A história recente da política blumenauense revela que tem prevalecido uma certa harmonia entre os poderes Executivo e Legislativo, muito em função da ampla maioria construída pela prefeitura na Câmara de Vereadores nos últimos anos – uma base que tem impedido derrotas governistas significativas. Essa relação cordial, no entanto, vez ou outra sofre algum tipo de abalo, e o mais recente foi provocado por uma situação atípica, assunto sobre o qual já escrevi aqui. A licença do presidente da Casa, Marcelo Lanzarin (Podemos), de situação, abriu espaço para a ascensão temporária do vice, Bruno Cunha (Cidadania), agora da oposição, ao cargo.
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No comando da sessão da última quinta-feira (4), Cunha viu o cavalo passar encilhado: valeu-se do regimento interno para, em nome do chamado “bloco dos excluídos”, postergar a apreciação de um projeto de lei apresentado em regime urgentíssimo pelo líder de governo, Alexandre Matias (PSDB). O mérito da proposta – a suspensão dos prazos de validade dos concursos públicos homologados pela prefeitura enquanto vigorar o estado de calamidade pública provocado pela pandemia – ficou em segundo plano, e nem provocou grandes prejuízos ao Executivo. O gesto acabou representando uma reprovação política ao que a oposição convencionou há algum tempo chamar de “tratoragem”.
A tramitação em regime urgentíssimo de projetos de lei – quando uma proposta entra na Câmara, é analisada pelas comissões e colocada em votação em uma mesma sessão em questão de poucas horas – é um mecanismo legal, previsto no regimento da Casa e usado com bastante frequência, mas está longe de ser uma unanimidade. Parlamentares, principalmente os de oposição, reclamam que os textos muitas vezes são votados sem ampla discussão. Acusam a base governista de “passar o trator”.
Essa discussão poderia ter terminado na própria quinta-feira, com o bloco dos excluídos comemorando uma rara vitória política, mas o prefeito Mario Hildebrandt (Podemos) acabou colocando lenha na fogueira com uma declaração dada na noite de segunda-feira (8). Durante a “live” diária que faz para atualizar as ações de enfrentamento à pandemia, Hildebrandt anunciou que estava assinando um decreto para suspender os concursos e alfinetou Cunha, sugerindo que “por falta de experiência” o parlamentar não teria entendido o projeto. Por tabela, o prefeito também cutucou os outros três vereadores da oposição – Adriano Pereira (PT), Ito de Souza (PL) e Professor Gilson (Patriota) – ao agradecer os 11 parlamentares da base “que têm nos ajudado a conduzir a cidade com tranquilidade”.
Os comentários desencadearam reações e o assunto dominou os discursos em plenário nesta terça-feira (9). Cunha rebateu o outrora aliado alegando que seguiu o regimento interno e disse que o prefeito usou a sua idade – aos 33 anos, ele é o mais jovem parlamentar da Câmara – de forma depreciativa. A sessão teve trocas de farpas entre governistas e oposicionistas e reservou ainda a apresentação de um requerimento cobrando os gastos da prefeitura na transmissão das lives.
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No fim das contas, criou-se uma polêmica que, por parte do Executivo, poderia ter sido evitada — seja dando tempo para o debate ou mantendo a análise do projeto para esta semana, sem passar por cima da Câmara via decreto. Exemplos vindos dos governos federal e estadual, aliás, têm mostrado que turbulências políticas podem colaborar para desviar o foco de uma pandemia ainda marcada por incertezas. A situação inusitada da última semana não deve voltar a se repetir com a recondução de Lanzarin à presidência da Câmara nos próximos dias. Mas serviu para mostrar que, mesmo em minoria, ainda existe oposição no Legislativo – e que ela sabe fazer barulho se tiver oportunidade.
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