Durante a corrida eleitoral de 2018, o então candidato a presidente Jair Bolsonaro se apropriou de um slogan que não era exatamente original. O “Mais Brasil, menos Brasília” pregado pelo capitão da reserva atacava a burocracia patrocinada pela União e defendia maior autonomia, financeira e de gestão, dos demais entes federativos.

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Não à toa o discurso encontrava eco em prefeitos e governadores. A descentralização de recursos – e consequentemente de poder – concentrados majoritariamente nas mãos do governo central sempre foi bem vista por queixosos de que a riqueza produzida por cidades e estados não retornava às bases na mesma proporção. Santa Catarina que o diga.

Relembro essa promessa de campanha que pouco avançou – uma PEC propondo mudanças chegou a ser elaborada, mas está parada no Congresso Nacional – para traçar um paralelo com a realidade catarinense. Nesta terça-feira (1º) a Assembleia Legislativa derrubou o veto da então governadora interina Daniela Reinehr ao projeto de lei que prevê um aporte de R$ 350 milhões do governo de Santa Catarina a três BRs que cruzam o Estado. Incluindo aí R$ 200 milhões para a BR-470, que corta o Vale do Itajaí.

No jogo de empurra-empurra de atribuições tão habitual na esfera pública, a posição é no mínimo incomum. Com verbas para a infraestrutura de rodovias federais diluídas pelo orçamento da União, o Estado abre um precedente ao se dispor a abraçar uma responsabilidade que no papel não é sua. Assume o risco de ser taxado como autossuficiente por Brasília, o que poderia acabar pesando contra reivindicações futuras.

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Não faltam motivos para justificar a decisão. Santa Catarina tem pressa para tornar estradas mais seguras para motoristas e eliminar gargalos logísticos que encarecem e reduzem a velocidade do desenvolvimento econômico. Há também cansaço, provocado pela espera e pela desilusão de promessas não cumpridas de vários governos da história recente – da esquerda à direita.

Política à parte, o movimento protagonizado pelo Estado agora volta a colocar o atual modelo de pacto federativo em xeque. E pode servir de exemplo para sustentar uma revisão de atribuições de cada ente e a redistribuição da arrecadação de impostos. Mais próximos da população, municípios e estados sabem melhor onde o calo aperta. A premissa pode ser romântica, mas parece soar mais racional que eles tenham mais autonomia e capacidade financeira para resolverem seus problemas.

Embora ainda dependa de ajustes com o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) para ser viabilizada, é mais do que bem-vinda a solução encontrada para acelerar obras da União em Santa Catarina que há anos avançam a passos de tartaruga. No fim das contas, o que vale para motoristas e empresas que escoam a produção industrial pelas BRs é estrada duplicada e mais segura. Independentemente da fonte do recurso ou do pai da obra.

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