Em tempos de pandemia tenho voltado no tempo e "viajado", sempre que se acentua o tal isolamento físico (acho inadequado o termo isolamento social, mas sei que apesar das redes sociais, o termo solidão continua existindo dentro de cada um de nós). Outra frase muito legal que tem pontuado minha autoestima é transmitida pelos companheiros do RH aqui da empresa é propõe: – Isolamento social não é sinônimo de isolamento afetivo.

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Nessas viagens mentais (quase quânticas), rememoro situações que demonstram claramente que a educação formal (professor, escola, carteiras, alunos, conteúdos pedagógicos, etc) é muito importante, mas pode ser superada com boa vontade, dedicação, empenho e principalmente criatividade.

Meu pai, por exemplo, não passou do terceiro ano primário em uma escolinha rural integrada no pé da Serra da Mantiqueira ao lado do Ribeirão Lavatudo e mesmo assim superou em vida quase todas as dificuldades enfrentadas e provocou algumas mudanças em nossas vidas que até hoje me fazem respeitá-lo como um autodidata criativo de primeira linha.

Veja, por exemplo, o que ele aprontou por volta de 1958, quando chegamos com o Circo Teatro Motinha e Nhá Fia numa pequena cidade chamada Cândido Motta, localizada na alta Sorocabana, interior paulista. Ali, meu pai conheceu um mecânico chamado Duílio Carnevalli, dono de uma oficina e como ele, um autodidata com pouco estudo formal, mas, aberto ao novo e apaixonado por inovações.

Como eu já estava com quase 7 anos e meu irmão Gilberto passava dos 3, o único banco da cabine da Ford F5 que meu pai possuía já estava pequeno para nós quatro. Por que não aumentar a cabine um pouquinho, diminuindo a carroceria cuja utilização não era das maiores? Duílio, o dono da oficina topou na hora a sugestão e da iniciativa surgiu o que considero uma das primeiras cabine-dupla ou estendida do país (se não a primeira).

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Confesso que nunca me preocupei saber de onde vinham aquelas idéias do meu pai. Apenas curtia com ele a possibilidade de vê-las transformadas em algo real, palpável e útil, como foi o caso de nossa "cabine estendida". Pouco me importava se era uma ideia pioneira, para uma época em que quase nada saia do normal, do trivial, da rotina e os modelos de automóveis ou utilitário praticamente não mudavam de um ano para o outro.

Lembro-me no entanto, da cara de espanto das pessoas quando a Caminhonete do Circo chegava na cidade, chamando a atenção das pessoas que acabavam aceitando com a frase tradicional:- "Só podia ser do Circo"…

Com aquela F5, viajamos muitas vezes para a casa de minha avó em Cruzeiro. De lá ao Rio de Janeiro onde visitávamos o radialista Alziro Zarur, fundador da LBV – Legião da Boa Vontade, que mantinha na Rádio Mundial uma programação espiritual da melhor qualidade e cuja obra assistencial pelo mundo se mantém até hoje. Orgulhosamente eu fui um "Soldadinho de Deus" – era assim que as crianças eram denominadas pela LBV.

Antes de chegar à casa da avó, uma parada obrigatória era Aparecida do Norte, na época apenas com uma pequena igrejinha na praça principal da cidade. A 170 km de São Paulo, hoje a cidade conta hoje com a Basílica de Aparecida, o maior santuário do Brasil e o segundo maior no mundo, com capacidade para 45 mil fiéis.

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Numa segunda viagem, em Aparecida.
Em uma segunda viagem, em Aparecida. (Foto: Arquivo Pessoal )

Essa foto em Aparecida do Norte, mostra a nossa F5 Cabine Dupla nos levando ao Rio de Janeiro já em 1959, quando e aonde participei do filme Maria 38, produzido e dirigido por Watson Macedo. Mas, essa já é outra história.

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Em recente pesquisa, descobri que a ABR-Auto Renovadora Boff Ltda. do empresário Raul Zeferino Boff de São Marcos, RS, usa o título de – Primeira Cabine Dupla do Brasil – mas, curiosamente vi que ela foi construída em 1960. O fato é que a nossa cabine dupla, foi construída no final de 1958, portanto dois anos antes do belíssimo projeto desenvolvido e construído profissionalmente pela ABR em São Marcos.

1960 - Cabinão de São Marcos.
1960: cabinão de São Marcos. (Foto: Site ARB / Lexicar / Divulgação)

Legenda que acompanha essa foto: "Em 1960, na pequena cidade gaúcha de São Marcos, com aproximadamente 1.600 habitantes, nascia um produto que iria revolucionar o uso de utilitários fora-de-série no Brasil. Com uma pequena oficina no fundo de seu quintal, Raul Zeferino Boff nem sonhava que o alongamento de uma cabine dupla para uso próprio despertaria tanto interesse. A camionete Ford F-100 de sua propriedade ficou conhecida como o Cabinão de São Marcos. Era a afirmação da 1ª cabine dupla do país. Com o sucesso de sua camioneta e a insistência de amigos para que alongasse seus veículos, seu Raul se viu forçado a montar uma pequena indústria. Em 1967 fundou a empresa ARB-Auto Renovadora Boff LTDA, a qual foi solidificando o nome em todo o mercado nacional."

Vale o respeito e o reconhecimento pela iniciativa do seu Raul e o sucesso de sua Indústria, que até hoje atende o país e o exterior com suas belíssimas adequações veiculares, mas – a foto de nossa cabine dupla em frente a igrejinha de Aparecida é de 1958, portanto…

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