Quem deve ser vacinado contra a Covid-19 primeiro: um idoso de 75 anos ou um jovem professor de Educação Física? À primeira vista, a resposta parece óbvia. Mas Santa Catarina descobriu esta semana que não funciona bem assim.
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Blumenau começou a vacinar todos os profissionais de saúde, incluindo instrutores de academias, nutricionistas, veterinários, biólogos e terapeutas, independentemente de idade e local de trabalho. Ao mesmo tempo, só idosos com mais de 90 anos começam a ser imunizados nesta quarta-feira (10).
Para o superintendente da Vigilância em Saúde do Estado, o epidemiologista Eduardo Macário, o procedimento condiz com as orientações disponíveis do Ministério da Saúde e faz sentido no cenário de escassez de doses. Sem poder abrir a vacinação de grupos numerosos, como idosos acima de 75 anos ou professores, os municípios devem imunizar trabalhadores da saúde em paralelo ao avanço sobre os demais grupos prioritários.
Recém-empossado e com a missão de liderar a campanha de vacinação em Santa Catarina, Macário admite uma “falta de entendimento” sobre quem são os trabalhadores em saúde abrangidos nesta fase da campanha e deseja que o Ministério da Saúde esclareça as dúvidas levantadas pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, que exigiu um detalhamento dos grupos prioritários para evitar polêmicas como a de Blumenau.
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Confira abaixo a entrevista concedida à coluna:
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O procedimento de Blumenau está de acordo com os planos nacional e estadual de vacinação?
O Ministério da Saúde elencou as categorias profissionais que fazem parte do grupo de trabalhadores da saúde, isso está bem claro nas diversas categorias que serão contempladas com a vacina contra a Covid-19. Como em Santa Catarina não recebemos um total de doses para a população de trabalhadores da saúde, fizemos uma pactuação com os municípios para que, do quantitativo encaminhado, que equivale a 50% dos trabalhadores estimados, nós deveríamos priorizar os trabalhadores da linha de frente. Feito isso, na medida em que esses grupos fossem contemplados, para os demais trabalhadores da saúde nós elencamos um critério: trabalhadores acima de 60 anos ou que têm comorbidades devem ser prioridade e aos poucos vai vacinando 100% do contingente. Se o município já alcançou os trabalhadores que atuam na linha de frente, todo o hospital já foi vacinado, desde a recepcionista, o copeiro, rouparia, serviço de apoio e clínicas de atendimento, você vai expandindo para outros a critério do município. Tem as orientações, mas aí ele usa o bom senso. O que nós não recomendamos é vacinar, por exemplo, um profissional que não tem contato direto com o público, e principalmente não faz atendimento direto da Covid-19, e deixar um profissional que tem contato direto esperando a vacina. Isso está claro nas orientações técnicas que o Estado vem dando.
Um ofício do Ministério da Saúde diz que nas primeiras fases deveriam ser vacinados 34% dos profissionais de saúde. Santa Catarina já passou desse percentual?
Sim. Esse primeiro informe que o ministério mandou, de 34%, foi quando eles encaminharam aquelas primeiras doses. O ofício fala que os gestores devem se responsabilizar em cumprir as determinações. Não pode, por exemplo, neste momento abrir uma vacinação para professor porque não tem doses suficientes para os trabalhadores da educação. Você não pode gastar a primeira e a segunda dose vacinando duas pessoas porque ainda não tem quando vão chegar novas remessas. Acho que é a primeira campanha de vacinação que a gente faz com uma quantidade tão pequena de vacinas. Nem na campanha da influenza, durante a pandemia do H1N1, a gente viveu uma restrição tão grande. Mas é o que é possível fazer no momento para garantir tanto a linha de frente protegida como também a população vulnerável de idosos.
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Faz sentido vacinar primeiro um jovem profissional de nutrição ou biologia, sem comorbidades, antes de idosos?
A vacinação tem dois objetivos: proteger a população vulnerável e ter a força de trabalho 100% disponível. Como o documento nacional se pauta em que todos os trabalhadores em saúde serão vacinados nesta primeira fase, é quase um mantra que a gente segue. Se o Ministério da Saúde, ao acatar a recomendação do STF, ele claramente elencar: “trabalhadores da linha de frente” ou “trabalhadores dos hospitais”, alguma coisa nesse sentido, e que os demais trabalhadores serão elencados numa outra fase, isso poderia ajudar bastante a resolver essa falta de entendimento. Existe o bom senso, mas também existe a regra geral.
Essa provocação do STF vejo com muito bons olhos para que seja feita uma diretriz nacional que todo mundo respeite e que, concordo contigo, precisa preservar os mais vulneráveis e os mais expostos à Covid-19.
> Como será a fila da vacinação de idosos em Santa Catarina.
O Plano Nacional de Vacinação define trabalhadores em saúde como “aqueles que atuam em espaços e estabelecimentos de assistência e vigilância à saúde, sejam eles hospitais, clínicas, ambulatórios, laboratórios e outros locais”. Esse “outros locais” permite uma interpretação dúbia?
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Não é que permite uma interpretação dúbia, esse é o conceito de trabalhador de saúde. É um profissional que pode tanto trabalhar num hospital, numa unidade de apoio, fazer trabalhos de acompanhamento de qualquer tipo de pessoa, e aí se enquadra um rol de categorias profissionais. Na vacina da gripe, por exemplo, a gente recebia quatro remessas de milhões de doses antes de começar a campanha. Aí era suficiente, a gente abria. Tinha doses para todo mundo. Só que agora é diferente, a gente não tem esse quantitativo de doses. Entendo a ansiedade por parte de toda a população, mas tem que haver um entendimento de que nós estamos fazendo o possível neste momento.
Se o Estado decidisse vacinar agora todos os idosos acima de 75 anos, não haveria doses para todo mundo?
Não, a gente precisaria de 600 mil doses. Acima de 90 anos nós temos 26 mil idosos. Então, com as doses que a gente recebeu dá para fazer e continuar a vacinação dos trabalhadores em saúde.
Tem mais municípios além de Blumenau vacinando todos os profissionais de saúde?
Não tenho essa informação. Os municípios precisam acatar as deliberações e promover a vacinação segundo graus de prioridade. Não sei se isso se aplica a Blumenau e aos outros municípios, mas essa é a orientação.
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De acordo com o consórcio de veículos de imprensa, Santa Catarina é o quarto estado que menos vacinou proporcionalmente. O que é possível fazer para acelerar?
Primeiro, eu questiono esse indicador. Nós tínhamos capacidade, até semana passada, de vacinar 140 mil pessoas e nós tínhamos vacinado 90 mil no Estado inteiro. Isso mostra que a nossa cobertura vacinal com primeira dose estava superior a 60%. Agora, quando a gente pega essa comparação geral, nós temos 7 milhões de habitantes, vacinamos 90 mil pessoas, aí dá 1,2%. A campanha de vacinação, neste momento, não tem o objetivo de vacinar 100% da população. O Plano Nacional coloca que Santa Catarina tem uma meta nessas quatro etapas de campanha, uma estimativa de 2,8 milhões de pessoas. Voltando à sua pergunta: o que fazer para os municípios acelerarem? Montar estratégias, o planejamento. Cadastrem as pessoas, quando chegar a vacinação já monte as equipes, faça a operacionalização, não deixe as pessoas esperando. Espero, sinceramente, até como epidemiologista, que a gente consiga até o final da semana vacinar 100% dos idosos acima de 90 anos. É a meta que coloquei para os municípios e espero que eles se empenhem para cumprir isso o quanto antes. São várias opções, desde o agendamento, montar equipes volantes de idosos acamados, fazer a vacinação in loco nos hospitais. São estratégias normais, nada diferente do que já é de conhecimento público.