O “filme” da reunião ministerial de 22 de abril não traz surpresas em relação a atuação dos “atores principais”, o presidente Jair Bolsonaro e o grupo dos seus fiéis escudeiros, mas deixa transparente aos brasileiros e ao mundo que o país está desgovernado. Exibiu políticos agressivos, individualistas e ‘imortais’, não se importando com a pandemia que está levando milhares de vidas, enquanto outros observavam incrédulos o que acontecia.

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Ficou provado que Bolsonaro leva para o trabalho o linguajar de rua, ao usar palavrões inclusive contra governadores. Entre as afirmações dele está a de que tem poder e vai interferir em todos os ministérios. Mas é preciso deixar claro que tem poder para escolher seus ministros para atender as necessidades do país, não para transformar o governo num grupo de proteção à família frente a ilegalidades cometidas antes ou durante o governo. A lei vale para todos e a reunião deixou clara a intenção de intervir na Polícia Federal.

Uma das falas do ministro da Educação, Abraham Weintraub, que chamam atenção – além dos absurdos que disse contra o Supremo e os brasilienses – foi de que busca liberdade, não quer ser escravo. Mas as pessoas são livres e mais felizes quando têm educação que proporciona uma carreira com oportunidades de renda e, consequentemente, autonomia para decidir sobre suas vidas. Essa liberdade é garantida com educação de qualidade e não é isso que a pasta liderada por Weintraub tem se empenhado em oferecer.

O grau de individualismo com foco na eleição de 2022 fica evidente no discurso político com mensagens invertidas. Além dessa fala de Weintraub, Bolsonaro disse que o povo precisa pegar em armas para não cumprir a quarentena de prevenção ao coronavírus.

Na verdade, quem é realista sobre o risco do vírus está protegendo sua saúde ao máximo, ficando em casa quando possível. E o ministro da Economia, Paulo Guedes, também deu a sua colaboração ao dizer que é preciso fazer, agora, o discurso da desigualdade para reeleger o presidente.

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O zelo com o meio ambiente, gargalo do atual governo, teve mais um abalo na reunião. O ministro da pasta, Ricardo Salles, mostrou que não aprendeu nada com o estrago de imagem que o país teve no último ano devido a problemas ambientais. Disse que esse período em que a imprensa só fala em coronavírus é uma oportunidade para mudar regras ao setor que não precisam passar pelo Congresso. Recomendou a outras pastas do governo fazerem o mesmo nas suas respectivas áreas de atuação.

Essa declaração sobre a legislação ambiental prejudica ainda mais a imagem do país lá fora enquanto o Brasil precisa exportar mais e os planos do governo para atrair investimentos externos continuam.

Mas não foi só isso. Depois de Guedes dizer que o país precisa investir em infraestrutura e saneamento cerca de R$ 500 bilhões e que não tem dinheiro, sinalizando que esses recursos devem vir de investidores estrangeiros, o presidente Jair Bolsonaro descarregou um discurso contra a China, maior parceiro comercial do Brasil e um dos maiores investidores no país.

Contudo, o mais grave da reunião foi não tratar de medidas imediatas para enfrentar a pandemia que está levando milhares de vidas no país, enquanto Estados e municípios não têm recursos suficientes para atender todas as demandas.

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Aliás, o presidente Jair Bolsonaro, desde o início da pandemia, tem negado reconhecer a mesma e se comportado como um imortal, parece ter certeza de que não vai pegar Covid-19 e, se pegar, terá um hospital de qualidade para salvar sua vida. Alguns ministros que o seguem têm comportamento parecido. Mas se a doença tem tirado a vida inclusive de jovens sem comorbidades, como o presidente tem tanta certeza de que sua vida não corre risco? Será que tem reserva de uma dose de um anticorpo da empresa Sorrento, dos EUA, que disse eliminar totalmente o vírus de doentes?

A reunião, que teve como objetivo elaborar um plano de retomada econômica, vai entrar para a história. Além de permitir que instituições avaliem se há provas de crimes ou não, o vídeo escancara as falhas do sistema democrático brasileiro. O parlamentarismo não seria melhor?