerando uma demanda que boa parte do mercado considerou surpreendente. Segundo Aguiar, isso inclusive provocou um certo desequilíbrio na cadeia de suprimentos. Insumos e matérias-primas básicas, como algodão, aço e papelão, ficaram mais escassos, pressionando custos.

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Desafios operacionais à parte, com o comércio reaberto e o volume de pedidos aumentando, a produção industrial retomou fôlego e as fábricas começaram a repor as demissões feitas no início da pandemia. Santa Catarina encerrou o ano com saldo positivo de 53 mil novos empregos. Cerca de metade das vagas (25,4 mil) veio do segmento.

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