Notícia relevante na América Latina nas últimas semanas foi de que o Grupo FG, em parceria com o Grupo Havan e a Família Senna, vai construir o residencial mais alto do mundo, o Senna Tower, com mais de 500 metros de altura, na orla de Balneário Camboriú.
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Quem projetou esse empreendimento foi a engenheira catarinense responsável por projetos da FG, a diretora executiva da FG Talls, Stephane Domenighini, 36 anos, que conquistou reconhecimento internacional como uma as profissionais que mais entendem de obras de arranha-céus, os também chamados “Supertalls”.
Pouco antes de embarcar para Londres e Paris onde participou na última semana – de 23 a 27 de setembro – do congresso do Council on Tall Building and Urban Habitat (CTBUH) 2024, ela falou com a coluna sobre a carreira, características e cuidados construtivos de arranha-céus que os tornam edifícios seguros, e sobre consultoria aberta pelo grupo para ensinar outras empresas a fazer “supertalls”. Segundo ela, o fundador do grupo, Francisco Graciola, e o presidente Jean Graciola, preferem a verticalização para o moderno urbanismo.
Estudiosa, conectada e nota 10 em matemática, Stephane Domeneghini fez graduação em engenharia civil pela Universidade do Vale do Itajaí (Univali) e conquistou espaço como gestora da FG pelo talento. Será diretora da nova empresa de consultoria do grupo para ensinar engenheiros interessados em construir arranha-céus.
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Casada, mãe de uma menina de quatro anos, ela reside em Balneário Camboriú. Dedica atenção especial aos projetos dos “Supertalls”. Revela que discute detalhes técnicos com a equipe da empresa e, também, com profissionais de outros países, em especial dos Estados Unidos. Saiba mais sobre a trajetória e trabalho de Stephane Domeneghini na entrevista a seguir:
Construir arranha-céus é uma das atividades mais complexas da engenharia civil. A senhora se considera uma das engenheiras mais corajosas do Brasil ?
– Não sei. Não consigo me classificar dessa maneira. O que eu sei é que eu sou uma das engenheiras mais preocupadas do Brasil.
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Para fazer engenharia é preciso saber matemática. Essa era uma das suas disciplinas preferidas?
– Eu sempre adorei matemática e história. Mas tem um fato envolvendo matemática que marcou a minha vida. Quando eu estava na quinta série fiquei doente. Quando retornei para as aulas, tive uma prova de matemática e não tirei nota alta. O máximo era 10 e eu tirei 5,4.
Minha mãe era muito exigente, muito exigente! Se eu não tirasse a nota mais alta da sala ela me chamava a atenção. Aí ela cobrou muito por eu ter tirado 5,4. Então, coloquei como desafio tirar sempre 10 em matemática até o final do ensino médio. Consegui. Sempre tive resiliência e determinação.
Sua família era do setor de construção ou engenharia?
– Não! Meu pai é comerciante de autopeças e cursou Direito quando eu fazia engenharia. Era o sonho dele cursar Direito e conseguiu. Minha mãe fez o ensino médio. Venho de uma família humilde. Sou muito estudiosa e sempre gostei de matemática.
Qual foi a sua primeira função na FG Empreendimentos e como atua, hoje, na liderança de projetos?
– Há 10 anos eu me interessei pela área de projetos. Comecei na FG como gestora de projetos, função que consiste em analisar e compatibilizar projetos. Eu já fiz projetos executivos, desenhei obras e fiz detalhes adicionais. Teve uma fase que eu fiz projetos arquitetônicos.
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O Edifício Boreal Tower (prédio luxuoso de 240 metros de altura e 60 andares, que ficará pronto em 2025) é um projeto de minha autoria. O Senna Tower, prédio residencial com mais de 500 metros de altura é um projeto da minha autoria. Eu o desenhei. Então, além de fazer a liderança técnica, de solução técnica, também faço projetos.
Nos últimos quatro a cinco anos, eu fiquei muito focada numa liderança de soluções técnicas, de abordagens técnicas. Eu estou à frente de todos os projetos da área de engenharia. Isso inclui projetos de estrutura, fundação, contenção e sistemas.
Eu discuto com os projetistas todas as soluções que vão para o canteiro de obras. Isso inclui discussões se está atendendo a critérios de segurança, se está dentro do custo e dentro do valor que a empresa espera de cada projeto.
Então, minha liderança hoje é muito técnica, de projeto, mas é uma liderança mais proativa. Diferente do mercado tradicional, que normalmente tem à frente líderes de projetos que são arquitetos ou mesmo engenheiros, mas que recebem mais o projeto, compatibilizam e mandam para a obra, eu sou mais uma provocadora de soluções.
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Sou eu que discuto com o calculista sobre a fundação. Muitas vezes eu trago as soluções para que sejam incorporadas em projetos, principalmente desses prédios que nós construímos porque a engenharia do Brasil não está acostumada a construir prédios super altos.
Em função disso, eu acabo estudando, estudando, estudando, vendo fora do Brasil, discutindo com engenheiros de fora do Brasil. Aí, trago a discussão para os meus projetistas, os meus engenheiros. Provoco isso e a gente chega a soluções em conjunto.
Como é essa troca de ideias com profissionais do exterior? Com que cidade conversa mais?
– A cidade que mais visitei para tratar desses projetos é Nova York, nos Estados Unidos. Isso porque é a cidade que tem mais prédios residenciais muito altos e esbeltos, o tipo que fazemos aqui em Balneário Camboriú. Edifícios comerciais exigem abordagem diferente dos residenciais. Então, hoje, a cidade no mundo que mais se aproxima da nossa tipologia de construção é Nova York.
Eu já fui para Singapura, para a Malásia e para vários países da Europa para ver edifícios altos. Concluí que nossa semelhança maior é com Nova York. Por isso, trocamos mais conhecimentos e boa parte das discussões que fazemos trazemos de lá, principalmente as normas americanas.
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A senhora acaba de participar do CTBUH, o maior congresso do mundo sobre prédios altos. O que vocês discutem nesse evento?
– O CTBUH é um grande congresso voltado para edifícios altos. É a única entidade no mundo que trata de edifícios altos, da parte técnica de edifícios altos, da área técnica de arquitetura, design e impactos urbanos em edifícios altos.
Este ano, o evento foi em Londres e Paris. Além da FG, engenheiros de Porto Alegre também participaram. Estamos querendo levar para fora, mostrar para o mundo que nós temos engenharia de ponta também no Brasil.
Temos profissionais de ponta e queremos evoluir, estar entre as referências mundiais da boa engenharia.Temos tudo para mostrar isso. Temos prédios construídos e em operação, que mostram que temos boa engenharia.
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Há quanto tempo a FG foca na construção de prédios mais altos?
– Há mais de 20 anos a FG vem fazendo prédios mais altos. Isso está no DNA do seu Francisco Graciola, fundador da empresa, e do CEO da empresa, o filho dele, Jean Graciola. Eles sempre tiveram essa visão de verticalização. Para eles, a verticalização é uma forma de valorizar os imóveis e oferecer melhor qualidade de vida para as pessoas porque é possível oferecer mais infraestrutura.
O Grupo FG acaba de lançar uma empresa, a FG Talls para consultoria no segmento de arranha-céus, da qual a senhora é a diretora. Que serviços serão oferecidos?
– Essa nova empresa começa a ser divulgada agora. Vamos prestar consultoria no Brasil e na América Latina, para quem desejar saber como construir um arranha-céu. Eu acho que está na hora de a gente encarar a verticalidade como uma vertente que nasceu para ficar. É um movimento do mundo.
As construções estagnaram no passado em função de não ter tecnologia que suportasse uma verticalização, então não tinha elevadores, era restrito à escada, e isso impedia uma crescente de verticalidade.
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Pensando em modelo de cidade, um assunto que gosto muito, apesar de ser engenheira, é a qualidade das cidades. Observo muito isso na cidade onde vivo, Balneário Camboriú. Acredito numa cidade sustentável e a verticalização permite isso.
Quando as pessoas observam uma série de arranha-céus em Balneário Camboriú, a maioria pensa em como seria morar num prédio assim alto e como é a segurança deles. O que pode informar sobre segurança?
– Eu acredito até que prédios altos e edifícios complexos têm um nível de segurança maior até do que uma casa, do que um prédio pequeno. Por quê? Primeiro porque se você vai construir um edifício desse tamanho, você não vai fazer de qualquer jeito.
Para fazer um prédio desse tamanho, você não tem espaço para negligência. Isso porque qualquer erro ou defeito que aconteça, às vezes se torna insuperável.
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Por exemplo: se houver erro na fundação de um prédio desses e ele começar a recalcar, ou seja, ele começar a afundar, a situação é tão grave que pode não ser possível recuperar.
Temos casos em Santos, em São Paulo, onde prédios ficaram tortos. Foi possível estabilizar porque não são tão altos. Mas se acontece isso num edifício de 60 ou 70 andares, isso não se estabiliza tão fácil e, às vezes você gasta muito mais do que investiu para construir o prédio inteiro.
Vemos o caso de um edifício em San Francisco (na Califórnia), EUA. Um prédio alto teve problema de estrutura e foi gasto praticamente o valor do investimento na construção.
Então, a construção de um edifício alto requer muito mais planejamento e atenção do que fazer um de 20 andares.
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Que medidas de segurança são adotadas para proteger as pessoas que residem num arranha-céu no caso de um incêndio?
– A projeção para caso de incêndio é feita para a pessoa se salvar sozinha. Isso porque ela não poderá esperar os bombeiros subirem 70 lances de escadas. Então, quem projeta o edifício precisa criar uma série de elementos sistêmicos que transformem a realidade das coisas para que as pessoas se salvem sozinhas, mesmo se ela morar no 70º andar.
Para prédios desse tamanho, há uma gama de profissionais analisando todos esses aspectos de segurança estrutural, prevenção de incêndios, segurança de abastecimento de gás (natural), energia, sistema hidráulico e sistema de esgoto.
Os engenheiros precisam avaliar isso de uma maneira muito mais minuciosa do que fariam se fosse um prédio convencional. Até porque, sem detalhamento, nem se consegue fazer um prédio desses. Precisa, obrigatoriamente passar por uma fase de projeto, de análise e daí ir para a obra.
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Como são as avaliações considerando os ventos?
– É por causa dessa cadeia de análises tão grande e profunda que existem prédios altos. A estrutura é avaliada principalmente em condições de vento. Então, um prédio como os nossos tem dimensionamento estrutural pensado para uma situação de um vento que ocorra a cada 800 anos. Estamos falando de um vento sem registro histórico, talvez um furacão nunca imaginado. A estrutura vai resistir a essa situação, que é o limite do limite, estado último que nós, seres humanos, conseguimos projetar.
A gente extrapola muitos fatores de segurança em prédios altos porque nós entendemos as peculiaridades deles. A pessoa pode estar lá, no topo, e terá que enfrentar uma situação como um extremo furacão, um evento sinistro, um prédio pegando fogo. Ela vai ter um tempo para se locomover e poder sair daquilo.
Então, tudo é muito superdimensionado nesse sentido, para aguentar esse tempo de a pessoa poder se salvar, sair de uma situação de desastre, que seria um desastre completo geral, generalizado, sabe? Então, são prédios muito, muito mais seguros do que prédios de 20, 30 andares ou de casas, na minha opinião.
Um insumo importante para um edifício é o gás natural. Como é o sistema que leva o gás ao topo de um arranha-céu de forma segura?
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– Existem diversos tipos de tubulações para conduzir o gás natural, que é um insumo muito mais eficiente que o antigo GLP. Nós trabalhávamos com o GLP, que é o gás de cozinha. Mas, agora, existe a opção do gás natural.
Eu acredito que não exista técnico ou engenheiro que queira utilizar outra modalidade de gás, porque o gás natural é extremamente superior em todos os aspectos, tanto de eficiência, de queima, quanto ecológico.
Além disso, ele elimina aqueles espaços necessários para armazenar o GLP nos prédios. Em Balneário Camboriú, com a limitação de terrenos, qualquer metro quadrado vale muito. Por ser um gás canalizado, o abastecimento é constante e mais fácil, sem causar transtornos no trânsito.
Nas prumadas, onde são instalados os sistemas de abastecimento de energia elétrica e água, também é instalado o gás natural, que necessita de requisitos normativos para a distribuição e, também, de ventilação, que precisa ser constante. Nossos prédios têm sensores para detectar fumaça e vazamento de gás.
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O abastecimento de gás natural é feito para cada apartamento, que atende as necessidades de consumo (para preparar alimentos) e, também, de aquecimento de água. No Brasil, essa é a solução mais amplamente utilizada, que é o aquecimento individualizado, principalmente na nossa região onde há uma ocupação sazonal de imóveis.
Aqui não vemos muita viabilidade de centrais de prédios, como a gente vê fora do Brasil, principalmente Nova York e Europa. Países frios instalam em seus prédios altos centrais em um andar, onde centralizam água quente, gás e sistemas elétricos. Como eles enfrentam temperaturas mais baixas, eles necessitam de mais água aquecida.
Aqui não temos baixas temperaturas e, também, temos uma ocupação sazonal de boa parte dos imóveis, que são de veraneio, por isso o consumo individualizado é melhor. Cada apartamento tem a sua conexão de gás e aberturas para ventilação, que precisam ser respeitadas pelos moradores (mantidas abertas).
Como é a segurança das escadas?
– Os prédios têm as chamadas escadas pressurizadas. Esse é o sistema que nós utilizamos e que também é usado mundialmente em arranha-céus. Como elas funcionam: você tem um bloco de escadas num prédio e acontece um incêndio. O detector de fumaça é acionado dentro do apartamento.
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O calor demora um tempo para chegar até os cômodos ao lado. Outros sensores de fumaça vão acionar alarmes. A guarita vai ficar com esses alertas e vai investigar no apartamento. Outros detectores próximos vão ligar, entendendo que existe um incêndio no apartamento e o prédio está em situação de risco.
Aí todo o sistema do prédio passará a funcionar automaticamente para colocar ar na escada pressurizada. São poucas centrais no mundo que têm condições de fazer essa lógica toda funcionar. As portas têm um eletroímã para ficarem abertas. A energia do imã é cortada e as portas se fecham automaticamente.
Aí o sistema coloca os ventiladores para funcionar. Então, tem enormes ventiladores lá na base do prédio que vão começar a puxar ar limpo da rua para a escada. Por isso que é uma escada pressurizada: tem pressão positiva de ar sendo jogada de baixo até em cima.
Para essa estrutura, portas e paredes têm resistência a fogo. Todos os materiais são pensados para resistir a muitas horas de fogo incessante.
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Quando as pessoas adquirem um apartamento de arranha-céu, elas perguntam o manual do proprietário?
– Quando uma pessoa compra um apartamento, uma casa, um imóvel, ela pressupõe que tudo esteja resolvido, que você já resolveu todos os conflitos, todos os problemas, todas as situações. Ela também pressupõe que qualquer situação errada ou situação de dificuldade, você já pensou e ela vai ter suporte, ela vai estar tranquila nessa situação.
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