O melhor conforto que o Exército pode oferecer às famílias do acidente com um caminhão em Blumenau que matou três soldados e feriu outros 38, na quarta-feira (16), é transparência. Passados dois dias e concluídas as cerimônias fúnebres, é hora de explicar como um caminhão com 41 rapazes na carroceria caiu em um barranco do bairro Progresso.

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São muitas questões sem resposta e, até aqui, pouca disposição da instituição para relatar a tragédia e o que vai se fazer a partir dela. Desde as primeiras horas, familiares dos envolvidos reclamam da dificuldade de obter informações e de falar com as vítimas. O Exército divulgou duas notas protocolares. 

Repórteres foram orientados a pedir informações via Lei de Acesso à Informação — que dá prazo de até 30 dias para a instituição responder. Na noite de quinta-feira (16), jornalistas de Blumenau criaram um grupo de WhatsApp com o responsável pela comunicação do 23º BI para insistir na realização de uma entrevista coletiva — em 22 anos de jornalismo local, é a primeira vez que vejo um levante da imprensa por acesso a informações.

Entrevista do comandante

Horas antes, o repórter Rodrigo Gonçalves, da NSC TV, havia encontrado no velório o comandante da 14ª Brigada de Infantaria Motorizada, em Florianópolis, o general de brigada Márcio Luis do Nascimento Abreu Pereira. Até aqui, é a única manifestação mais detalhada do comando militar sobre o ocorrido. Pela relevância (e ineditismo) da entrevista, reproduzo o que ele disse:

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Consternação

— A 14ª Brigada de Infantaria Motorizada está consternada e em luto por conta dessa fatalidade, desse terrível acidente, que ceifou a vida de três dos nossos soldados e deixou alguns feridos ainda em estado grave, hospitalizados.

 Resgate e apoio

— Nós enviamos desde ontem (quarta) todo o apoio que nós tínhamos em Florianópolis, onde fica a sede da brigada. Mandamos para cá viaturas, médicos, psicólogos, o nosso padre, que é o capelão militar, tudo com o intuito de trazer o máximo de conforto à família militar, e prestar a melhor assistência possível a essas vítimas. 

 O treinamento

— Esses militares estavam se deslocando para o campo de instrução do 23º Batalhão de Infantaria para realizar uma instrução prevista no período de instrução individual básica, que é o tiro. Os soldados estavam iniciando essa prática do tiro para se capacitarem e poderem manusear o nosso fuzil, que é o armamento do nosso soldado.

Investigação

— De imediato foi instaurado um inquérito policial militar. Nós já temos nomeado um oficial que vai conduzir esses trabalhos, que já esteve na área desde os primeiros momentos. Paralelo a esse inquérito policial militar, nós teremos um parecer técnico a cargo de uma outra unidade nossa, que vai analisar as causas técnicas que podem ter levado a esse acidente.

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— O que sabemos até agora: era um deslocamento para instrução, onde a viatura escorregou pelo barranco, provavelmente capotando, pelos relatos que se tem até o momento. Deve ter capotado aproximadamente três vezes ou mais, e parou numa árvore.

Segurança no transporte

— Essas são viaturas de 5 toneladas que têm a capacidade para transportar na carroceria cerca de 40 militares, fora os militares que vão na boleia, que são o chefe da viatura e o motorista. Isso é permitido, é usual e é o que se faz em todo o Exército brasileiro para transporte de pessoal.

— Essa viatura tem uma preparação especial na sua carroceria, com três estruturas metálicas, conhecidas como Santo Antônio, interligadas, que foi justamente o que garantiu que nós não tivéssemos maiores problemas. É feita uma segurança na parte de trás da viatura, para evitar que alguém, por algum infortúnio, venha a cair da viatura. E fora isso é o transporte normal do militar com o seu equipamento.

Vítimas

— Em princípio, as três vítimas estavam na carroceria da viatura. Os militares que encontravam-se na boleia estavam com o cinto de segurança na posição e não sofreram grandes escoriações e passam bem. O inquérito vai apontar com mais precisão.

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Prazos

— Existem os prazos regulamentares do inquérito, mas que podem ser avançados de acordo com as necessidades de apuração de mais informações. Às vezes um parecer técnico, uma informação a mais até de um outro órgão.

Dúvidas

A entrevista é um avanço, demonstra o quão produtivo pode ser o contato da instituição com a imprensa. Mas ainda há muitas perguntas no ar. Quem estava dirigindo tinha experiência e habilitação para guiar um veículo com 44 passageiros? A Rua Belmiro Colzani tinha mínimas condições de segurança para a passagem do caminhão de cinco toneladas? O veículo estava com a manutenção em dia? O que o Batalhão pretende fazer para reduzir o risco de novos acidentes na região?

A própria investigação está cercada de lacunas. Se até o delegado regional, Rodrigo Marchetti, tem dúvidas sobre o assunto (ele chegou a dizer que a Polícia Civil investigaria o caso, mas depois admitiu que a jurisdição é da Justiça Militar), imagine os familiares das vítimas.

Quem será ouvido? Para onde foi levado o caminhão acidentado e o que será feito dele? Como funciona um inquérito militar? Quem será o responsável por levantar possíveis responsabilidades? As famílias terão acesso aos autos?

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A escassez de informações até aqui é um ponto fora da curva na história de um batalhão do Exército reconhecido pelo envolvimento comunitário. Essa mesma comunidade e as famílias dos atuais e futuros soldados do 23º Bi precisam saber o que houve.

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