Começo este texto sem saber exatamente para onde ele vai. Talvez isso não seja bom para a qualidade final do texto. Mas é uma boa forma de pensar – e é sobre isso que eu gostaria de discorrer um pouquinho. Isso, e mais uma questão relacionada que pode interessar ao leitor.

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É grande a dificuldade de traduzir em palavras o que estamos pensando ou sentido. É quase uma impossibilidade, talvez, ser exato nos termos, já que encaixamos as coisas (ideias, sentimentos, emoções) nos nomes que conhecemos. Tenho a impressão de esse exercício nunca ser preciso, sempre uma aproximação.

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Fiz uma viagem recentemente e ao longo das cidades algo me incomodava – algo que eu não sabia exatamente qual nome dar. E nesse estado de espírito, eu questionava a minha posição de turista. 

Eu já havia pensado nisso antes, mas nunca com tanta intensidade: o quão caricato é circular nos caminhos e atrações preparados especialmente para o turista. A multidão, os horários, os ingressos, as fotos. E a pobreza de espírito que acaba envolvendo o ponto turístico. Sou um intruso por algumas horas para os nativos, ou um cliente para os que vivem desse fenômeno – absurdamente impulsionado pela exposição amplificada nas redes sociais.

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O detalhe: eu acho que só pensei tanto nesses pontos porque eu estava nesse estado de inquietação que não sei explicar muito bem. Se estivesse deslumbrado ou entusiasmado, provavelmente essa visão crítica do turista nem existiria. As emoções são as lentes com as quais vemos o mundo.

Sabendo disso, mudo a emoção durante a viagem. Consigo identificar meu humor e encontrar motivos ou inventar narrativas que troquem a lente com que estou observando as coisas. Ou vou aceitar este estado de espírito e vagar ranzinza por um país estranho?

Entre o estímulo e a reação

E eu também não posso desperdiçar uma viagem distante (e um texto inteiro) criticando o atual modelo de turismo. Essa percepção relativamente comum entre os viajantes despertou algo maior. É sobre isso também que eu queria falar – como eu dizia, escrever para pensar. Escrever para organizar a natureza caótica dos pensamentos ao achar a palavra certa – ou a mais aproximada. Ou a mais bonita.

Cheguei lá: o que eu acho que é uma reflexão maior nisso tudo? Fiquei pensando se o mundo não é grande demais para o indivíduo. Nosso DNA ainda é o da tribo, do bando, da proximidade. O mundo é muita informação. E talvez o papel do turista faceiro e inconsequente seja uma forma de evitar essa percepção.

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Estou tranquilo na fábrica da cerveja Guinness em Dublin – uma das atrações turísticas mais visitadas da Europa. Mas estou incomodado porque não vi uma das raposas que invadem o espaço urbano em busca de comida fácil. 

Penso nisso no terraço do apartamento que aluguei, de onde eu olhava as gaivotas e seus filhotes no telhado dos prédios baixos da cidade. No pôr do sol das 22:30 do verão do hemisfério norte. Dependendo da emoção do momento, o mundo pode ser muita informação para o ser humano. Talvez por isso somos turistas – andamos em bando, mais seguros, numa camada mais superficial em termos de percepção, reflexão e emoções.

O constrangimento construtivo

O leitor percebe que o texto não tem necessariamente uma conclusão, uma lição. O que mais importa, creio, é a organização das ideias que a escrita permite. Recomendo muito o ato de escrever para pensar melhor – é nossa forma de materializar o intangível da mente incontrolável. E como num quebra cabeças virado de 10 mil peças, encaixar algumas palavras no lugar mais apropriado.