O empresário Vicente Donini realiza novas obras na Vinícola Vivalti, em São Joaquim. Concluiu espaço de mil metros quadrados que vai abrigar provisoriamente a elaboração dos vinhos da La Casa Vivalti, como denomina seu mais novo e sonhado projeto. Neste mês de setembro será concluída a construção do receptivo e enoteca e, em outubro, serão finalizadas as instalações para abrir ao público em novembro. Em função da Covid-19, não há programação de abertura ainda. A ênfase na qualidade desde o início resultou em vinhos e espumantes que estrearam no mercado ano passado com vendas aceleradas. Atualmente, são sete rótulos, mais dois serão lançados este ano e dois no ano que vem.
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Vicente Donini é um dos empresários catarinenses que decidiram investir na vitivinicultura em função do terroir e da beleza da Serra catarinense, em São Joaquim, que fica a 1.360 metros de altitude e tem incidência de neve. Adquiriu vinícola em implantação há cinco anos e planejou investir R$ 10 milhões em todo o projeto.
Após atuar como executivo da WEG, onde chegou a superintendente da unidade de motores elétricos, ele assumiu a empresa de moda infantil Marisol, que depois adquiriu 100% das ações. Hoje, é presidente do conselho da Marisol e da Santinvest, membro do conselho da Vicunha e de mais duas empresas nas quais tem participação. Como pretende seguir trabalhando bastante, decidiu investir na vitivinicultura, na qual é acompanhado pelos filhos Giorgio e Giuliano. Nesta entrevista, ele fala sobre a vinícola, defende redução da carga tributária ao setor visando competitividade e comenta sobre a importância do vinho para aproximar pessoas.
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Como estão os projetos da vinícola Vivalti?
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– A primeira preocupação da gente foi reconstituir uma fazenda que precisava de uma recondução porque estava semiabandonada. Esse trabalho nós vencemos e também ampliamos os vinhedos. Hoje, temos 11,3 hectares plantados de um projeto de 16 hectares. O grande esforço foi exatamente fazer com que os vinhedos tivessem uma boa recuperação e que os novos fossem plantados dentro de técnicas modernas para que se alcance frutas de excelente qualidade.Isso porque para fazer um bom vinho, 80% depende da fruta e 20% da alquimia. As competências para a vinificação são relevantes, mas se não tiver uma boa fruta é muito difícil alcançar um padrão de qualidade como nós desejamos. Então essa etapa nós vencemos e eu estou satisfeito com o resultado.
De quanto será o investimento total na vinícola?
– Já investimos mais de R$ 6 milhões e até a conclusão de obra, que inclui a futura vinícola, deveremos chegar a R$ 10 milhões. Com isso, teremos condições de caminhar bem no mundo dos vinhos. Construímos este ano um espaço metálico, com fechamento e cobertura com placas térmicas, com área de mil metros quadrados para acomodar, provisoriamente, as instalações da vinícola, pois planejamos vinificar internamente já a partir da próxima safra, em março e abril de 2021. Parte dos equipamentos já foram comprados e os demais, necessários a essa primeira fase, também o serão em tempo hábil. Depois, com o tempo, construiremos a vinícola definitiva, haja vista que a prioridade é implantar e consolidar os 16 hectares de vinhedos, que estimamos concluir até o final de 2022.
Neste mês de setembro concluiremos a construção do receptivo e enoteca e, em outubro, esperamos finalizar as instalações para abrir ao público a partir de novembro próximo. Por conta da Covid-19, ainda não programamos nada. No futuro, ainda não definido, vinícola, enoteca e receptivo estarão acomodados num novo espaço, cujos projetos arquitetônico, estrutural e complementares já estão prontos.
Quando vocês iniciaram as vendas de vinhos?
– Começamos a comercializar em março do ano passado. Tínhamos apenas nove mil garrafas prontas e conseguimos vender 7.000. Para mim foi uma surpresa muito agradável a receptividade aos nossos vinhos. É um estímulo, um reconhecimento à qualidade. Agora, a gente está numa segunda fase. Este ano tivemos condições climáticas extremamente favoráveis para vinhedos na Serra Catarinense. A produtividade melhorou bastante e a qualidade muito mais. Isso é um prenúncio de que nós teremos vinhos ainda melhores. Para vender, preciamos da receptividade do mercado. Com a comercialização, podemos ter receita e reinvestir. Eu tenho uma clareza muito grande de que essa é uma atividade de muito longo prazo. Não dá pra esperar retorno do investimento, mas o que a gente quer é que a massa de receita seja suficiente para pagar as despesas correntes. Então, se a gente conseguir um equilíbrio econômico/operacional sem olhar para o retorno do investimento, para mim já terá sido um bom feito.
Em quais mercados a Vivalti está comercializando os vinhos?
– Atualmente, além da base de São Joaquim, mantemos filiais com depósitos em São José, Jaraguá do Sul e uma estrutura de distribuição nacional em São Paulo, os quais vêm correspondendo bem nesta fase inicial de distribuição dos produtos Vivalti, em âmbito nacional. E o que é mais importante, as manifestações expontâneas de aprovação dos produtos são uma constante. Quando iniciamos as vendas, ano passado, um dos nichos em que atuamos foi o de eventos. Fornecemos para alguns eventos relevantes. Um deles foi a Expogestão, em Joinville. Nossos vinhos foram selecionados pelo cheff Claude Troigros, que fez o jantar de gala do evento. Os vinhos foram enviados para o Rio de Janeiro para ele fazer a harmonização com o jantar porque a ideia era que todos ingredientes fossem de Santa Catarina.
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A carga tributária segue alta para vinhos. Como isso afeta o setor?
– No Brasil, temos um grande drama, que o vinho é tido como uma bebida alcoólica, portanto é tributado como se assim fosse. A massa de tributos que incide sobre os vinhos é de 54% no preço de venda. Ainda existe uma figura que é uma verdadeira afronta, que é a substituição tributária. Ela nos obriga a pagar o ICMS até a conta final, que é o consumidor. Os tributaristas imaginam por qual preço o produto vai ser vendido lá na ponta e sobre aquele valor a gente tem que antecipar os impostos.Isso é um absurdo.
Em SC, a substituição tributária foi suspensa para o setor. Outros estados seguem cobrando?
– Em Santa Catarina sim, foi suspensa, mas em muitos estados ainda prevalece. Então, se a gente quiser vender para aqueles estados, tem que se sujeitar às normas. Essa é uma dificuldade adicional. Na Europa, o vinho é tido como alimento. Como tal, a tributação é muito baixa. Então, estamos antevendo e torcendo para que esse reconhecimento também ocorra no Brasil. Para competir, eu sou pela abertura de mercado, porque o grande beneficiado tem que ser o consumidor, que tem que ter acesso ao produto de boa qualidade e pelo preço justo. Se for aprovado o acordo entre União Europeia e Mercosul nós esperamos, no mínimo, que haja igualdade de tratamento. Se houver igualdade de tratamento e nós não tivermos condições de competir com os europeus, é por incompetência nossa. Agora, é impossível manter a competição se nós somos tratados tributariamente da forma como estamos sendo tratados. Eu não tenho medo da competição. O que eu não posso imaginar é que sejamos bem sucedidos com tratamentos tão díspares como esses que estão acontecendo.
Existem conversas com a ministra da Agricultura, Teresa Cristina, para que seja aprovado o reconhecimento do vinho como alimento. Isso pode avançar, na sua opinião?
– Eu acredito que sim porque a ministra da Agricultura tem uma clareza muito grande do tratamento que se dá mundo afora ao agronegócio. E o vinho está nesse contexto do agronegócio. Ele não pode ser classificado com uma bebida alcoólica, ele não é um destilado, é um produto fermentado como se fermenta qualquer outro alimento. Então, não faz sentido esse tipo de tratamento. É difícil, vai demorar por causa da incompreensão dos nossos legisladores, mas se nós fizermos o acordo de livre mercado com os europeus, não tem outra forma. Se sair o acordo, o país terá que mudar a tribuição. Se os parlamentares tiverem essa compreensão de reduzir a carga tributária, estará reservado para o Brasil um bom lugar no pódium dos produtores de vinho mundial.
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Quando o senhor fala em pódio do Brasil está se referindo todas as regiões produtoras do país?
– Sim! Além de Santa Catarina, temos os produtores gaúchos que têm uma larga experiência. A gente vê a produção de bons vinhos, agora, também em São Paulo, e o Nordeste do país já produz. Então, eu penso assim: nós, brasileiros, temos que nos abraçar porque o vinho é um ambiente colaborativo. Nós temos que nos ajudar mutuamente para que todos sejamos bons no que estamos fazendo porque eu não acredito no sucesso de um em detrimento de outro. O sucesso se dá pelo esforço conjunto. E temos bons produtores em todos os lugares.
Em Santa Catarina, somos abençoados pelas condições naturais que nos favorecem muito.Nós temos na Serra Catarinense um clima extremamente favorável. É um clima mais seco que em algumas regiões do Brasil e, para a uva vinífera, esse clima mais seco é fundamental. Nós temos uma amplitude térmica muito muito grande. E a uva precisa dessa variação térmica para produzir os açucares, para se ter uma boa volatilização. Por isso as condições naturais daqui são melhores do que em alguns estados brasileiros. E aí vai depender de aproveitarmos essas condições naturais e fazer aqui os melhores vinhos do Brasil.
Seus dois filhos estão à frente de outros negócios. Qual deles acompanha mais o senhor na vitivinicultura?
– Quem mais acompanha é o Giuliano, mas os dois têm paixão por vinhos. Isso é ótimo porque essa é uma atividade de muito longo prazo. E eu tenho clareza do meu tempo. Eu não iniciaria essa atividade se eles não tivessem me dito que efetivamente iriam dar continuidade.
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O que a vitivinicultura representa para o senhor?
– Eu sempre gostei de vinho e visitei muitas vinícolas nos Estados Unidos, na Europa e no Hemisfério Sul. Aqui na América do Sul visitei vinícolas do Brasil, Argentina, Uruguai e Chile. Sempre fui apreciador de vinho e curioso com relação a vinícolas. E como eu quero continuar trabalhando até o ultimo dia da minha vida, eu tinha que fazer uma escolha. Eu tenho medo do ócio, não do trabalho. Uma cabeça desocupada é o caldeirão do diabo. Então eu quero me manter ocupado, e eu só faço o que eu gosto e gosto de tudo que eu faço. Por isso, para mim não é sacrifício, é prazeroso e tal, e eu quero deixar, assim, um bom legado. Legado não é posse, legado é uma realização.
A minha mulher, Florilda, às vezes me diz: “mas Vicente, por que mais isso? Você não vai levar nada mesmo”. Eu digo: “não estou fazendo para levar, estou fazendo para deixar.” Gosto do que eu faço, gosto de desafios e, por mais complexa que seja essa atividade eu estou avançando porque sou curioso, estudioso do assunto e perfecionista.
Dá para contar muita história, aproximar pessoas?
– O vinho talvez, entre todas as bebidas, é a que mais congrega. Isso porque em torno do vinho você tem histórias para ouvir e para contar, você constrói relacionamentos inesperados. Por exemplo:se você está no receptivo de uma vinícola, de portas abertas, você recebe pessoas amantes do vinho, ou se não forem amantes são curiosos que você nunca imaginou encontrar. Aí elas chegam, se apresentam, perguntam, contam. E eu acho que é uma fonte de cultura inesgotável o mundo do vinho. É uma coisa, que pra mim dá muito muito prazer, porque nenhuma pessoa basta a si mesma, nós dependemos uns dos outros. E se tem um elemento aglutinante, esse elemento é o vinho. Você constrói relacionamentos com uma facilidade muito grande em torno do vinho. Então, a minha escolha pela vitivinicultura foi exatamente por saber que isso iria propiciar oportunidades de conhecer mais pessoas interessantes, me relacionar e aprender com as pessoas.