A decolagem da ITA, Itapemirim Transportes Aéreos, começou no final de junho deste ano com o ambicioso plano de conquistar a liderança do mercado brasileiro, 40% do total, mas teve que fazer um pouso forçado com a suspensão de todas as atividades nesta sexta-feira, 17 de dezembro. A empresa decidiu fazer uma trégua temporariamente para ajuste interno, mas a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) ordenou a parada das atividades.

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A novata companhia foi atingida por uma “tempestade perfeita” formada pela fraca demanda do mercado em função da pandemia, custos altíssimos, problemas de gestão e falta de atenção para os obstáculos tradicionais e persistentes do setor aéreo brasileiro.

Com o avanço das vacinas, o setor de transporte aeroviário, duramente afetado pela Covid-19, projetou um mercado aquecido no segundo semestre deste ano, com a volta ao normal da demanda por passagens. Mas isso não aconteceu e a ITA não conseguiu avançar em faturamento como planejou.

Outro problema foi o persistente crescimento de custos operacionais. Em função do preço internacional de petróleo e do impacto do dólar, o querosene de aviação teve alta acumulada superior a 80% este ano, segundo a Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear). Além disso, houve o impacto da desvalorização do real e da alta inflação.

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Considerando as adversidades do setor, pode-se concluir que foi um erro estratégico do Grupo Itapemirim iniciar, na metade de 2021, a atividade de uma companhia aérea com plano de ser grande. Isso porque já sabia das dificuldades causadas pela pandemia no transporte terrestre e teria que conquistar um novo mercado.

Além disso, tinha como ver o balanço das três companhias que operam no setor – Azul, Gol e Latam – todas com dívidas bilionárias e prejuízos elevados desde o segundo trimestre de 2020. A Gol teve prejuízo de R$ 2,5 bilhões no terceiro trimestre deste ano, e a Latam, que é empresa internacional, fechou o trimestre com resultado negativo de US$ 691,9 milhões (R$ 3,9 bilhões).

Faltou também analisar com atenção o histórico do setor no Brasil: as empresas aéreas nascem otimistas, com vendas em alta e com lucro, alugando aeronaves de ponta no mercado mundial. Mas, depois de um tempo, começam a enfrentar dificuldades para manter balanços positivos e uma parte para de voar.

Isso significa que o transporte aeroviário é uma das atividades mais desafiadoras para se chegar ao sucesso. O principal exemplo foi a Varig, a grande companhia brasileira de aviação que faliu com quase 80 anos de atividades. Começou a entrar em crise na hiperinflação dos anos de 1980, foi vendida para a Velo em 2006 e, depois, para a Gol em 2007. Logo após esse negócio, perguntei para Ozires Silva, fundador da Embraer que presidiu a Varig de 2000 a 2002, o que tinha achado da venda.

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Segundo ele, foi ruim porque o certo seria a Varig, uma empresa antiga e grande, comprar a pequena Gol, não o contrário. Na avaliação de Ozires Silva, isso ocorreu porque o setor aéreo brasileiro é muito normatizado, enfrenta diversas taxas e elevada carga tributária. Isso impede as empresas de crescer. Além disso, tem as crises econômicas que, muitas vezes, afetam mais essas companhias do que as de outros setores.

Outro exemplo, mais recentemente, foi o da Avianca. Em 2019, a companhia colombiana entrou em recuperação judicial no Brasil e depois parou de voar. Acumulava dívidas de combustíveis, locação de aeronaves, taxas aeroportuárias e outras. Quarta maior empresa aérea do país, antes de quebrar, em 2018 ela detinha quase 13% do mercado brasileiro. Foi atingida, principalmente, pela recessão de 2015 e 2016. 

Diante desses cenários difíceis, o mais provável é que a ITA não volte a voar. No momento, os transtornos e as perdas financeiras são grandes para os milhares de passageiros não atendidos, embora a empresa tivesse somente cerca de 1% do mercado nacional. Em SC, a companhia tinha apenas uma partida para Guarulhos, de domingo a sábado. O plano era iniciar linha para Navegantes em abril de 2022.

Para a Anac, o recado é que a liberação de atividades para novas empresas aéreas requer mais prudência. Para governos e parlamentares, o alerta é sobre a necessidade de reduzir a carga tributária e a série de taxas. O transporte aéreo é fundamental para o desenvolvimento econômico, principalmente num país continental como o Brasil. O ideal seria que tivesse mais condições de voar com resultados financeiros no azul. 

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