Na noite de sexta-feira, a Fundação Certi, uma das instituições propulsoras do polo de tecnologia e inovação de Florianópolis e de Santa Catarina, realizou a entrega da primeira edição do Prêmio Certi Ecossistema Floripa, com 22 vencedores. Essa distinção veio para coroar um setor que se consolida com protagonista da economia do Estado para os próximos anos.
Continua depois da publicidade
Especialistas debatem gestão e sustentabilidade financeira das startups
O superintendente da Fundação Certi, José Eduardo Fiates, fala sobre esta fase e destaca a inclusão de Florianópolis no seleto grupo internacional dos 38 melhores ecossistemas de inovação no mundo. A exemplo dos demais, o desafio maior aqui é atrair talentos. Confira na entrevista.
O que motivou a criação do Prêmio Certi?
José Eduardo Fiates: Aconteceram dois momentos importantes este ano com relação à temática do ecossistema de inovação de Florianópolis e de Santa Catarina. A Associação Catarinense de Tecnologia (Acate) e a Associação Comercial e Industrial de Florianópolis (Acif) reuniram um grande número de lideranças para participar de uma missão empresarial a Boston e Austin, nos Estados Unidos. Lá ficou muito evidente as semelhanças dos ecossistemas de inovação de Florianópolis e Boston. É claro que em escalas diferentes. Em Boston eles formam cerca de 30 mil profissionais de engenharia por ano (no MIT e em Harvard) – quase uma UFSC por ano – mas é um ecossistema que na essência e infraestrutura é muito parecido com o que temos aqui. Austin é um caso muito excepcional, não tinha uma tradição na área de tecnologia mas cresceu nos últimos anos. Essa missão despertou claramente a visão de que a gente tem um ecossistema de inovação no sentido técnico da palavra que é um conjunto de elementos que se organizam e articulam para gerar empresas de tecnologia fortes.
Continua depois da publicidade
E qual foi o outro momento importante para o setor?
Fiates: Em meados do mês passado fomos convidados para participar de um fórum internacional chamado High Level Forum, que reúne os mais fantásticos ecossistemas de inovação e tecnologia do mundo. São 38, é um clube dos melhores em inovação e tecnologia. Estão nesse grupo Silicon Valley de San Francisco (Califórnia), Boston, Tuskuba (Japão), Xangai, Taiwan, Oxford, Barcelona, Munique, Suécia. Em julho, o coordenador desse clube veio aqui conhecer o nosso ecossistema e ficou surpreso. Ele visitou quase todas as entidades – esteve na UFSC, Acate, Celta, Fiesc, Sapiens, Fundação Certi …- e disse que percebeu duas coisas brilhantes aqui: as pessoas falam a mesma linguagem, há uma sintonia, uma visão sistêmica integrada e as empresas estão gerando resultados. Disse: vocês têm incubadoras, centros tecnológicos, venture capital e outros ingredientes necessários para um ecossistema bem sucedido. Então, vamos convidar vocês para fazer parte desse fórum. Nós fomos em novembro participar da reunião anual em Grenoble, nos Alpes franceses. No ano que vem será na Suécia e nós iremos novamente. Então, essa ida a Boston, a inclusão nesse fórum e as reuniões quinzenais que fazermos aqui na cidade para dar sequência a um plano de desenvolvimento do ecossistema são avanços importantes. Além disso, tivemos os 35 anos da Fundação Certi. Tudo isso nos levou a lançar um prêmio que não tem o objetivo de ser financeiro, nem dizer quem é o melhor. O objetivo é fazer com que a cidade compreenda, cada vez mais, o ecossistema de tecnologia e inovação.
A população em geral já está compreendendo a importância do setor para a economia, para o Estado?
Fiates: Estão compreendendo cada vez mais. Um médico pesquisador que nos visitou me contou que ficou uns dias na Praia Brava e testou isso. Ao passar pelo Sapiens Parque, perguntou ao taxista que o levou o que faziam aí. Ele disse: olha doutor, não sei bem o que é, mas aí é o futuro de Florianópolis. Na volta, ele pegou uma taxista e fez a mesma pergunta. Ela disse: aí mexem com tecnologia. Não sei bem. Mas minha irmã foi para Lisboa trabalhar com software e disse que só volta para o Brasil se for para trabalhar aí dentro. Isso mostra que as pessoas estão entendendo o que é o negócio. Então, o objetivo do prêmio é mostrar as referências. As empresas inspiradoras premiadas são a Softplan, Neoway e Resultados Digitais. Os destaques são a Decora, Hoplon e Agriness. São empresas que estão avançando no mercado internacional. Também vamos premiar três clientes da Certi no Brasil e no mundo. E a UFSC, que foi a universidade protagonista disso tudo, vai receber o prêmio Personagem Histórico. Faremos essa premiação anualmente e poderemos ampliar para todo Estado no futuro. Estamos premiando as empresas, que os americanos chamam de “Leaders” e as instituições, que são os “Feeders”.
Qual é o impacto da inclusão de vocês nesse clube internacional?
Fiates: Tem dois grandes benefícios. O primeiro é fazer parte de um grupo onde estão os melhores do mundo. Podemos aprender com esses líderes. É um grande fórum de conhecimento. E o segundo é ter uma marca nesse grupo. É estar entre os melhores. Florianópolis passa a fazer parte de um time de elite dos ecossistemas mundiais. Há apenas três cidades abaixo da linha do equador nessa categoria. Sidney, na Austrália; Medelín, da Colômbia, pela inovação social, e Florianópolis. Queremos levar mais gente ao fórum. Ano que vem será de 12 a 16 de outubro, na Suécia.
Pelo que o senhor observou nos debates do fórum, qual é o maior desafio desses ecossistemas?
Fiates: Gente qualificada. Como atrair pessoas. Temos o exemplo de Cingapura, que atrai pessoas qualificadas de qualquer lugar do mundo pagando bolsas caríssimas. Na área de biotecnologia eles estão atraindo pessoas com a promessa de US$ 20 milhões em pesquisa. O MIT também faz investimentos elevados. Taipei faz investimentos enormes. Tsukuba no Japão é uma cidade inteira da ciência, tudo para atrair gente. Ou você atrai com dinheiro ou tem outros fatores que tornam a cidade competitiva. A nossa opção é uma cidade agradável, com 42 praias, clima favorável e muitos outros atrativos naturais. O nosso grande diferencial é que a gente conseguiu, por obra do acaso e do trabalho de algumas pessoas, juntar uma cidade extremamente atraente, uma universidade federal que forma pessoas qualificadas e entidades e instituições que ajudaram o empreendedorismo. Isso nos permite atrair gente boa para cá. Isso é um diferencial fantástico. Mas as pessoas qualificadas querem trabalhar em empresas que são motivo de orgulho. Precisamos ter uma cidade estruturada e empresas competitivas e charmosas onde as pessoas têm prazer e em orgulho em trabalhar. Então, a exemplo desses ecossistemas de inovação, o grande desafio do nosso polo de tecnologia e inovação é atrair talentos.
Continua depois da publicidade
Na sua opinião, como podemos formar melhor as pessoas para a área de TI?
Fiates: É necessário agregar mais ensino de tecnologia a cursos que não são da área tecnológica, mas também precisamos de gente que ajude a trazer disciplinas não tecnológicas para o mundo da tecnologia. Por exemplo, se você perguntar para um empresário de TI quais os problemas que ele tem nas suas equipes, ele vai dizer que uma parte do problema é capacitação tecnológica, mas há profissionais que têm problemas para se relacionar, gerenciar conflitos, de liderança, comunicação, feedback, equilíbrio psicológico, história. São formações que precisam ser cada vez mais multidisciplinares para poder trabalhar nesse mundo novo. Em 1993 visitei uma incubadora em Cleveland, EUA, que tinha uma empresa de história. Eu perguntei par ao empresário como ele ganhava dinheiro. Ele disse que ganhava fazendo pesquisa histórica para ajudar criar narrativas de novos produtos e marcas de empresas. Cada vez mais o mundo vai ser mais multi, mais cheio de variáveis.
Como avalia o impacto do setor de TI de Florianópolis em outras regiões do Estado?
Fiates: Florianópolis está se tornando cada vez mais relevante para o Estado não só como capital administrativa, mas como cidade polo de tecnologia. O polo tecnológico de Florianópolis é um grande parceiro de indústrias tradicionais e de polos tecnológicos de outras cidades do Estado, como Joinville, Chapecó, Criciúma e Blumenau. Hoje há uma relação forte para ajudar outros polos do Estado e eu não tenho dúvidas de que o futuro de Santa Catarina é se tornar um Estado de excelência em inovação e em tecnologia. Tem uma pequena diferença aí. Você pode ser uma empresa inovadora sem ser sofisticada e também ter uma empresa sofisticada sem ser inovadora. E pode ter uma empresa inovadora com base tecnológica. A gente tem que trabalhar com três variáveis.
Como está internacionalização das empresas de TI da Capital?
Fiates: Temos três gerações de empresas. As que nasceram entre os anos de 1960 a 1980, as de 1980 a 2000 e as de 2000 a 2020. Estas últimas estão mais organizadas e avançando mais no exterior. Os principais exemplos são a RD, Neoway, Sotplan, Decora e Agriness.
Outros setores também podem participar desse ecossistema?
Fiates: Nós temos que ser a Califórnia do Brasil, a Baviera do Brasil, a Catalunha do Brasil. São Estados de referência nos seus países. E eles não são referência somente em tecnologia. Na Califórnia, no Napa Valley, não é só mundo cibernético. Eles produzem vinhos de alta qualidade, como temos aqui na Villa Francioni, em São Joaquim. Vinhos feitos com esmero, Você tem na Califórnia turismo de altíssimo padrão desde a Disneylandia até visita aos parques nacionais. Santa Catarina não vai se transformar um Estado que vai desenvolver só software, hardware e outras soluções em tecnologia. Nós vamos continuar produzindo queijos, frango, máquinas, tubos e conexões, mas cada vez com mais inovação e tecnologia para nos diferenciarmos em nível nacional como a Califórnia, a Baviera e a Catalunha se destacam nos seus respectivos países.
Continua depois da publicidade
Como a Certi começou e o que faz hoje?
Fiates: Ela nasceu para ajudar as empresas a desenvolver a economia brasileira por meio da inovação e da tecnologia. Nos fazemos isso, desenvolvimento tecnológico e produtos inovadores. Fomos fudadores dos parques tecnológicos Alfa e Sapiens. Temos um fundo de investimentos, o C-Ventures e uma aceleradora, a Darwin. Também ajudamos a implantar o Sinapse de inovação no Estado.