Me sento em frente ao computador e olho para a tela em branco. Estou decidida a escrever algo a respeito do Dia dos Namorados, mas o quê? A clássica angústia dos colunistas. Antes que me venha a primeira palavra, aquela que puxa as demais, meu celular toca. É o Pedro. Ele está a 500km, trabalhando numa cidade perto da fronteira com a Argentina, retornará daqui a dois dias. São três da tarde e ele ligou apenas para mandar um beijo, dizer que está com saudades. Essas coisas que acontecem entre… pois é, entre namorados. Ele tem 62 anos. Eu quase 60.

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Em plena pandemia, somos dois sortudos vacinados e unidos contra o tédio. Sem pudor, dançamos no meio da sala, acumulamos rolhas de vinho, postamos fotos no Instagram e nos telefonamos a qualquer hora do dia, por nada – aquele nada absolutamente essencial.

Cumpri o script da boa moça: tive o primeiro namorado “sério” na adolescência e casei com o segundo. Nosso casamento durou duas décadas, tivemos duas filhas e depois de uma separação amigável, emendei com outra relação que, entre altos e baixos, resistiu por oito anos. Separada novamente aos 52, achei que estava mais do que na hora de aproveitar minha juventude.

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Dos 52 aos 57, namorei mais do que entre os 16 e 21. Foram relações curtas, que duraram de três a seis meses, mas nem por isso pequenas, desimportantes. Foi nessa etapa que consolidei meus vínculos fundamentais, que me estruturei para a liberdade possível e me assumi plenamente adulta, ou seja, abandonei as neuras e comecei a me divertir. Aprendi a me adaptar aos imprevistos, a recuperar sonhos deixados para trás e a renunciar a outros tantos, sem fazer drama.

Foi quando tive certeza de que felicidade nada tem a ver com a reprodução de fórmulas consagradas pela igreja e pela sociedade, e sim com a manutenção de um estado de espírito tranquilo, com investimento em cultura e informação, com abertura para o novo, com a aceitação de quem se é, do jeito que se é, mas sem egolatria. Cada uma das minhas breves relações pós-50 anos foi uma viagem profunda de autoconhecimento, e quando encerrei o “tour”, achando que a vida já tinha sido generosa o bastante, escutei um sinal de WhatsApp. Era o amigo de um primo, o conheci aos 17 anos, nem lembrava seu rosto. Não chegou atrasado. Levei tempo para ficar pronta. Ainda bem que ele esperou.

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Há três anos formamos um casal, mas não somos marido e mulher. Não moramos juntos. Não nos vemos todos os dias. Não há ciúmes e desconfianças. O compromisso maior não é um com o outro, e sim de ambos com a vida que acreditamos que vale a pena ser vivida: com consciência, desprendimento e respeito por aquilo que cada um construiu até aqui. Eternidade? Talvez ela não ultrapasse a próxima quarta ou quinta-feira.

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