A perda de 165 mil empregos na indústria é o indicador que mais salta aos olhos na pesquisa da Federação das Indústrias de Santa Catarina (Fiesc) que mapeou os impactos econômicos do novo coronavírus no Estado. Mas o levantamento também traz uma estatística peculiar, que talvez mensure pela primeira vez a percepção de uma importante parte do setor produtivo sobre o papel do poder público no enfrentamento da pandemia. Se antes críticas ao governo Carlos Moisés vinham de ofícios e notas oficiais de associações e entidades representativas, agora elas também são refletidas em números.
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Quase 68% das indústrias consultadas pela federação avaliaram negativamente as medidas tomadas pelo governo catarinense na gestão da crise. Quem acompanha os desdobramentos econômicos não se surpreende com o resultado. Uma boa parte das empresas compreendeu, em um primeiro momento, o distanciamento social como medida de urgência e preservação da vida acima de tudo – como de fato deve ser. Mas a extensão do isolamento em um cenário de relativo controle semeou dúvidas. A titubeada de Moisés, que chegou a sinalizar uma retomada mais rápida, para depois recuar, também pegou mal e foi encarada com desconfiança.
A cadeia produtiva é uma engrenagem complexa. Quando qualquer um dos seus componentes, ligados à produção, à distribuição ou ao consumo, sai dos trilhos o prejuízo é inevitável. Muitas empresas conseguem absorver o impacto de alguns dias, mas pouquíssimas são capazes de se sustentar sem diminuir de tamanho após semanas de paralisia.
Os focos de insatisfação cresceram no mesmo ritmo do desemprego. E com eles vieram as pressões pela reabertura. Entidades ligadas ao comércio e aos setores do turismo e da gastronomia chegaram a acionar a Justiça questionando uma suposta seletividade do governo na definição do que podia ou não voltar a funcionar. Academias, shoppings e centros comerciais, ainda com operações restritas, sentem-se prejudicados. Cidades de pequeno porte sem casos confirmados não entendem por que não podem ser mais flexíveis na política de isolamento.
Na quinta-feira (16), novo capítulo: o Conselho das Federações Empresariais de Santa Catarina (Cofem) disparou nota criticando a falta de diálogo com o governo. O colegiado reclamou que as reuniões diárias de um grupo de trabalho formado pelo Estado para discutir a volta aos poucos à normalidade foram suspensas. O presidente da Fiesc, Mario Cezar de Aguiar, chegou a lamentar essa posição ao apresentar os números da pesquisa.
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Se a contrariedade com a postura do Estado é visível na pesquisa, por outro lado o estudo da Fiesc revela que 62,8% das indústrias aprovam medidas tomadas pelo governo federal. A opção pela implantação do isolamento vertical, restringindo apenas a circulação dos doentes e de pessoas dos grupos de risco, foi a mais lembrada (26%) pelas empresas consultadas em uma lista de alternativas que poderiam ser colocadas em prática para amenizar o quadro.
Essas duas constatações confirmam um alinhamento do setor produtivo catarinense ao discurso do presidente Jair Bolsonaro de reabertura mais acelerada da economia, em contraponto às recomendações de autoridades de saúde pela manutenção do isolamento – uma discussão que inclusive culminou em troca de comando no Ministério da Saúde. Por outro lado, o Supremo Tribunal Federal (STF) já decidiu que prefeitos e governadores têm autonomia na implantação de medidas para o combate ao coronavírus. Ou seja, a visão geral pode até estar sintonizada com a da maior autoridade do país. Mas é por Moisés que passam as negociações pela flexibilização.