Quem acompanha a história recente do Brasil com um olhar pragmático, desprovido de viseiras ideológicas, sabe que o desempenho da economia dita a popularidade – e principalmente a viabilidade – dos governos.

Continua depois da publicidade

As pedaladas fiscais, por exemplo, foram um pretexto formal para antecipar o fim do segundo mandato de Dilma Rousseff (PT). Por mais que até hoje existam opiniões divergentes sobre o fato de a ex-presidente ter ou não cometido crime de responsabilidade, restam poucas dúvidas de que o impeachment é sobretudo um julgamento político.

Com a economia à época definhando, desemprego e inflação em alta, trocar a titularidade da cadeira presidencial era visto por alguns setores da sociedade como um necessário fato novo para (tentativa de) reversão de cenário. Há quem avalie que Michel Temer (MDB), o “vice decorativo” que ascendeu ao Planalto, só não teve o mesmo destino da antecessora – em que pese ter sido o primeiro presidente em exercício a ser denunciado por corrupção – justamente porque os indicadores econômicos melhoraram um pouco durante a sua gestão.

Por tudo isso seria de bom tom que o presidente Jair Bolsonaro e seu estafe dessem mais atenção aos números da economia. Na segunda-feira, nova edição do boletim Focus, consulta semanal feita pelo Banco Central junto a instituições financeiras, apontou a décima queda seguida da expectativa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) para 2019. Desta vez a redução foi grande: de 1,7% para 1,49%.

Tratam-se apenas de projeções, mas estas, em seu estado natural das coisas, têm componentes de alto otimismo. Na largada de 2018, o Focus apostava em alta de 2,69% na economia nacional. O ano terminou com incremento bem mais modesto, de 1,1%. PIB baixo é sinônimo de menos geração de riqueza.

Continua depois da publicidade

Embora o governo tenha destravado algumas concessões, como a de 12 aeroportos, contribui para a esfriada de ânimos do mercado o aumento do desemprego (13,4 milhões de desocupados ao final do primeiro trimestre), a queda de 1,3% na produção industrial nacional em março e a tramitação lenta da reforma da Previdência, que se não resolverá o déficit fiscal de imediato ao menos sinaliza que o governo está preocupado com o ajuste das contas públicas no médio e longo prazos. É um remédio amargo, mas que precisa ser aplicado para que a arrecadação pública, num futuro cada vez menos distante, não se limite apenas a pagamentos de aposentadorias.

Não bastasse tudo isso, o deputado Capitão Augusto Rosa (PR-SP), líder no Congresso Nacional da bancada da Bala, uma das bases de sustentação do governo, adicionou novo ingrediente no caldeirão da turbulência política. Em entrevista ao jornal Valor Econômico publicada nesta segunda-feira, disse que a desarticulação do presidente com os parlamentares, somada ao desarranjo da economia, “é o retrato da Dilma”, insinuando risco de abreviação do mandato de Bolsonaro.

Um novo impeachment numa janela histórica tão curta ampliaria ainda mais a percepção de instabilidade institucional do Brasil, o que obviamente é uma notícia ruim para todos. Aprovar reformas e erguer as bases para que a atividade econômica volte a deslanchar cada vez mais não são somente uma questão de gestão bem-sucedida. A história recente mostra que também se trata de sobrevivência política.