“Quando estou a bordo não lavo o rosto de manhã. Dou um mergulho. Assim lavo a alma inteira”. A afirmação é do empresário Márcio Schaefer ao falar do prazer e do luxo de morar uns dias no iate, quando e onde a água está quente e clara. O isolamento necessário na pandemia gerou uma onda de venda de barcos no Brasil e no mundo, aquecendo esse mercado que é, principalmente, movimentado por ricos e famosos. Os fabricantes preferem não falar em preços, porque na linha premium, cada produto tem um valor. Mas uma lancha de entrada, usada, exige, em média, um investimento de R$ 300 mil.

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As vendas do setor cresceram 30% em 2020 frente ao ano anterior, informa a diretora de turismo e eventos da Associação Náutica Brasileira (Acatmar), Michele Castilho. Segundo ela, as pessoas começaram a considerar o barco como a segunda casa. Com ele, podem viajar para vários locais com segurança, com a família, mantendo o isolamento social. Em Santa Catarina, maior polo produtor de barcos do Brasil, o crescimento de vendas no ano passado ficou perto dessa média. 

O estaleiro Schaefer Yachts, de Florianópolis, que tem uma unidade de montagem embaixo da Ponte Hercílio Luz, área continental da Capital, teve que parar quase três meses no começo da pandemia. Depois, o mercado voltou e surpreendeu. As vendas cresceram 25% no ano, informa Márcio Schaefer, fundador e presidente do estaleiro. A expectativa é de que em 2021 o volume de negócios cresça mais de 20%, com vendas no Brasil e exterior. 

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O presidente do estaleiro explica que os consumidores começaram a reaparecer em 2019, após terem deixado de investir em barcos desde 2013. Essa parada na compra de artigos de luxo, como barcos, ocorreu porque muitos empresários brasileiros começaram a ficar preocupados com sinais de crise política e economia fraca, o que se manteve durante a recessão. A retomada vigorosa nas compras durante a pandemia ocorreu porque viram que estavam com embarcações velhas.

Segundo Schaefer, a maioria dos compradores de barcos é empresário. Os preços são variáveis, dependendo da característica de cada embarcação. Mas nesta fase sofrem impacto da alta de insumos. A retomada de vendas, no caso do estaleiro de Florianópolis, foi puxada por exportações aos EUA. 

– A exportação bombou. Estamos vendendo muitos barcos para os Estados Unidos. Foram 26 no ano passado e, para este ano, a fila também está grande – diz Schaefer, que exportou embarcações também para Canadá e Cingapura. 

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A equipe da empresa da Capital tem 600 trabalhadores, mas terá que contratar mais para atender a crescente produção. Os planos incluem instalar um parque fabril novo em Biguaçu em cerca de três anos. Assim, poderá unir a produção, hoje distribuída em quatro fábricas na Grande Florianópolis.

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 Um dos grandes obstáculos da indústria náutica é a falta de trabalhador qualificado. Cada empresa treina seus novos empregados e há muita rotatividade. Algumas empresas do setor já fizeram treinamentos em parceria com o Senai. A intenção é repetir.

Uma preocupação extra na região de Itajaí é se o estaleiro Thyssenkrupp Marine Systems, que vai fazer as fragatas da Marinha do Brasil, em Itajaí, disputará trabalhador com a indústria náutica. A expectativa é de que isso não vai ocorrer porque o trabalhador no estaleiro da fragata terá que ter habilidades sobre como processar produtos metálicos, o que não é tanto a exigência para embarcações de lazer.  

O projeto de quatro fragatas da Marinha, com 107 metros cada, é um dos maiores do setor náutico do Brasil para os próximos anos. O investimento é de R$ 9,5 bilhões.

Sofisticação de iates a lanchas com a força de Santa Catarina

O Azimut-Benetti Group, multinacional que tem matriz em Livorno, na Itália, e filial em Itajaí, é uma das empresas com vendas em alta em função da pandemia. Tem vendas contratadas, mas que exige uma espera. A unidade brasileira cresceu 25% em receita no último ano. O grupo faz desde gigaiates, com 108 metros de comprimento, até embarcações menores.

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O destaque da Azimut, em Itajaí, é a produção de barcos com mais de 51 pés (Foto: Azimut Yachts, Divulgação)

No ano passado, o grupo italiano faturou 900 milhões de euros (R$ 5,849 bilhões). Desse montante, mais de 50% veio de 15 a 20 embarcações do estaleiro Benetti, de Livorno, Itália, que faz megaiates comparáveis a joias, diz o CEO da empresa no Estado, Davide Breviglieri. O Azimut-Benetti monta, em todas das suas unidades, mais de 300 barcos por ano com tamanho de 35 metros ou mais. O destaque da unidade catarinense é a produção de unidades com mais de 51 pés. O próximo passo será o lançamento da linha Atlantis, com embarcações menores, de 34 a 51 pés, que deve começar ainda este ano na unidade de SC.

– Um dos primeiros movimentos que observamos alguns meses após a pandemia foi a venda de seminovos. Quando é da Azimut, a gente sempre pega de volta. É um fato natural, consolida o valor dos nossos produtos. E para quem queria ter um barco para ter isolamento social, a alternativa foi optar por embarcações já prontas – conta Breviglieri.

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Entre os obstáculos para manter o ritmo de produção acelerado está a escassez de peças ao setor. Muitas vêm da Itália, que fez lockdown recentemente para conter a Covid-19. Quanto às vendas, além do mercado brasileiro, a Azimut exporta para diversos países. O maior destino das exportações da marca, 40% a 45%, são os Estados Unidos.  

Um bom investimento e não paga IPVA

A retomada das vendas, tanto de barcos menores, de apoio, quanto dos grandes foi mais acelerada nos estaleiros Fishing Raptor e Armatti, de São José, na Grande Florianópolis. O fundador e CEO das duas empresas, Fernando Assinato, diz que a fábrica foi duplicada e a receita com vendas também quase duplicou no último ano. O estaleiro fabrica embarcações nos tamanhos de 21 a 48 pés.

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Estaleiros Fishing Raptor e Armatti, de São José, na Grande Florianópolis, fabrica embarcações nos tamanhos de 21 a 48 pés (Foto: Rodrigo Ormond, Fishing, Divulgação)

Segundo o empresário, um dos pontos fortes são as lanchas de apoio, de motor de popa, que oferecem segurança aos usuários. O empresário gosta de argumentar sobre as vantagens de ter um barco em relação a outros bens, como veículo, por exemplo. Ele compara uma Land Hover sofisticada com um barco, ambos que podem chegar a R$ 700 mil: o barco não tem IPVA, o seguro é 50% mais barato, gasta pouco combustível porque trafega menos e tem desvalorização anual menor. 

Além do mercado nacional, o estaleiro vende as embarcações para o exterior, em mercados como Austrália, Ásia e Estados Unidos. O objetivo é concentrar oferta em países onde os produtos da marca possam ter maior aceitação.

– Algumas pessoas estão adquirindo barco para morar um pouco nele. Um dos nossos clientes adquiriu uma (lancha) 42 pés, para setembro. Como a empresa dele, de São Paulo, está trabalhando totalmente em home office, ele vai morar em Angra dos Reis (RJ) – conta o empresário, sobre as características dos compradores.

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