É possível que meus leitores já saibam disso, mas preciso retornar à infância e lembrá-los que nasci num Circo Teatro de propriedade de meus pais, e nele passei minha infância e pré-adolescência. Quando completei quatro anos, ganhei de presente uma sanfoninha de quatro baixos, que passei a tocar “de ouvido” e que me transformou em uma das atrações do espetáculo. Os anos passaram, ainda tenho a última sanfoninha que executei no palco do circo e, por mais que minha mãezinha cuidasse, o tempo se encarregou de “machucá-la”.

Continua depois da publicidade

Quando vim para Santa Catarina em 1974, passei a procurar uma outra para comprar e como a fábrica de brinquedos da Hering de Blumenau já havia fechado, isso não foi possível. Meu amigo Ingo Penz (o alemão da Choppmotorrad da Oktober), que também tem e toca o instrumento, conseguiu reformá-la graças à amizade com um velho artesão que trabalhara na antiga fábrica.

Mesmo assim, continuei buscando um novo instrumento. Essa foto em que apareço com o instrumento é de 1958, quando o circo passou por Penápolis (interior de SP) e curiosamente voltou para as minhas mãos há pouco tempo, graças a um casal que hoje reside em São Joaquim (senhor Zezinho da Celesc e dona Nair). Imaginem essa emoção.

O melhor presente é o inesperado

E como a vida nos reserva surpresas, há alguns dias recebi uma mensagem da leitora Eliana, que me disse que havia assistido ao Palco JA de fim de ano, em que apareci executando Noite Feliz com os colegas do Jornal do Almoço, e que ela tinha uma proposta para me fazer. A família Trevisan, capitaneada pelo seu Homero (93 anos, aposentado na área do cooperativismo, viúvo da dona Ignez Maria Vissirini Trevisan, falecida em 2001) era composta por dois filhos (Carlos Alberto e Paulo Roberto) e três filhas (Leony, Ceres e Eliana).

Continua depois da publicidade

A filha Ceres sempre morou com o pai e com a perda da mãe cuidou dele com todo carinho no apartamento do Itacorubi. Quis o destino que ela, Ceres, falecesse em 2015 e, para aplacar a dor de sua perda, o pai e os irmãos decidiram que os seus bens mais importantes seriam doados. Um desses bens era justamente uma sanfoninha de quatro baixos, da Hering, que ela ganhou de presente há muitos anos e que estava guardada com muito carinho. E o escolhido para receber essa preciosidade fui eu. A única exigência era que eu pudesse visitá-lo para receber de suas mãos o inesperado presente.

E é evidente que minha visita se transformou num emocionado encontro com parte da família, com as lembranças de minha infância e do relacionamento tão bonito do seu Homero com sua esposa e especialmente com a filha Ceres. Poucas vezes na minha vida me senti tão acariciado como naquele pedaço de tarde que passei junto com os Trevisan. Agora, de posse de uma nova gaitinha, posso me arriscar a algumas participações especiais por aí. A eles, meu eterno carinho e gratidão.