Reeleito presidente da Associação Catarinense de Tecnologia (Acate) por mais dois anos, juntamente com a diretoria, o empresário Iomani Engelmann, assume segundo mandato nesta segunda-feira, às 18h, na sede da entidade, em Florianópolis. Ele ressalta que a formação de profissionais continua sendo o maior gargalo do setor e essa segue como uma das prioridades da entidade.

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Um fato novo pós-pandemia é a crise internacional vivida pelo setor, que afeta mais fortemente empresas que fornecem para consumidores, as chamadas B2C, como as voltadas para finanças, alimentos, imóveis e veículos. Para Iomani Engelmann, o ecossistema catarinense vai sofrer bem menos porque atua mais no mercado B2B, que é o fornecimento para empresas. A única preocupação é com eventual falta de crédito, que já é suprida parcialmente com novo fundo de venture capital criado no Estado.

O empresário, que é cofundador e diretor da Pixeon, empresa de TI para saúde, diz que os polos regionais serão outra prioridade da nova gestão e revela que a Acate está negociando com a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) uma parceria com espaço na instituição para incentivar o empreendedorismo. Confira a entrevista a seguir:

O que a diretoria da Acate vai priorizar na nova gestão que inicia agora?

A gente elegeu três grandes prioridades. A primeira é uma continuidade da formação de profissionais porque a falta de mão de obra continua o principal gargalo do setor de tecnologia. Talvez, o principal ofensor de crescimento do nosso setor, hoje, seria isso. Por isso a gente vai enfatizar os programas, até tentando, cada vez mais, trazer o poder público para nos auxiliar nesse que é o desafio da sociedade, formar bem as pessoas para que elas tenham uma qualidade de emprego boa.

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A segunda grande prioridade é focar nos polos regionais de tecnologia. Hoje são nove polos em todo o Estado. A gente, depois de tudo o que foi feito, quando os centros de integração ficarem prontos, a gente quer levar mais produtos e serviços para que os polos se envolvam cada vez mais. A gente vai desde subsidiar iniciativas regionalmente com a Acate, melhorar a governança dos polos, introduzir produtos e serviços para que o associado, independentemente de onde ele esteja em Santa Catarina, que tenha a mesma experiência, principalmente de Florianópolis, onde a Acate tem o maior número de associados.

E a terceira grande prioridade está muito focada em gerar valor para as empresas, independente do estágio. Nos últimos anos, a Acate teve muitos programas para startups, ampliamos o número de incubadoras, programas de mentorias, mas as empresas que estão em estágio mais avançado, talvez a gente não tenha uma percepção de valor tão boa pelo nosso associado. Aí a gente quer gerar novos produtos e serviços para esse perfil de empresas.

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O que o senhor destaca da primeira gestão que liderou na Acate?

Primeiro, acho que foi muito importante durante a pandemia reforçar uma série de conteúdos para os associados em relação a como fazer gestão para um novo modelo, o modelo de trabalho híbrido. A gente teve assessoria jurídica por questões legais trabalhistas, boas práticas de gestão, a gente trocou muita experiência sobre o que estava funcionando e o que não estava funcionando. Durante a pandemia, a gente viu as empresas se adaptarem muito bem ao processo de trabalhar em casa.

O segundo ponto foi a expansão da rede Miditec com o Sebrae. Nós tínhamos uma única incubadora e, agora, temos nove. É um programa de excelência que hoje está distribuído em todo o Estado. Também foi muito importante a criação do fundo garantidor de crédito para as empresas. A gente já ajudou 50 empresas com o aporte que nós fizemos e, de certa forma, foi o que salvou algumas durante a pandemia. A ideia é crescer mais.

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E, sem dúvida, outro ponto foi a formação de mão de obra. No ano passado, conseguimos inserir 5 mil pessoas em formação para o setor de tecnologia no total. É um número bem expressivo. As empresas já estão tendo retorno disso, com as turmas já se formando. A minha empresa (Pixeon), por exemplo, contratou três pessoas da nossa primeira participação no programa DEVin House. Estamos bem felizes com esse impacto positivo que a educação está trazendo ao setor.

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Como está a oferta de postos de trabalho no setor de TI em SC?

No levantamento que fizemos no ano passado, foi estimado que existia uma demanda para este ano de mais ou menos 6.500 vagas, cerca de 5% mais do que tínhamos ano passado. Na minha opinião isso continua, as empresas estão contratando.

Nós conseguimos colocar três programas estaduais de formação de pessoas. Um foi o Entra 21 que, com apoio do governo do Estado a gente conseguiu estadualizar. Hoje, são mais ou menos 1.300 ou 1.400 pessoas em formação. Conseguimos o DEVin TI, junto com a Fapesc e o Sistema Acafe para formar programadores no setor. A gente espera formar cerca de 2 mil pessoas.

Também temos o próprio DEVin House, com as empresas. Hoje estamos com nove turmas em paralelo, cada turma com 40 alunos para formação de mão de obra. A gente quer que esses programas continuem e cresçam, mas estamos muito motivados com o novo currículo do ensino médio, que pode ter uma trilha técnica desde o primeiro ano até o terceiro ano do ensino médio. 

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O aluno poderá ter uma grade curricular bastante densa e sair preparado para ingressar no mercado de trabalho com uma carreira, mais preparado para trabalhar num emprego de altíssima qualidade e até motivado para enfrentar o curso superior. O Brasil tem um baixo êxito na formação de pessoas em curso superior nas áreas técnicas.

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O setor de tecnologia dos EUA e de outras partes do mundo está passando por crise, com demissões. No Brasil, o problema acontece mais em São Paulo. Empresas de SC também são afetadas?

Está ocorrendo uma acomodação de algumas empresas, principalmente as B2C (focadas no consumidor), que têm necessidade de crescer muitas vezes sem gerar receita. Para conseguir clientes, elas fazem muita coisa de graça. No início, como o próprio Uber, o iFood, você não paga nada para usar ou paga muito pouco. Então, essas empresas que precisam de muito caixa, estão sofrendo mais. Talvez algumas delas vão ver que o modelo econômico que adotaram não se sustenta.

Em Santa Catarina, o perfil das nossas empresas é mais B2B, empresas que fazem soluções para outras empresas. Então, a minha percepção inicial é que vamos sofrer bem menos. Temos um caso ou outro de empresa sofrendo por outra situação também, mas o fato é que pelas características das empresas catarinenses, por serem B2B, vão passar muito mais tranquilamente sobre esse período.

O que pode afetar mais o nosso setor, nesse momento, é a disponibilidade de crédito porque com o crescimento da taxa básica de juros no mundo pode faltar venture capital para algumas empresas. Por isso a importância de um fundo local que estamos finalizando junto com a Invisto. Mas dentro do olho do furacão nós, com certeza, não vamos estar. 

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Quando uma empresa vende para outra, ela só passa esse valor. Quando é B2C você pode usar um serviço porque é de graça. Quando começam a cobrar, você pode não usar mais. Então, o tipo de negócio de SC, na minha opinião, deixa a gente mais blindada desse solavanco que o mercado está sofrendo.

No caso capital, vocês criaram o fundo garantidor e estão lançando outro fundo?

O fundo garantidor é um fundo de empréstimos mesmo. Hoje, temos um fundo em que as empresas ou startups podem solicitar até R$ 50 mil, mas a característica principal é ser um fundo de aval, com o qual uma empresa não precisa dar uma garantia real para o empréstimo que vai fazer. Não precisa dar um imóvel como garantia porque existe o aval associado para isso.

O que estamos criando agora é um fundo de investimento. Não é para empréstimo. Esse fundo pega uma participação da empresa. Não temos nenhum fundo local com essa característica, com esse volume de dinheiro, que é R$ 100 milhões. A gente imagina que com essa engrenagem funcionando vamos blindar mais o nosso ecossistema por conta da escassez, talvez, de recursos que teremos nos próximos anos.

Quem está entrando com esse capital de R$ 100 milhões?

São empresários do próprio sistema de tecnologia, family offices, empresários de outros setores e algumas empresas também. A própria Acate está aportando e a Acif (Associação Empresarial de Florianópolis) também. É bem misturado, o que mostra a credibilidade que o nosso ecossistema tem. Mesmo durante a pandemia, durante uma crise, estamos conseguindo levantar um fundo de investimento com essa magnitude, por conta própria. Ele já tem captado R$ 85 milhões e a gente espera encerrar a captação até o final do ano, que são R$ 15 milhões. O fundo já investiu em duas empresas.

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Como as empresas de tecnologia de Santa Catarina estão avançando nos mercados?

Eu vejo as empresas catarinenses muito focadas no Brasil, ainda. É uma característica nossa. O nosso mercado local dá essa zona de conforto. Infelizmente, não temos muitas empresas exportando apesar de termos muitas olhando mais o mercado internacional. Mas eu vejo as empresas catarinenses cada vez mais reconhecidas nacionalmente. 

É normal, hoje, empresas de SC atendendo o Brasil todo, muitas delas também países da América Latina. A marca catarinense cada vez mais reconhecida como local que cria empresas de boa qualidade. Não por acaso, muitas das nossas empresas já foram compradas recentemente, inclusive atraindo grandes players para o nosso mercado. 

Por exemplo, no ano passado, a Way2 Technology, da área de energia foi comprada pela Votorantim Energia, que integra um conglomerado de mais de R$ 40 bilhões. Anos atrás, a Axado foi comprada pelo Mercado Livre, o maior marketplace da América Latina, a GE comprou a Reason, a Cargill comprou a Agriness, a Totvs comprou a RD e a B3 (bolsa de valores do Brasil) comprou a Neoway. Outro exemplo recente foi a aquisição da startup Equilibrium pelo Boticário, que quer estar aqui conosco. Isso é importante porque cada vez mais o Estado como um todo está conseguindo atrair uma quantidade de dinheiro que talvez não circulasse por um outro vetor da economia.

Como o senhor vê o avanço do setor de biotecnologia também, com a instalação do centro global de pesquisa em proteína cultivada da JBS no Sapiens Parque?

É biotecnologia. Esse caso específico é importante porque mostra que a agregação de valor, pela tecnologia ou biotecnologia, tem as características de gerar um baixo impacto ambiental e uma altíssima geração de renda, altíssima agregação de valor para a cidade. Vemos que não só Santa Catarina, mas o Brasil como um todo tem um grande potencial em função da nossa floresta amazônica.

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Acaba de sair o último ranking da Times Higher Education que coloca a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) como a 6ª melhor a América Latina. Na sua opinião, como a UFSC impulsionadora setor de tecnologia?

Eu sou graduado lá, também. Grande parte das empresas que mencionamos aqui, a Way2, RD, Pixeion, Reason… Todos nós somos egressos da UFSC. A universidade tem uma geração de empreendedores notáveis aqui no nosso ecossistema e a gente espera que fará ainda mais. Ainda não é oficial, mas a Acate está negociando com a UFSC para ter um espaço lá dentro para aproximar ainda mais o ecossistema de empreendedorismo tecnológico com a universidade. 

A intenção é institucionalizar, de alguma forma, o empreendorismo dentro da carreira acadêmica, seja na graduação ou na pós-graduação. Já fizemos três reuniões sobre esse tema. A unidade ficará em prédio que está sendo feito na Engenharia Mecânica. Então, espero que até o final do ano tenhamos novidades sobre isso. 

Para nós seria um marco importante porque a UFSC gerou muitos empreendedores, mas não foi de forma estratégica, com uma cadeira de empreendedorismo, um currículo específico. Foi mais pelo acaso. Se a gente institucionalizar essa aproximação da academia com o ecossistema catarinense de inovação, com certeza, a gente vai fazer muito mais.

Como está a abertura de novas empresas no setor?

Continua crescendo. Os últimos dados são da nossa pesquisa do ano passado, mas imagino que continuamos com um crescimento de 20% na abertura de empresas frente ao ano anterior. Hoje, todas nossas incubadoras estão lotadas, os nossos programas de empreendedorismo e mentorias para startups estão todos lotados. Vamos ter o Startup Summit daqui a duas semanas. O evento já está lotado, com 5 mil inscritos a três semanas do evento, sabendo que no último mês é quando a gente mais vende ingressos.

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O que a Acate espera do novo governo estadual a partir de 2023?

A gente está fazendo uma pauta oficial, de todos os polos. Mas, para nós, algumas diretivas estão bem claras. Uma é continuar o apoio na formação de trabalhadores para o setor. Essa é muito importante para nós. A segunda é continue uma convergência dos centros de inovação do Estado com o ecossistema catarinense de inovação. A Acate quer, cada vez mais, estar muito próxima dos centros de inovação, que foi uma iniciativa muito bem feita pelo governo estadual e que agora está dando os primeiros frutos.

Um terceiro pilar, é que nós gostaríamos muito que o governo do Estado visse o setor de tecnologia como transversal dentro do próprio governo. Que nós pudéssemos tanto olhar os desafios econômicos do Estado e como a tecnologia pode auxiliar isso; e como as próprias secretarias do governo que tenham alguma deficiência, que pudéssemos usar a tecnologia catarinense para deixar o Estado um pouco mais eficiente.

E quais são os pleitos para o governo federal?

Uma das coisas muito importantes é que continue dando segurança no aspecto das leis trabalhistas para o trabalho remoto. As empresas de tecnologia se adaptaram muito bem. Seria muito retrocesso criar insegurança jurídica para o nosso setor referente a isso. A gente espera que essa questão de investimento e valorização da carreira do professor continue também porque é fundamental ter boas pessoas formadas. Que continuem as reformas curriculares, tanto no ensino básico. Que o governo federal tenha como compromisso a educação como prioridade para o nosso país.

E terceiro, que a reforma tributária, quando for feita, olhe alguns setores bons pagadores de impostos de maneira a não prejudicá-los. Sabemos que a reforma tributária tem uma série de desafios. Se o governo tentar equalizar todos os setores econômicos exatamente na mesma linha, sendo que alguns não são tão transparentes quanto o de tecnologia, a gente pode acabar caindo numa armadilha de elevar muito a carga tributária do nosso setor.

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