Em novembro próximo o atleta Daniel de Oliveira Rodrigues, 36 anos, blumenauense de coração, vai disputar pela segunda vez o Deca Ironman. Em Nova Orleans (EUA) ele vai nadar 38 quilômetros, pedalar 1.800 quilômetros e correr 422 quilômetros. Ininterruptamente. É como se ele fizesse 10 Ironman seguidos. O vencedor da prova é considerado o homem mais resistente do mundo.
Continua depois da publicidade
O objetivo de Daniel é vencer e bater o recorde mundial. No ano passado ele percorreu as mesmas distâncias no México. Levou 253 horas, ou 10 dias e meio. Chegou em segundo lugar depois de muitos problemas com a organização da competição e como um acidente que fez com que ele machucasse os pés. Ele correu mais de 300 quilômetros com sangue nos tênis.
::: O que é UM ROSTO POR DIA? :::
Não há exagero em dizer que Daniel tem corpo e mente extraordinários. E a origem de tudo isso, segundo ele, está na infância e início de adolescência de bullying.
Continua depois da publicidade
Da rejeição à superação
Ele nasceu em Itaguaí (RJ) e aos cinco anos veio para Blumenau com pai, mãe e irmão mais velho. O pai era vigia e a mãe trabalhava em supermercado. Fez o primário na Escola Lothar Krieck e o restante do colegial no Pedro II.
::: ASSISTA A UM VÍDEO NO FINAL DA POSTAGEM COM TRECHOS DA CONVERSA :::
Quando criança era gordinho, aquele que não fazia Educação Física nem praticava esportes. Sofria por ser o “pamonha”, o mais fraco, o rejeitado. No início da adolescência essa sensação piorou porque queria estar enturmado. Percebeu que os mais populares eram os que praticavam esportes. Fez amizade com eles e começou na musculação com 14 anos. Foi a primeira vez que ele percebeu que poderia ser melhor que os outros em algo.
Com 15 anos ganhou uma bicicleta de Natal. Foi um marco de libertação. Podia ir para onde ele quisesse sem pedir para ninguém. Logo se empolgou. Tinha uma namorada em Gaspar e para vê-la pedalava de 40 a 50 quilômetros, ida e volta. Certo dia, aos 16 anos, ele e um amigo percorreram 100 quilômetros nas magrelas. Chegaram a Bombinhas.
Siga UM ROSTO POR DIA no Facebook, Twitter e Instagram
Gostaram da experiência e começaram a planejar a mesma jornada a pé. Caminharam 27 horas para superar a distância. Sofreram muito e prometeram que nunca mais repetiriam o feito. A promessa foi quebrada inúmeras vezes. Com 20 e poucos anos, Daniel já tinha feito o mesmo trajeto a pé 12 vezes.
Continua depois da publicidade
Hippie e verdureiro
Quando saiu do colégio ele passou um ano obrigatório no Exército. Depois ficou meses perdido sem saber o que fazer. Virou hippie. Por um ano vendeu artesanato na mesma Bombinhas que era destino das caminhadas. Nesse período dividiu teto com oito pessoas, mas também dormiu na rua sem saber o que comeria no dia seguinte. Pura opção.
Voltou para a cidade que havia deixado para trás para estudar Educação Física na Universidade Regional de Blumenau (Furb). Conseguiu um trabalho como verdureiro no Angeloni e começou uma rotina intensa de treinamento. Trabalhava das 5h às 13h30min, fazia estágio em uma academia das 14h às 18h, estudava das 18h30min às 22h e quando chegava em casa ainda saia para correr. Dormia de três a quatro horas por noite.
Durante a faculdade também trabalhou como modelo vivo para os alunos dos cursos de Artes e Moda. Duas vezes por semana ficava horas de sunga posando para desenhos dos mais diversos estilos. Essa fase durou de seis a sete anos.
Foi também enquanto estudava que começou a imaginar como seria correr os 100 quilômetros que já havia feito de bicicleta e várias vezes caminhando. Devorou um livro de um americano sobre corridas de longa distância e 10 semanas depois, aos 24 anos de idade, correu pela primeira vez 106 quilômetros. Levou 11 horas e 15 minutos.
Continua depois da publicidade
Desafios maiores
A partir daí sempre trabalhou em academias e intensificou os treinamentos e as metas. Criou o primeiro grupo de corrida da cidade e começou a participar de triátlons, além das provas de 100 quilômetros e de 24 horas, onde ganha que percorrer a maior distância em um dia. Em 2008 foi para Minas Gerais e passou um mês com um especialista em ultramaratonas, provas com mais de 100 quilômetros. João Roberto de Souza ensinou a ele tudo sobre a bioenergética, técnica com a qual Daniel consegue extrair energia do que está ao redor dele e não só da alimentação.
Em 2014 os desafios aumentaram. Ele foi staff de um atleta que participava do primeiro Ultraman do Brasil, no Rio de Janeiro. Era o requisito que faltava para que, no ano seguinte, ele participasse da competição. Foram 10 quilômetros nadando, 420 pedalando e 84 correndo. O resultado foi frustrante. Chegou em 10º lugar quando queria estar no pódio. Reconhece que foi vaidoso e arrogante demais.
Siga Pancho no Facebook, Twitter e Instagram
Em dezembro daquele mesmo ano ele dominava a corrida. Chegou a participar de uma prova beneficente de 300 quilômetros entre o Rio de Janeiro e Minas Gerais. A dúvida era o desempenho com a bicicleta. Para testar limites, pedalou sozinho até Porto Alegre (RS), 600 quilômetros, em 21 horas e 52 minutos. Chegou bem, sem dores e percebeu que poderia participar de um Quíntuplo Ironman, prova com 19 quilômetros de natação, 900 de bicicleta e 211 de corrida.
Consagração
Em outubro de 2016 chegou ao México como azarão. Mero desconhecido. Venceu a prova em 84 horas — três dias e meio — cruzando a linha de chegada quatro horas antes do segundo colocado. Bastou vencer para perceber que poderia disputar o Deca Ironman, com o dobro das distâncias.
Continua depois da publicidade
Como dito no início deste texto, ele disputou a prova de 10 dias no ano passado e chegou em segundo lugar. Em novembro ele embarca para os Estados Unidos com a meta de vencer e bater o recorde mundial.
::: Leia sobre outros rostos que passaram pelo projeto :::
Além de treinar, Daniel é sócio de uma academia em Blumenau. É coach pessoal e palestrante. Mora sozinho e está solteiro. Diz ser difícil encontrar alguém que entenda o estilo de vida dele. Para a prova de novembro, por exemplo, o treinamento é feito com abstinência de sono e de comida. Em três dos sete dias da semana ele não come, mas continua com as atividades físicas. Também se priva de sono, dormindo de duas a quatro horas por noite. Tudo para suportar os 10 dias de competição.
Lazer e futuro
Daniel gosta de uma festa. Frequenta o Baader Kaffe Bar, na Rua São Paulo, e o forró do Don Pub às quartas-feiras. Quando não está em jejum, tem alguns food trucks mapeados. Também gosta da praia e de ficar na areia sem fazer nada.
Neste ano ele lança o primeiro livro: Destruindo o Impossível. Em 2019 deve sair o segundo. A Beleza do Fracasso terá como base a opressão que viveu na infância e as consequências disso. Aos poucos deve deixar de dar aulas na academia, mas quer seguir se desafiando e competindo para também ampliar o trabalho como palestrante em direção aos grandes centros nacionais.
Continua depois da publicidade
ASSISTA A TRECHOS DA CONVERSA COM DANIEL DE OLIVEIRA RODRIGUES