Em meio ao furacão provocado pela pandemia do novo coronavírus, o mês de maio se desenha crucial para o futuro de curto e médio prazos de Blumenau, com potenciais desdobramentos que podem afetar ainda mais a rotina da cidade no restante do ano. A começar pela saúde, indiscutivelmente a maior das preocupações no momento. Até sábado (2), o município contabilizava, de acordo com o boletim oficial do governo de Santa Catarina, 213 casos confirmados de Covid-19. Nas contas da prefeitura, esse número é um pouco maior: 225 (entenda aqui as razões da diferença).
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A boa notícia é que, segundo o último boletim municipal, apenas cinco pessoas estão no hospital – dois em enfermaria e três em UTI. Outras 139 estão isoladas em casa, com estado de saúde estável, e 81, que não apresentam mais sintomas, são consideradas recuperadas. Não há registro de mortes. As próximas semanas, no entanto, trarão com mais clareza os impactos do retorno gradual das atividades comerciais, que se consolidou ao longo de abril e levou mais gente às ruas, na curva de contaminação. O aumento inevitável de casos colocará à prova a capacidade de atendimento da rede local de saúde.
Na economia, indústrias, lojistas e prestadores de serviços, brutalmente atingidos pela paralisação imposta pela quarentena, terão, no decorrer dos próximos dias, mais informações disponíveis para avaliar o ritmo de retomada da economia. E aguardarão com ansiedade uma dificílima decisão que será tomada pela prefeitura: manter, adiar ou cancelar a Oktoberfest deste ano. O martelo sobre o destino da festa, principal cartão-postal de Blumenau, deve ser batido até o dia 15 de maio.
Há muita coisa em jogo e que será considerada diante de um cenário extremamente desafiador, complexo e cheio de incertezas. Calcula-se, dentro da Vila Germânica, que a Oktoberfest gera pelo menos 6 mil empregos diretos, sem contar outros tantos milhares de indiretos, e despeja cerca de R$ 240 milhões em Blumenau. Pelo menos 60 segmentos são beneficiados com a festa, de bares e restaurantes a hotéis e vendedores ambulantes. Isso tudo tem um peso inegável, que se torna ainda mais relevante – e motivo de pressão por parte de patrocinadores e empresários – em um cenário de recessão econômica que já é certo para 2020.
Em acréscimo a isso, a Oktoberfest também acaba exercendo um papel de financiadora de uma série de outras atividades, condição que a coloca como um case de referência entre eventos organizados pelo poder público pela alta lucratividade. Na edição de 2019, a festa gerou um superávit, diferença entre receitas e despesas, de R$ 5 milhões, um recorde histórico. É um dinheiro que, além de custear a promoção do turismo municipal e despesas fixas da Vila Germânica, também beneficia projetos sociais e culturais, incluindo convênios com clubes de caça e tiro e repasses para ações de combate às drogas.
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Uma outra parte deste lucro vai para a organização dos demais eventos turísticos e de lazer da cidade, como o Magia de Natal, o Réveillon, a Sommerfest e a Vila de Páscoa. Como efeito cascata, um eventual cancelamento da Oktoberfest acabaria respingando também em todas essas atrações, ampliando os prejuízos para a arrecadação municipal e a economia local.
Por fim, e não menos importante, a Oktoberfest é também um patrimônio cultural e histórico de Blumenau. Está intrinsecamente ligada às tradições germânicas que deram origem à cidade e é considerada um marco da resiliência da população local – característica tão necessária em tempos de pandemia – por ter ganhado forma após a grande enchente de 1984. Embora já estivesse mapeada antes da catástrofe climática, a festa sempre foi “vendida” como um símbolo de recuperação e é motivo de orgulho para a maioria dos moradores. Como se vê, são vários fatores colocados na balança.
O cancelamento da Oktoberfest de Munique, na Alemanha, confirmado ainda em abril, acabou fomentando a discussão em Blumenau. Instigado a respeito, o secretário de Turismo e Lazer, Marcelo Greuel, tratou logo de dizer que os eventos, embora semelhantes na proposta, têm peculiaridades que impediriam uma comparação direta. A versão alemã, reforçou ele, é muito maior: são 6 milhões de visitantes, 10 vezes mais do que aqui, o que por si só já demanda mais tempo de preparação. Há também, lá, um contingente bem maior de estrangeiros, o que aumenta os riscos de contágio.
Em uma transmissão online na última quinta-feira (30), Greuel confirmou ao blog que o planejamento da Oktoberfest, por ora, segue inalterado e que a organização precisa de pelo menos um mês para montar toda a estrutura. Os preparativos, porém, iniciam bem mais cedo. Até a festa começar a ganhar forma, dezenas de músicos e fornecedores, do som à iluminação, já terão de estar contratados, em processos que envolvem licitações. Funcionários de áreas como limpeza e segurança, serviços terceirizados, precisarão estar treinados. Cervejarias e restaurantes da praça de alimentação reforçam a produção, com vistas ao aumento da demanda, com bem mais antecedência. Estes são só alguns exemplos da engrenagem que faz tudo acontecer.
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Não se coloca de pé em um ou dois meses um evento de 19 dias que reúne um público de 600 mil pessoas e está entre os maiores do Brasil, rivalizando com Rock in Rio e Lollapalooza. Por isso a decisão sobre a Oktoberfest deste ano será tomada no limite do prazo – que, sabemos agora, é a primeira quinzena deste mês que se apresenta –, considerando o quadro de momento e as projeções que dizem respeito à pandemia, que são diárias. Se e quando e como acontecer, a única coisa certa é que, saindo do papel, ela será bem diferente do que nos acostumamos a ver nos últimos anos. No momento, a festa está nas mãos da medicina.