A presença do presidente Jair Bolsonaro em Chapecó nesta quarta-feira (7) prova que “tratamento precoce” contra a Covid-19 funciona. Não contra a doença, mas como narrativa política. Segundo a versão a ser exaltada na companhia do prefeito João Rodrigues (PSD), os chapecoenses superaram o pior com Kit Covid e abertura de novos leitos. Nada disso para em pé diante dos fatos, mas pouco importa a quem procura uma narrativa, e não soluções.
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Chapecó tem uma “determinação” do prefeito para uso do Kit Covid na rede pública desde o início de janeiro, mesma época em que Rodrigues afrouxou regras de isolamento social. Mas não houve ivermectina ou hidroxicloroquina que impedisse a escalada de contágio por coronavírus que transformou o Oeste em uma Manaus catarinense.
Nos quatro meses de governo do prefeito morreram em decorrência da Covid-19 mais de 410 pessoas. É quase a mesma quantidade de óbitos de Blumenau em toda a pandemia. Chapecó foi parar na UTI e precisou de muita ajuda de outras regiões — até de outros estados — para atender à demanda de infectados em quadro grave.
Para livrar a população do inferno, Rodrigues teve de curvar-se à realidade (e à pressão do Ministério Público) e decretar as medidas restritivas de circulação mais rigorosas da temporada em Santa Catarina. À época, Bolsonaro questionou a decisão: “Para que lockdown”? Duas semanas depois, os resultados vieram, mas é preciso contar outra história. A verdadeira não tem lugar na narrativa bolsonarista.
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O presidente da República notabiliza-se como político à procura de saídas fáceis para questões complexas. Se elas não existem, paciência. Importante é ser reconhecido como o líder que sabia como resolver e, se não o fez, é porque alguém (o sistema, o establishment, o STF, o Congresso, as ONGs, os cientistas de esquerda…) tratou de impedi-lo.
Para o câncer, fosfoetanolamina. Para a destruição da Amazônia, menos fiscalização. Para a violência urbana, armas. Para o preço da gasolina, acabar com o ICMS estadual. Para as exportações, nióbio e grafeno… O “tratamento precoce” é mera repetição de uma estratégia, até aqui, bem sucedida.
> Exemplo para Bolsonaro, Chapecó ainda tem UTIs lotadas e letalidade acima da média.
Novo capítulo
Na pandemia, o “exemplo de Chapecó” também representa o novo capítulo de uma série. Antes vieram Porto Feliz (SP), Búzios (RJ), Porto Seguro (BA) e Rancho Queimado (SC). Esses municípios têm em comum políticos que distorceram dados ou mentiram e médicos bolsonaristas que ajudaram a chancelar as lorotas. Sempre que imprensa e especialistas desmentem a prestidigitação, demonstrando com dados e fatos que o tal tratamento não fez diferença alguma, os propagandistas de medicamentos ineficazes mudam de endereço. Será assim também com Chapecó.
Claro, essa espuma em nada beneficiará chapecoenses, catarinenses e brasileiros que seguem padecendo dos efeitos sanitários e econômicos da Covid-19. Afinal, uma narrativa política mentirosa é capaz de resolver os problemas dos políticos. E só deles.
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