A repercussão da crise desencadeada pela saída de Sergio Moro do Ministério da Justiça e Segurança Pública por vezes se concentra mais nas figuras individuais do presidente Jair Bolsonaro e do ex-juiz da Lava-Jato do que no conteúdo das denúncias feitas pelo ministro demissionário. O episódio é mais grave do que parece e não pode se resumir apenas às consequências políticas do desembarque de Moro do governo.

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Por obrigação moral — e constitucional — é preciso condenar qualquer ameaça ou sinal de ataque aos pilares do Estado democrático de direito, independentemente de orientação partidária ou ideológica. Isso inclui a tentativa, revelada por Moro, de interferência política do presidente na escolha do comando da Polícia Federal, o braço da União no combate à corrupção e ao crime organizado.

Embora a polarização venha ditando os rumos do debate sobre a construção de país, não se trata aqui de escolher entre Bolsonaro e Moro, de ser de esquerda ou de direita, mas de defender acima de tudo a autonomia das instituições e dos mecanismos de controle e justiça social, não importando quem ocupe os mais altos e poderosos cargos da República.

É da natureza humana a predileção por heróis. Nos acostumamos a esperar pelo surgimento e a torcer por um salvador da pátria que resolva todos os problemas. Ao depositarmos toda nossa crença em “deuses e mitos”, e somente neles, condicionamos as mudanças tão necessárias que queremos a gestos individuais, quando é o coletivo que precisa construí-las.

A insistência em personificar virtudes abre um precedente perigoso, que alimenta o fanatismo e a idolatria cega. É como se apenas Bolsonaro, para seus seguidores, fosse sinônimo da nova política e somente Moro, para os seus admiradores, representasse o combate à corrupção. Ambos devem ser encarados como símbolos de ideais, não como os próprios ideais em si.

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Bolsonaro e Moro passarão à história deixando seus legados – bons ou ruins, o tempo e o gosto de cada um dirão. O que ficam são as instituições. Estas, sim, são maiores do que qualquer um. Elas precisam ser aperfeiçoadas, nunca enfraquecidas.