A tese da “indústria da multa” não só venceu o debate sobre fiscalização do trânsito em Blumenau como está prestes a virar lei. Por unanimidade, a Câmara de Vereadores aprovou nesta quinta-feira (4) um projeto que proíbe a Guarda de Trânsito de usar radares portáteis — os temidos secadores. Catorze parlamentares votaram a favor — o presidente Egídio Beckhauser (Republicanos) só votaria em caso de empate.

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O texto aprovado é, na verdade, um substitutivo global a um projeto de lei de autoria do vereador Jovino Cardoso (Solidariedade) — o mesmo que já foi flagrado espalhando no Whatsapp áudios em que informava a localização de blitze da Guarda. Conforme o projeto, passa a ser “vedado aos órgãos de trânsito do município de Blumenau, o uso de dispositivo registrador de velocidade do tipo móvel – radar portátil – cuja fiscalização seja realizada de dentro dos veículos de trânsito em movimento, ou mesmo estando o agente público fiscalizador em pé ao lado da via pública”.

Desta forma, garante-se aos infratores de velocidade a certeza de quando e onde estarão sendo fiscalizados. É uma lógica bizarra, mas que convence muita gente porque dói — principalmente no bolso — descobrir-se um infrator. Tanta gente que nenhum vereador, mesmo aqueles que exaltam a ciência, a legalidade, a tecnicidade na gestão pública e uma “cidade para as pessoas”, teve coragem de opor-se à ideia estapafúrdia. E, além de tudo, potencialmente inconstitucional.

O parecer da assessoria jurídica da Câmara de Vereadores, paga pelos contribuintes para orientar os parlamentares, produzido em 2019, esclarece que “não tem o município competência alguma para produzir leis em sentido formal a respeito do trânsito, tendo tão somente uma capacidade normativa de natureza puramente regulamentar, a ser produzida pelos órgãos executivos do trânsito”. Por outro lado, o mesmo documento cita decisões recentes do Tribunal de Justiça de Santa Catarina que tratam a questão de modo diferente: os vereadores estariam legislando sobre “fiscalização de trânsito”, e não sobre o trânsito em si.

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Como os tribunais abriram brecha para avançar na questão, os integrantes da Comissão de Constituição e Justiça à época resolveram seguir a segunda orientação. Agora, 14 parlamentares foram pelo mesmo caminho. A saber qual será o posicionamento do prefeito Mário Hildebrandt (Podemos). Não custa lembrar: desde julho do ano passado está suspenso o contrato com a empresa que fornecia os radares à Seterb.

O objetivo da proposta de lei é dificultar ainda mais a adoção de ferramentas eletrônicas para conter o excesso de velocidade em Blumenau. Equipamentos que já se provaram eficazes para reduzir o número de acidentes graves, principalmente atropelamentos.

Mas na cabeça de quem brada “indústria da multa” o que importa mesmo é acabar com as multas, não com os acidentes.

Correção

O texto original desta coluna continha erro. Ele afirmava que a assessoria jurídica da Câmara de Vereadores havia emitido parecer contrário ao projeto de lei. Na verdade, o relator do projeto na CCJ é que havia se manifestado em contrário, baseando-se em informações do parecer. A assessoria jurídica indicava “vícios sanáveis” no texto — eles foram eliminados pelo substitutivo global.

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Como há duas correntes jurídicas contraditórias na análise da questão, e a ilegalidade da proposta não é ponto pacífico nos tribunais, o termo “inconstitucional” foi retirado do título do post. O erro permaneceu no ar até 18h de sexta-feira (5).

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