*Por Maria Teresa Bustamante
O presidente Trump tem intensificado sua luta contra o multilateralismo em uma das suas vertentes mais representativas que são as negociações comerciais sob amparo das normas e regras estabelecidas pelos países membros da Organização Mundial do Comércio (OMC). Esse posicionamento foi alavancado pelo fracasso das negociações lançadas em 2001 com o objetivo de diminuir os entraves ao comércio internacional que, após sete anos, os países membros não conseguiram superar a divergência sobre o nível de abertura dos mercados em setores de interesse. Os países em desenvolvimento lutavam por contar com maior acesso aos mercados dos países desenvolvidos para os produtos agrícolas e uma efetiva redução ou eliminação dos subsídios concedidos aos agricultores nativos. Os países desenvolvidos queriam acesso livre aos mercados para bens industriais e serviços.
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Esse descompasso de interesses, falta de consenso e acusações encerraram a rodada OMC-Doha em 2008. O fracasso em 2008 abriu um questionamento sobre o futuro não só da OMC, mas, principalmente, da efetividade do multilateralismo no formato estabelecido. Desse modo, o debate sobre uma reforma institucional começou a ganhar intensidade e, ao mesmo tempo, foi potencializada pelo surgimento de agrupamentos como o Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), porta-voz de países emergentes, e o G20-Financeiro, novo marco de governança econômica internacional.
Nesse contexto, cabe lembrar que o conceito consagrado de multilateralismo é um sistema abrangente de interação entre países em que cada um buscará encontrar resultados equilibrados. Assim, se constitui de uma dinâmica em que se cedem e se recebem concessões de acesso aos mercados para temas de comércio, meio ambiente, direitos humanos, entre vários tópicos.
O multilateralismo não padece do desgaste de promover ações unilaterais ou bilaterais tendo em vista que as instituições criadas são o foro por excelência como o caso da OMC. As instituições multilaterais contemplam na prática a instauração de projetos políticos encapsulados por meio de metodologias adotadas para negociação de acordos a fim de estabelecer meios de cooperação e utilizar, com base em regras e normas, a adesão aos ordenamentos jurídicos que sejam incorporados pelos países membros dessas instituições. Além disso, as instituições multilaterais, como a OMC, garantem um mínimo de previsibilidade aos seus países membros na condução institucional das relações comerciais entre si.
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A ausência de alcançar sucesso com o exercício do multilateralismo deu lugar ao ressurgimento no cenário internacional do seu lado oposto e perverso: o retorno do protecionismo. O protecionismo, que parecia erradicado principalmente nos países desenvolvidos, está na contramão da realidade global vivenciada no século 21.
O que está em jogo é abertura de mercados, crescimento, trabalho, desenvolvimento, paz e estabilidade, e a única formula de governança global é insistir na atualização de um multilateralismo comercial realista. Do contrário, o protecionismo prevalecerá e a OMC poderá sucumbir. Cabe à OMC e aos países membros a envidarem esforços para ampliar e aprofundar o multilateralismo e, com isso, equacionar os impulsos protecionistas de alguns países.
*Maria Teresa Bustamante é doutora em Administração e Consultora em Comércio Exterior