Com o argumento de buscar déficit zero em 2024, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou nesta quinta-feira um pacote com três medidas que surpreenderam e desagradaram o setor produtivo e o Congresso Nacional. As medidas consistem na reoneração parcial da folha de 17 setores econômicos, limite em benefício para eventos e limite de compensações tributárias de empresas.

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A apreensão foi grande na quinta porque a expectativa era de que as medidas entrariam em vigor já dia primeiro de janeiro, mas a divulgação da MP Nº 1.202 nesta sexta-feira ameniza um pouco os ânimos porque a reoneração e corte ao incentivo de eventos, ambos gradativos, estão previstos somente para abril de 2024. A MP é assinada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e pelo ministro Fernando Haddad.

As três medidas do pacote econômico são:

– Desoneração parcial da folha salarial, somente para o primeiro salário mínimo da remuneração do trabalhador, mesmo que o vencimento seja maior. Ela contraria a prorrogação do Congresso Nacional de benefício que vem desde 2011, com o pagamento de 1% a 4,5% do faturamento para 17 setores empregadores.

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– Limitação das compensações tributárias conquistadas por empresas na Justiça. Será uma limitação mensal, a ser definida em medida complementar.

– Mudança no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), que foi prorrogado pelo Congresso até 2026. O objetivo é reduzir gradualmente os descontos desse benefício, até encerrar totalmente em 2025.

Na entrevista de quinta, o ministro destacou que as medidas não geram receita adicional para o governo.  Elas reforçam o viés de combate ao gasto tributário, que consiste em despesas indiretas (incentivos fiscais) do governo. Nesses casos, não há novo gasto, mas o governo deixa de arrecadar para atender os segmentos que atende, argumentou ele.  

Mas a decisão, principalmente de reonerar a folha, gerou descontentamento junto ao setor produtivo e o Congresso Nacional. Como havia a expectativa de que essa medida entraria em vigor já na virada do ano, ficou a dúvida se as empresas seguiriam a desoneração promulgada quarta-feira (27) ou a MP.  

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Setor empresarial critica

O Movimento Desonera Brasil, que representa esses 17 setores produtivos, divulgou nota conjunta assinada pelas entidades setoriais criticando a MP de Haddad. (Leia a íntegra da nota no fim desta matéria).

Um dos principais argumentos destacados pelas entidades foi a informação de que de janeiro de 2019 a agosto de 2023, os 17 setores beneficiados aumentaram em 18,9% seus empregos formais enquanto a média dos demais setores econômicos teve acréscimo de 13%, uma diferença de quase seis pontos percentuais. Esse período inclui antes, durante e depois da pandemia, destacaram na nota.

– Essa política (de desoneração) gera mais arrecadação para a Previdência Social, mais Imposto de Renda, mais recolhimento para o FGTS e menos custos sociais como auxílio-desemprego, por exemplo. Em 2022, estima-se que a arrecadação adicional gerada por essa política foi da ordem de R$22 bilhões, incluindo R$2,4 bilhões de arrecadação adicional de COFINS-Importação por uma alíquota adicional de 1% estipulada pela própria lei da desoneração – escreveram as entidades na nota.

Esses 17 setores são fortes na economia catarinense e altamente empregadores no Estado. Um dos setores que mais lutam por essa desoneração é o de tecnologia porque, em muitos casos, a folha salarial representa cerca de 70% dos custos das empresas, informou a Associação Catarinense de Tecnologia (Acate).

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Parlamentares que participaram ativamente das articulações para prorrogação da desoneração da folha até 2027 também criticaram a decisão do governo de mudar o benefício. Lideranças de sindicatos de trabalhadores fizeram o mesmo.

Pela nova regra prevista na MP, empresas de 25 Classificações Nacionais de Atividades Econômicas (CNAEs) terão direito a compensar 15% do INSS devido até um salário mínimo em 2024. Acima disso, pagarão alíquota de 20%. Empresas de 17 CNAEs poderão compensar 10% da contribuição devida. Esse escalonamento será gradativo até 2028 ser extinto, propõe o governo na MP.

O corte no Perse, para o setor de eventos, também visa elevar a arrecadação. Segundo Haddad, estava prevista uma renúncia fiscal de R$ 4 bilhões para esse benefício, mas deverá chegar a R$ 16 bilhões em 2023. Segundo ele, a fase difícil, da pandemia, para a qual foi instituído, já passou.

Entre as medidas previstas, a maior polêmica envolve a da folha salarial. Lideranças do Congresso Nacional que atuaram na derrubada do veto de Lula para essa prorrogação não gostaram nada da MP. O ministro também informou que deixará para avaliar depois a desoneração do INSS das prefeituras de municípios com até pouco mais de 142 mil habitantes.

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No caso da reoneração de empresas, é uma medida que vai gerar, novamente, muitos debates e pressões no Congresso Nacional no inicio do próxim ano, em especial quando serão retomados os trabalhos. Se o parlamento não aprovar a MP, ela perde validade em seis meses.

É claro que o governo federal precisa buscar o déficit zero para um melhor equilíbrio da economia. Para isso precisa recursos e a fonte disso são os impostos e contribuições. O que gera questionamento é cortar de um setor muito sensível no país que é sobre o custo do trabalho formal, num país onde a informalidde é uma das maiores do mundo.

Além disso, falta, por parte do governo federal e de outros órgãos públicos, um esforço para a limitação de despesas, em especial com pessoal. Enquanto a massa de brasileiros é contratada, em média, por um salário mínimo e meio, pouco mais de R$ 2 mil, os salários do setor público são muito maiores e alguns vencimentos parecem que são infinitos. Nada semelhantes aos de países desenvolvidos.

Leia a íntegra da nota do Movimento Desonera Brasil:

– Diante do anúncio, feito hoje pelo Ministro da Fazenda, de que o governo encaminhará, ainda neste ano, uma Medida Provisória (MP) com propostas de alteração da atual política de desoneração da folha de pagamento, os 17 setores econômicos atualmente incluídos nessa política vêm a público trazer seu posicionamento e contribuição para um diálogo que busque, de forma ampla e inclusiva, a melhor proposta para o Brasil em termos de geração de empregos formais, competitividade da economia e arrecadação pública.

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Inicialmente, é importante ressaltar que a chamada “desoneração” é, na verdade, uma troca de base de incidência tributária. Essa política tem se mostrado, desde seu início em 2011, extremamente benéfica para o Brasil. A título de exemplo, os dados do CAGED mostram que, no período de janeiro de 2019 a agosto de 2023 (portanto, antes, durante e depois da pandemia), os 17 setores incluídos na política aumentaram em 18,9% seus empregos formais, enquanto todos os demais setores aumentaram em apenas 13%, uma diferença de quase 6 pontos percentuais.

Esses 17 setores empregam hoje, com carteira assinada, mais de 9 milhões de trabalhadores, tendo gerado mais de 300 mil postos de trabalho apenas em 2023 (até agosto). São setores altamente intensivos em mão-de-obra, cujas folhas de pagamento têm um alto peso em sua composição de custos. A política de desoneração da folha diminui esse custo, sendo indubitavelmente um mecanismo para esses setores empregarem mais e, ponto importante, de maneira formal.

Por consequência, essa política gera mais arrecadação para a Previdência Social, mais Imposto de Renda, mais recolhimento para o FGTS e menos custos sociais como auxílio-desemprego, por exemplo. Em 2022, estima-se que a arrecadação adicional gerada por essa política foi da ordem de R$22 bilhões, incluindo R$2,4 bilhões de arrecadação adicional de COFINS-Importação por uma alíquota adicional de 1% estipulada pela própria lei da desoneração.

Em resumo, a desoneração da folha promove um círculo virtuoso: mais empregos formais, maior competitividade das empresas, maior arrecadação total, maior dinamismo da economia, mais rendimentos formais para os trabalhadores, maior inclusão social.

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A Lei nº 14784/23, que prorroga a desoneração da folha de pagamento por 4 anos, foi publicada hoje no Diário Oficial da União (DOU), tendo sido aprovada com expressiva maioria no Congresso Nacional. Não é, em absoluto, razoável que ela seja imediatamente alterada ou revogada por meio de uma MP, contrariando uma decisão soberana do Congresso Nacional, ratificada pelas duas Casas na derrubada ao veto presidencial. Além disso, a MP traz insegurança jurídica para as empresas e para os trabalhadores já no primeiro dia do ano de 2024.

Ademais, as propostas mencionadas na entrevista coletiva hoje pelo Ministro da Fazenda não estão claras e sinalizam alterações importantes que não foram discutidas com o Congresso, com o setor empresarial e tampouco com os representantes dos trabalhadores. São propostas que não devem ser impostas à sociedade sem discussão prévia ampla e abrangente, por meio de uma Medida Provisória.

Por essas razões enfatizamos, de maneira veemente, que a posição dos 17 setores é a de que eventuais propostas alternativas sobre a tributação da folha de pagamento sejam encaminhadas por meio de um Projeto de Lei ou discutidas, como está previsto, na próxima etapa da reforma tributária (tributação sobre renda e emprego) que deve ser encaminhada pelo governo ao Congresso em até 90 dias após a promulgação da primeira etapa (tributação do consumo). Isso, sim, permitirá um debate produtivo sobre as diversas alternativas e o alcance da melhor solução para o Brasil a longo prazo.

Os 17 setores incluídos na política de desoneração da folha ratificam o compromisso de continuar totalmente disponíveis, como sempre estiveram, para dialogar com o Ministério da Fazenda, com o Congresso e com os representantes dos trabalhadores, debatendo opções, números e dados que ajudem na busca das melhores soluções para o Brasil. Acreditamos que o Brasil precisa, sim, buscar soluções amplas que reduzam o custo sobre a folha de pagamento, que é altíssimo no Brasil. Esse alto custo desincentiva a criação de empregos formais e diminui a competitividade do País na economia mundial.

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Mas é imperativo que isso seja feito via uma discussão profunda com a sociedade e com respeito a uma decisão firme do Congresso.

Entidades que assinaram a nota:

Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão)

Abes (Associação Brasileira das Empresas de Software)

Abicalçados (Associação Brasileira das Indústrias de Calçados)

Abimaq (Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos)

Abit (Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção)

Abratel (Associação Brasileira de Rádio e Televisão)

ABT (Associação Brasileira de Telesserviços)

ANJ (Associação Nacional de Jornais)

Assespro (Federação das Associações das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação)

Brasscom (Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) e de Tecnologias Digitais)

CICB (Centro das Indústrias de Curtumes do Brasil)

FABUS (Associação Nacional dos Fabricantes de Ônibus)

Fenainfo (Federação Nacional das Empresas de Informática)

Feninfra (Federação Nacional de Instalação e Manutenção de Infraestrutura de Redes de Telecomunicações e de Informática)

IGEOC (Instituto Gestão de Excelência Operacional em Cobrança)

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