Quando minha primeira filha nasceu eu estava nervoso demais para racionalizar o que estava acontecendo, era tanto papel para assinar e conta para pagar e fralda para trocar que tudo que eu queria era não transparecer minha completa falta de preparo para o assunto.
Lembro de ser um pai atrapalhado, talvez o mais atrapalhado de todos, foram tantos cocôs vazados e fraldas deixadas no chão, foram tantas as vezes que deixei ela escorregar na banheira e engolir água, foram tantas as vezes que coloquei as roupas ao contrário, e outras tantas que a fiz passar calor demais ou frio demais, que por anos imaginei que jamais aprenderia a ser pai.

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Ela aprendeu a falar e a andar e acabou acontecendo de eu conseguir lidar com creche, trabalho, contas, fraldas, começamos a passear juntos e brincar juntos e acho que ela aprendeu a me amar, mesmo com meu jeito atrapalhado. Ela corria para me encontrar quando eu chegava do trabalho e nos finais de semana ela não queria desgrudar de mim. Viajamos algumas vezes de avião juntos, só eu e ela, os outros passageiros sempre me perguntavam se estava tudo bem, se eu queria ajuda. Eu fingia que não.

Viajamos algumas vezes de avião juntos, só eu e ela, os outros passageiros sempre me perguntavam se estava tudo bem, se eu queria ajuda.

Quando chegou a irmã acho que fui ainda mais atrapalhado, me dedicando novamente a todos os trâmites do bebê e me esquecendo de dar atenção para a mais velha. Acho que ela se ressentiu e demorou para eu entender que precisava dar atenção exclusiva para as duas. Me lembro que, quando saíamos juntos para passear só eu e a mais velha, ela dizia sempre: “adoro conversar com você, papai”, como quem diz “não esquece que eu existo”.

Na pré-adolescência teve dramas, que eu tentava atrapalhadamente resolver, e ela sempre só pedia pra eu ficar quieto e ouvir. “Não quero solução, quero desabafar”, ela dizia. Esses dias chegou triste da escola. Foi para o quarto e deitou na cama. Esperei um tempo e fui até lá. Abracei-a, ela retribuiu. Não falamos nada, abraçados por alguns minutos. Então, ela disse: “Obrigado”. E me senti um pai um pouco menos atrapalhado.

Um dia, quem sabe, eu aprendo. Filhos são para sempre. Esta semana ela faz 15 anos.

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