Uma a uma, Luciana Freiberger Martins exibe, orgulhosa, vestidos, blusas e bermudas feitos por ela mesma. Depois de 20 anos trabalhando na área de costura de indústrias têxteis, ela decidiu deixar de bater cartão em fábrica e virar dona do próprio negócio. Juntou as economias e abriu, em janeiro, uma loja de moda em Indaial. Há cerca de uma semana, migrou o ponto para o bairro Água Verde, em Blumenau.
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Praticamente tudo que está na vitrine e no estoque tem a assinatura dela, que além de costureira – e agora empreendedora – também se considera uma estilista, mesmo sem ter formação na área. Boa parte das peças é feita com retalhos não aproveitados de facções. A miscelânea de cores e estampas garante um visual sem igual. É por conta dessa exclusividade que ela resolveu batizar a loja de Quebrando Regras – já que uma roupa nem sempre precisa ser igual a outra.
— Eu era empregada e sempre tive vontade de fazer as minhas próprias peças — conta Luciana, que posou para a foto que ilustra esta página vestindo uma peça 100% autoral.
Há alguns quilômetros dali, na principal via comercial de Blumenau, o empresário Jaison do Nascimento recém inaugurou nova unidade da Coração de Estudante, distribuidora de materiais escolares e de escritório. O ponto na Rua XV de Novembro é o terceiro da empresa tocada por ele junto da esposa – a matriz fica em Gaspar e ainda há outra loja em Ilhota.
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A expansão para Blumenau já estava nos planos antes mesmo da pandemia chegar. Nos últimos anos, o volume de pedidos partindo da cidade cresceu. A escolha pela Rua XV foi estratégica, pela região central e pelo grande número de escritórios que ocupam salas comerciais em prédios da via – um dos diferenciais da empresa é o tele-entrega de produtos sem custo de frete.

Questionados pela coluna do porquê insistir em uma loja de rua em meio a uma crise sanitária que segue impondo restrições ao comércio, tanto Luciana quanto Nascimento falam em coragem. De origens e segmentos distintos, eles são exemplos de resiliência e que ilustram o boom de criação de empresas que Santa Catarina vem observando nos últimos anos. E esse movimento ganhou ainda mais força desde a chegada do coronavírus.
Em 2020, o Estado contabilizou um saldo de 115 mil novas empresas, número que corresponde à diferença entre todas as aberturas e baixas registradas ao longo do ano. Foi um crescimento de 19% na comparação com 2019. O ritmo continua intenso em 2021. Entre janeiro e abril, já foram computados cerca de 50 mil novos negócios em Santa Catarina (veja a tabela abaixo). A maioria, em torno de 41 mil, são de microempreendedores individuais (MEIs), pessoas que formalizaram o trabalho por conta.
Conjunto de fatores
É pela Junta Comercial de Santa Catarina (Jucesc) que passa toda a documentação necessária para abrir ou fechar uma empresa. Não existe um fator isolado para justificar essa predileção do catarinense pelo empreendedorismo, avalia Gilson Bugs, presidente do órgão.
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Diante do cenário posto, há inúmeras possibilidades que explicam a alta dos números: pode ser uma questão de necessidade – alguém que perdeu o emprego em meio à crise e recorreu ao próprio negócio –, uma oportunidade observada no mercado ou o início de uma transformação mais profunda no mercado de trabalho, com as pessoas buscando cada vez mais a autonomia profissional.
Para Bugs, outro motivo ajuda a explicar a situação. Os processos hoje estão mais rápidos, dispensando uma montoeira de papelada. Também há maior integração entre órgãos como Vigilância Sanitária, Corpo de Bombeiros e Instituto do Meio Ambiente (IMA), que dão aval às empresas. O próprio sistema da Jucesc está ligado com o de prefeituras.
— Hoje é muito mais fácil alguém ter uma ideia, um sonho, e abrir uma empresa. Alguns anos atrás era muito mais burocrático, moroso e difícil — considera.
Com a digitalização de muitos protocolos, o atendimento não foi um problema quando a pandemia exigiu o distanciamento físico, lembra Bogs. A Jucesc trabalha agora na homologação de um novo sistema que promete facilitar a baixa de empresas, que vai oferecer modelos prontos de formulários, de acordo com o segmento. A previsão é que ele seja lançado em junho.
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Um pouco de doce para amenizar a crise
Por Luiza Morfim
Em meio às incertezas econômicas causadas pela crise da Covid-19, as irmãs Emmanuelle Menna Barreto Campelo e Crisele Menna Barreto Arndt encararam um desafio a mais: a gravidez. As duas engravidaram, deram à luz durante a pandemia e foram desligadas de seus empregos logo após a licença-maternidade.
O ponto final na carreira que elas levavam serviu para abrir as portas para um novo mundo: o do empreendedorismo. Foi então que, impulsionadas pelo momento que deixou muitos desempregados, elas se depararam com a mesma dúvida de muitos: o que fazer agora? Para chegar a uma decisão, as irmãs conversaram e perceberam que precisavam buscar algo que tivesse mais flexibilidade, para que pudessem cuidar dos filhos ainda bebês.
— Precisávamos de uma renda. Eu sempre fui uma apreciadora de doces em geral, e mais ainda de quindins, e sou muito crítica também. Então fui tentar fazer para mim, e quem sabe para vender – conta Emmanuelle.
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As receitas caseiras não deram muito certo, mas o teste serviu para começar a pensar sobre o assunto. Naturais de Pelotas, no Rio Grande do Sul, as irmãs já moram na Grande Florianópolis há mais de dez anos, e foram encontrar no estado vizinho uma ideia para o primeiro empreendimento. Hoje elas são sócias e proprietárias da franquia de São José da Berola Doces, uma empresa de doces artesanais com inspiração nos doces portugueses.
— Numa ida à Pelotas visitamos a fábrica. Então, nós procuramos estudar o mercado da nossa região e vimos que não havia nada parecido. Como vem tudo pronto de fábrica, o nosso trabalho envolve mais a gestão e o atendimento.

A insegurança do momento atual também foi levada em conta na hora da decisão final, mas as circunstâncias exigiam delas uma atitude, tanto para continuar pagando as contas, quanto para buscarem uma adaptação à nova rotina da maternidade com o empreendedorismo.
— Óbvio que ficamos com receio, pois investimos nossas economias aqui, mas a aceitação está sendo maravilhosa, as pessoas entram sorrindo e agradecendo, que a região estava precisando de algo do gênero. Mas é tudo muito recente ainda. O início está complicado, uma correria, mas aos poucos vai se ajeitando. Não temos família aqui, o que deixa tudo mais difícil, mas é só uma adaptação.
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Do quindim à “trouxinha recheada”, passando pelas tortas e, claro, pelo português pastel de Belém, os doces vendidos pela dupla causam água na boca de quem acompanha nas redes sociais ou passa pelo ponto fixo no bairro Campinas. E apesar de ter aberto apenas há uma semana e em meio a um momento ainda muito delicado, se depender do otimismo da Emmanuelle, muitos outros catarinenses ainda vão se encantar pelos doces tradicionais de Pelotas.
— Eu acredito que seja algo que as pessoas sentem falta, buscam e não encontram por aqui. Sem falar que doce é alegria, sensação de prazer e felicidade. Com tudo que estamos passando, ter momentos de prazer é o que mais queremos — conclui.
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