Escrevo de frente para a pilha de livros que acumulamos durante a pandemia, todos em cima da mesa do escritório, formando cinco pilhas improvisadas e mal organizadas de nomes intimidadores que foram chegando e empurrando meu espaço de trabalho. Me fazem companhia a Toni Morrison, o Mia Couto, a Maya Angelou, ao lado de novos amigos, o Jeferson Tenório e a Rachel Cusk.

Continua depois da publicidade

> Receba as principais notícias de Santa Catarina no WhatsApp

A Elena Ferrante sustenta a pilha de livros da esquerda. Temos a série napolitana, e ali no meio está o atualmente badalado, por conta do filme novo na Netflix, “A Filha Perdida”. Achamos o filme bom. Rosa Monteiro, a jornalista espanhola, está logo em cima. A “Louca da Casa” é um dos livros mais deliciosos sobre a escrita. “Lágrimas na Chuva” é um clássico e “Te Tratarei como Uma Rainha” é ótimo. “A Ridícula Ideia de Nunca Mais Te Ver”, triste e lindíssimo.

Não sei como demorei tanto tempo pra conhecer a Rosa Monteiro. Agora sinto que sou seu amigo. Daqueles amigos admiradores que, se estivéssemos um dia tomando um café, ficaria o tempo todo tentando agradá-la. “Você quer mais açúcar? Não está ventando muito neste lugar? Posso fechar a porta atrás de ti”, sabe, aquele tipo de amigo.

> Mamãe é super

Continua depois da publicidade

A segunda pilha tem a Vera Iaconelli, coitada, sozinha, lá embaixo, esmagada por livros africanos, autoras gaúchas e dois pequenos livros da Patti Smith. O novo da Djamila Ribeiro está ali, embaixo do “Pergunte ao Pó”, que li na faculdade e mudou minha vida. Não sabia que era possível escrever daquele jeito. Na terceira coluna Haruki Murakami carrega todos os outros nas costas. Quando viciamos no Murakami procurei livros dele por todos os lados. Entrei em um sebo, certa vez, e quando perguntei sobre algum livro dele a atendente riu: “Murakami não dura dois segundos em nenhum sebo do mundo”.

> Sonhos

Alice Munro conversa com a jovem escritora americana Madeline Miller. Nesta pilha se encostam Joyce Carol Oates, Garth Greenwell e Antonio Tabucchi. Estava procurando a biografia do querido Oliver Sacks, agora achei. Está ali do lado do “O Som e A Fúria”. Logo acima, meu estimado professor A. S. Neil, autor de “Liberdade Sem Medo” (em edição dos anos 1960, quando medo se escrevia ainda com acendo circunflexo), livro tão revolucionário quanto antigo. Coincidência ou não, o danado está junto com a bell hooks e a Virginie Despentes, duas agitadoras. Acho que, no meio da noite, os autores se reorganizam para ficar perto de quem gostam mais.

> Leia outras colunas de Marcos Piangers

A última pilha é sustentada pelo nosso favorito, David Sedaris. Não há ninguém que escreva humor sobre família como o Sedaris. Nesta pilha ainda está um Dostoiévski plastificado, jamais lido, como a maioria dos Dostoiévskis do mundo. No topo da pilha, Yogananda me olha, pleno, na capa da Autobiografia de um Iogue. Não há nada menos eficiente do que um livro: são pesados, ocupam espaço, são o terror quando você muda. Ainda assim, não consigo largá-los. Preenchem a casa, fazem companhia, na única aglomeração possível por esses dias.

Leia também:

> O calorão já tem data para terminar em SC? Veja a explicação

> Casa com faixa “proibido visitas” viraliza em SC; saiba o motivo

> Menino chora perda de melhor amigo e história por trás de foto causa indignação