Girafas apreendidas nesta semana pela Justiça do Rio de Janeiro por suspeita de importação irregular e maus-tratos haviam sido oferecidas ao Zoo Pomerode antes de chegarem ao Brasil. Denúncias sobre o tratamento dado aos animais foram motivo de reportagem do Fantástico, da Rede Globo, no domingo (30). Das 18 girafas trazidas da África do Sul em novembro, três morreram em circunstâncias sob investigação do Ibama, da Polícia Federal e do Ministério Público Federal.

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O diretor do Zoo Pomerode, Maurício Bruns, disse à coluna ter negociado três girafas, quatro zebras e três impalas com o Bioparque do Rio de Janeiro, responsável pela importação dos bichos. As conversas começaram em 2020, mas foram interrompidas em agosto de 2021, depois que o preço apresentado disparou, sob a justificativa de aumento nos custos com transporte.

— Numa das reuniões me falaram que só as girafas custariam R$ 1,8 milhão. Pedi uma planilha de custos para ver se esse valor era verídico ou não, aí começaram a enrolar e no fim saímos — disse Bruns.

Segundo a reportagem do Fantástico, as girafas chegaram ao Brasil no dia 11 de novembro e foram levadas para instalações em um hotel de Mangaratiba, no litoral do Rio de Janeiro. A compra de zebras e impalas não teria sido concretizada. No dia 14 de novembro, seis girafas derrubaram uma cerca e fugiram. Após a recaptura, três morreram. Conforme a reportagem, um laudo feito por especialistas do Bioparque concluiu que elas tiveram miopatia, circunstância possivelmente causada por estresse.

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Na última quarta-feira (26), após denúncias, Polícia Federal e Ibama fizeram uma operação no hotel em Mangaratiba. Encontraram baias de 31 metros quadrados com três girafas cada, espaço considerado insuficiente. Os animais estavam confinados, sem tomar sol, desde a fuga de dezembro.

A investigação apurou que algumas das girafas seriam encaminhadas a outros zoológicos brasileiros. O de Pomerode foi citado por um analista ambiental do Ibama em depoimento. Na semana passada, um delegado da PF fez contato por telefone com a direção do zoo. Segundo Bruns, objetivo era saber se a instituição teria condições de receber os animais.

Confinamento

O confinamento das girafas no RJ, criticado por autoridades e ambientalistas, também foi visto com estranhamento pelo gerente do Zoo Pomerode. Em 2007, o zoológico catarinense importou girafas diretamente, sem intermediários no Brasil. Naquela época, os animais permaneceram isolados por cerca de um mês para cumprir quarentena sanitária — sempre há o risco de importar doenças junto. Uma estrutura com 150 metros quadrados foi montada para três girafas.

Segundo Maurício Bruns, a cerca construída tinha altura suficiente para impedir que as girafas pudessem enxergar o outro lado. Havia vigilância armada, para evitar invasores, e um veterinário cuidando exclusivamente dos bichos. Tão logo encerrada a quarentena, as três girafas foram levadas para o destino final, no interior do zoológico. No Rio, o período de adaptação já passa de 80 dias.

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— As coisas acontecem de maneira errada quando se tapa o sol com a peneira. Quando se faz as coisas com transparência, não há problema — avaliou Bruns.

A investigação no Rio de Janeiro ainda verifica a origem das girafas importadas. Conforme a reportagem do Fantástico, a documentação do processo indica que os animais teriam sido retirados da natureza. Neste caso, o transporte para o Brasil seria proibido. Apesar disso, o Ibama autorizou a importação.

O gerente do Zoo Pomerode informou à coluna que não se envolveu no processo de importação em si. Analisando as informações disponíveis sobre o caso em retrospectiva, Maurício Bruns acredita que as girafas tenham sido retiradas legalmente, para controle de população, de alguma área de conservação no continente africano. Ele não acredita na hipótese de que tenham sido capturadas e transportadas sem obediência aos trâmites legais.

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Contraponto

A coluna questionou o Bioparque do Rio de Janeiro sobre as negociações para envio de girafas a outros zoológicos. Em nota, a empresa disse que “alguns indivíduos irão, conforme estudos de análise genética, para outras instituições parceiras que possuem girafas”. O texto não esclareceu se houve negociações com o Zoo Pomerode.

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O Bioparque também negou que tenha havido maus-tratos e qualquer ilegalidade no processo de importação das girafas. Veja o texto enviado à coluna na íntegra:

O BioParque do Rio reitera sua absoluta responsabilidade com o manejo de fauna e com projetos de longo prazo de restauração da natureza, amparados em educação, pesquisa e conservação de espécies. Não há maus-tratos a animais. O manejo ex situ de espécies é uma importante ferramenta complementar de conservação da biodiversidade e a ele foi dedicado o artigo 9º da Convenção sobre a Diversidade Biológica (CDB), assinado pelo Brasil em 1992. 

Diante do cenário, o BioParque do Rio informa:

— Sobre a liminar do MPF, a empresa, por meio de seu corpo jurídico, está analisando a decisão para adotar os caminhos legais cabíveis. É importante ressaltar que a empresa possui todas as licenças necessárias e que atende a regulamentação aplicável, conforme demonstrará em juízo;

— Quanto ao laudo de necropsia da morte das girafas, o documento foi entregue às autoridades competentes. O INEA pediu esclarecimentos técnicos e o BioParque do Rio solicitou a ampliação do prazo das respostas, que já estão sendo elaboradas para serem enviadas ao órgão;

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— O grupo de girafas veio de uma reserva autorizada para manejo sustentável e desenvolvimento comunitário com essas espécies na África do Sul. Como os animais são oriundos de tal local, o código determinado pela Convenção sobre Comércio Internacional das Espécies da Flora e Fauna Selvagens em Perigo de Extinção (Cites) é W. Em qualquer exportação que ocorra, para qualquer lugar no mundo, a Cites sempre irá atribuir a sigla W em casos específicos de animais oriundos de reservas de manejo sustentável. A instituição foi devidamente aprovada pelos órgãos competentes brasileiros e sul-africanos e não há ilegalidade no processo de importação que foi aprovado pelos dois governos;

— O BioParque do Rio reforça ainda que, ao contrário do que sugerem denúncias, os animais não sofrem maus-tratos. O parque conta com uma equipe dedicada às girafas, formada por sete especialistas no manejo dessa espécie, entre veterinários, biólogos e zootecnista. Os indícios apontados como sendo maus-tratos de forma alguma caracterizam tal situação. Os animais têm fichas de acompanhamento diário nas quais constam informações sobre condutas comportamentais naturais, atividades de enriquecimento, relações positivas com os tratadores, a própria relação entre elas, além de ganho de peso e desenvolvimento corpóreo. A área total das girafas no Portobello Safari é de aproximadamente 44mil m². Existem quatro estágios para a adaptação dos animais: 1) cambiamento (ambiente controlado para o manejo) 2) acesso ao solário 3) recinto de manejo 4) recinto de 44mil m². A evolução dos estágios de adaptação dos animais leva em consideração o seu comportamento adaptativo e alinhamento com os técnicos do IBAMA e INEA;

—As girafas estão classificadas na categoria vulnerável pela lista vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) e ter animais em outro continente é uma estratégia de preservação importante, a exemplo de outras espécies emblemáticas que foram salvas por projetos semelhantes: mico-leão-dourado e ararinha-azul. As girafas seguem um Programa de Conservação. Parte dos animais ficará em Portobello, parte irá para o BioParque do Rio e alguns indivíduos irão, conforme estudos de análise genética, para outras instituições parceiras que possuem girafas, conforme a evolução do programa de conservação integrada, sempre visando o bem-estar dos animais;

—Por fim, transformar o propósito da conservação em realidade é uma jornada longa, de mais de 40 anos. Além do programa de conservação das girafas, o BioParque do Rio participa de vários programas de pesquisa e conservação e está à frente de um estudo nacional em biotecnologia para conservação de onças-pintadas. A concessionária também participa de um projeto com guarás-vermelhos, que estiveram presentes na Baía de Guanabara há quase 100 anos e que estão passando por uma pesquisa para viabilizar a sua reintrodução na natureza. Ainda há outros projetos de destaque, como a reintrodução das araras-canindés no Parque Nacional da Tijuca, a instalação de um Centro de Conservação de Carnívoros para apoio aos órgãos ambientais no resgate, recuperação de espécies ameaçadas, sempre trabalhando alinhado e em parceria com diversas instituições de pesquisa e órgãos ambientais.

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