Era 2011, minha primeira vez em Tóquio. Caminhava com minha filha pelo fervilhante bairro de Ginza quando, numa movimentada avenida, escutamos uma música de balada: de onde saía aquele som? Logo percebemos que vinha de uma loja, e para ela fomos atraídas. Na entrada, dois homens sem camisa, apenas de calças jeans, recepcionavam os clientes: como referência, imagine James Dean e Marlon Brando aos 20 anos. Uma vez lá dentro, vertigem: parecia que eram três da manhã, e não três da tarde.
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A música que se ouvia da calçada se transformou numa rave trepidante, era como estar numa casa noturna. Os três andares da loja eram interligados por grandes escadas com degraus iluminados como numa discoteca, mas o que impressionava eram os funcionários. Meninos e meninas saídos de capas de revista: incrivelmente lindos e sexys. Seduziam com bíceps, decotes, sorrisos e olhares, “deseja alguma coisa”? Saí de lá antes de fazer alguma besteira.
Estávamos na Abercrombie, marca de roupas casuais que estourou entre os jovens americanos nos anos 1990 e que fazia da exclusão o diferencial. Com várias filiais espalhadas pelo mundo, a empresa contratava a equipe não pelo currículo, mas pela aparência, e usava a moda como promessa de pertencimento: quem quisesse se sentir desejável como eles, bastaria vestir uma camiseta da grife.
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Técnica publicitária clássica, mas não demorou para que se percebesse que não havia negros, nem asiáticos, nem latinos, nem gordos naquela tribo. Adeus, reinado. “Abercrombie & Fitch, Ascensão e Queda” é o nome do documentário disponível na Netflix, para quem quer conhecer melhor essa história.
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O mundo mudou, continuará mudando e cada vez mais rápido. É verdade que as redes sociais sequestram nosso tempo e funcionam como um tribunal impiedoso, a que damos o nome de patrulha, mas é preciso reconhecer: que suporte elas têm dado à revolução em curso. A diversidade é a grande beneficiada pela fiscalização virtual – tolerância zero para preconceitos e segregações.
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O mundo descolado não é mais branco, nem magro, nem assim, nem assado. Afora a ética, que sempre deve ser protegida, não existe mais um monopólio de conduta. A idade certa para. O jeito certo de. A beleza padrão. A família ideal. Exclusão não vende mais nada e torço para que também não eleja mais ninguém, só quem se vale dela são as marcas e políticos em estado de putrefação.
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A Abercrombie não quebrou. Tem novos diretores, reformulou o modo de operação e adequou-se ao universo inclusivo. Era isso ou a morte. Consumidores jovens e maduros, pequenos e grandes empresários: já não há quem não saiba que o produto mais valioso do mercado, hoje, chama-se consciência.
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