Único vizinho internacional de Santa Catarina e quarto maior parceiro comercial do Estado, a Argentina, que elegeu seu novo presidente domingo passado – 27 de outubro -, o peronista Aberto Fernández, tem toda torcida dos catarinenses pela rápida e forte recuperação da sua economia. Esse sentimento também é de quase todos os brasileiros porque, afinal, o país dos hermanos também é o quarto maior destino das exportações do Brasil. São muitas as convergências econômicas.
As divergências só acontecem de forma intensa num esporte. Há uma rivalidade eterna sobre quem é o rei do futebol – Pelé ou Maradona. Nós, brasileiros, e o mundo, entregamos a coroa para Pelé. Os Argentinos entregam para Maradona. Mas como eles são dois craques históricos e, no momento, o futebol dos dois países está batendo na trave, em baixa, as atenções se voltam para a economia. É isso que destaca o delegado da Alfândega de Dionísio Cerqueira, Valter Solon Durigon, que participa de negociações voltadas à melhoria das relações na fronteira.
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Acordos do Mercosul
Entre as lideranças que discordam das críticas do presidente Jair Bolsonaro a Alberto Fernández, por ser de um partido considerado de esquerda está a presidente da Câmara de Comércio Exterior da Federação das Indústrias de Santa Catarina (Fiesc), a economista Maria Teresa Bustamante, uma das maiores especialistas do Brasil em negociações internacionais e comércio exterior.
Segundo ela, o governo brasileiro deve deixar as críticas de lado ao Mercosul e negociar com os países do bloco porque juntos, todos serão fortalecidos economicamente. Estão em fase avançada as negociações do Mercosul para três acordos: com a União Europeia; com o Canadá, Coreia do Sul e Cingapura; e com os países do Efta, bloco que reúne a Suíça, Noruega, Islândia e Liechtenstein.
Exportações em queda
Quando assumiu a presidência da Argentina, há quatro anos, o presidente Maurício Macri prometeu guinada liberal com volta do crescimento. Não conseguiu cortar o déficit público e a inflação voltou, acentuando a crise econômica. Santa Catarina começou a sentir mais o baque dessa queda econômica do vizinho ano passado, tanto na vinda de turistas, quanto com a redução das exportações.
Em 2018, SC exportou para a Argentina US$ 544,5 milhões, -7% frente ao ano anterior. Neste ano, de janeiro a setembro, as vendas somaram US$ 324,3 milhões, com retração de 22% frente ao mesmo período de 2018.
A Argentina passou a responder por 4,8% das vendas externas do Estado, e caiu da terceira para a quarta posição, atrás dos Estados Unidos, China e Japão. Conforme o economista do Observatório da Indústria de SC, Henrique Reichert, as importações argentinas para SC de janeiro a setembro cresceram 10%, impulsionadas pelas compras de carros. Nas exportações, o produto mais vendido pelo Estado aos vizinhos é papel kraft, que enfrenta retração de 21%. As vendas do Brasil à Argentina, até setembro deste ano, recuaram 38,96%.
Baque no turismo
Principal contingente de estrangeiros no Estado no verão, os argentinos devem vir em menor número este ano. Pesquisa sobre o setor feita pela Fecomércio-SC, apurou que na última temporada eles eram 20,6% do total de visitantes em Florianópolis. No verão anterior, o percentual foi maior 23,5%. O trade turístico sentiu falta e reclamou. Neste verão, pode-se esperar nova retração.
Comparação global
Apesar da torcida pela solução da crise argentina, o clima é de apreensão porque o novo governo do país, que assume dia 10 deste mês, terá que cortar gastos públicos ao mesmo tempo que tem uma demanda crescente de recursos para atender os mais pobres.
Vale lembrar uma antiga indagação dos economistas internacionais: ninguém entende porque o Japão dá certo num território sem recursos naturais; e ninguém entende porque a Argentina dá errado com tantos recursos naturais. Dá para concluir que o Brasil também vive esse dilema. O que falta aqui e na Argentina é educação de alto padrão e políticos mais éticos e realizadores.
Entrevista:
Maria Teresa Bustamante
Presidente da Câmara de Comércio Exterior da Fiesc
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Quais são as expectativas com o novo governo da Argentina?
O problema maior é que ainda não há um programa de governo conhecido. Enquanto ele não anunciar um plano de ação imediato e mais amplo, temos que acompanhar as decisões com cautela. As empresas ainda não sabem qual será o rumo.
Como analisa o otimismo do país agora?
Há expectativa de um cenário positivo com a mudança de governo porque, se piorar será trágico. É preciso de um plano de ação de curto, médio e longo prazo para a economia. Mostrar como ficarão as dívidas com o FMI, as reservas internacionais, que tipo de medida vão tomar na relação intramercosul com o Brasil. O Mercosul continua as negociações de acordos internacionais com a União Europeia, Coreia do Sul e países nórdicos. É preciso ver como ficará a agenda econômica.
E como vê as críticas de Bolsonaro à vitória peronista?
Outras vezes tivemos situações similares. Eu prefiro me abstrair dessas retóricas mais emocionais nesse momento, porque o assunto de país não se trata dessa maneira. Para a Argentina e para o Brasil há uma necessidade recíproca de bom relacionamento dos governos porque são países vizinhos, são sócios do Mercosul e, historicamente, ambos mostraram que a melhor forma de agir é ter relação construtiva. A área diplomática vai trabalhar isso.