Neste Dia da Indústria, 25 de maio, o destaque da coluna vai para o setor têxtil e de confecções do Brasil, que tem mais de 150 anos, emprega principalmente mulheres e vem travando luta pela igualdade tributária frente aos produtos importados no valor de até US$ 50. Essa é a realidade brasileira, mas principalmente de Santa Catarina, maior produtor de confecções do país.

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Para informar sobre a situação atual, a trajetória e a pujança do setor têxtil e de confecções do país, a coluna fez três perguntas para o diretor-superintendente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), Fernando Valente Pimentel.

O diretor da Abit ressaltou que o setor é um dos mais afetados pelas importações via plataforma, é um dos mais empregadores de mulheres no Brasil, responde por 10% do emprego da indústria de transformação do país, ajuda reduzir a inflação e impacta em dezenas de setores econômicos. Saiba mais a seguir:

Fernando Valente Pimentel, diretor-superintendente da Abit (Foto: Divulgação)

Por que é importante para o setor têxtil e de confecções do Brasil ter igualdade tributária frente aos produtos importados por plataformas, por até US$ 50?

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– A igualdade tributária está totalmente conectada entre essa diferença que existe no tratamento dos impostos entre as vendas feitas pelas plataformas digitais internacionais em valores de até US$ 50, versus aquilo que deve ser praticado pela indústria e pelo varejo nacional dentro do nosso território.

Na verdade US$ 50 dólares equivale a R$ 250 aproximadamente. O ticket médio do varejo brasileiro é na faixa de R$ 150. E essa diferença entre o pagamento dos impostos que nós temos que recolher aqui no território nacional a cada centavo faturado, nos coloca numa posição totalmente desvantajosa com as plataformas digitais, que podem fazer as suas vendas em até US$ 50 USD sem o pagamento dos impostos federais devidos.

Estão pagando o ICMS 17%. É um avanço, sem dúvida nenhuma, que veio do Remessa Conforme. Mas, mesmo assim, esse ICMS é abaixo da média dos ICMSs que nós pagamos nos estados, que eu diria que está na faixa de 20%.

Além do aspecto tributário, onde as plataformas digitais em até US USD não pagam impostos federais, também temos os aspectos regulatórios. Os produtos brasileiros têm que atender uma série de exigências e são fiscalizados, ao passo que essas vendas feitas pelas plataformas internacionais digitais diretamente para o consumidor brasileiro não sofrem o mesmo crivo pelos órgãos reguladores, pelos órgãos de fiscalização.

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Então, nós temos uma desvantagem injusta pelo lado do tributo e temos uma desvantagem também injusta e prejudicial ao consumidor pelo lado das regras e regulamentos que nós temos que seguir quando comparado com essas plataformas.

Outro assunto que é muito falado para nós e que não faz o menor sentido é que as plataformas vieram para atender os menos favorecidos. Olha, o Brasil tem, infelizmente, uma renda média baixa. Essa é a nossa realidade. O poder de consumo entre as categorias que compõem a estratificação social é diferente, mas a quantidade de pessoas localizadas na parte inferior, nas classes C, D e E, é muito maior do que nas classes A, B e B+.

Então, temos uma situação em que essas plataformas vieram para o Brasil para ganhar dinheiro. Os negócios têm que ser lucrativos para gerar, obviamente, retorno para o acionista e pode gerar novos investimentos.

E com relação ao atendimento da parte da população realmente menos favorecida, quem o faz há mais de 150 anos é a indústria têxtil e de confecções do Brasil. Nós temos indústrias que atuam há mais de 150 anos. A história da indústria têxtil do Brasil remonta há 200 anos, no caráter industrial. Então não é verdade que vieram aqui para fazer benemerência.

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Pesquisa da FSB mostra que mais de 40% dos compradores estão na faixa superior de renda que vai acima de sete salários-mínimos.  Enquanto aqueles que poderão perder os seus empregos com a redução da produção nacional se encontram na faixa de dois salários-mínimos. Então é um Robin Hood às avessas.

Também não podemos deixar de considerar que mais de 65% dos empregos das categorias mais atingidas, como é o caso do setor têxtil e de confecção, são ocupados por mulheres.

Então, prejudica principalmente as mulheres, que muitas vezes são chefes de família. Portanto, quem atende o consumidor brasileiro há mais tempo, em todos os estratos sociais, em todos os níveis de renda é a indústria têxtil e de confecções do Brasil.

Temos um dado ainda mais significativo: vamos chegar a 30 anos de circulação da moeda atual, o Real. Nesse período, o IPCA geral até abril de 2024 teve uma inflação acumulada em torno de 750%, 755%. E o IPCA de produtos têxteis, de vestuário e calçados, teve alta acumulada na faixa de 440% a 450%.

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De todos os grupos que compõem a formação do IPCA geral, foi o grupo que menos teve alta de preços e, consequentemente, foi o que mais contribuiu para a estabilidade dos preços, o que favoreceu, sem dúvida nenhuma, a todas as camadas sociais e, principalmente, aquelas com menor poder aquisitivo.

Como está o setor têxtil e de confecções do Brasil, hoje, e qual é a força dele na economia?

– A indústria têxtil e de confecções do Brasil se encontra hoje entre as cinco ou seis maiores do mundo. São mais de 25 mil empresas com cinco ou mais funcionários, 1,3 milhão de pessoas formalmente trabalhando no setor. Exportações de US$ 1 bilhão, importações de US$ 6 bilhões incluindo as importações feitas pelos métodos convencionais, como contêineres e por via aérea que são registradas.

Temos atuação em todo o território nacional, embora algumas regiões sejam mais concentradoras dessa atividade. As externalidades dessa indústria são enormes porque nós atuamos não só para atender o vestuário. Atendemos indústria automotiva, indústria de construção, têxteis técnicos, têxteis tecnológicos e o setor de infraestrutura.

O setor têxtil está em tudo. Portanto, é uma indústria que atende a diversos segmentos mercadológicos. Mas o majoritário, aquilo que é ofertado pela indústria têxtil vai para a indústria do vestuário, que corresponde a cerca de 60% dos 2 milhões de toneladas de matérias-primas que são transformadas anualmente dentro do país.

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Nós temos um varejo de vestuário estimado em 2023 da ordem de R$ 280 bilhões, com um consumo per capita ano considerando 204 milhões de habitantes, da ordem de R$ 1.367. São 6 bilhões de peças vendidas no ano passado, uma queda de 4,1%, sendo 80% delas confeccionadas no Brasil.

O preço médio da peça comercializada foi de R$ 47 nos mais de 154 mil pontos de venda distribuídos em todo o território nacional. E o e-commerce doméstico movimentou R$ 23 bilhões, o equivalente a 8,3% desse volume total comercializado.

Considerando o consumo por poder de compra, segundo dados do Instituto de Marketing Industrial (IMI), a classe A corresponde a aproximadamente 2,9% de todo o público brasileiro, mas ele bate 12,9% do consumo de vestuário. A classe B1, corresponde a 5,1% da população e 5,2% do consumo. A classe B2, 16,7% da população e 35% do consumo de vestuário.

Entramos aqui na classe C1, 21% da população brasileira e 19,5% do potencial de consumo. A Classe C2, 26,4% da população com 10,3% do potencial de consumo e a D e E, com 27,9% da população e com potencial de consumo de 16,8%. Então o público A e B corresponde a 24,9% da população e 53,4% do consumo. O público C, D e E corresponde a 75% da população e cerca de 47% do consumo de vestuário, de uma forma geral.

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Essa indústria emprega majoritariamente mulheres, como falei anteriormente, e tem uma capilaridade também, como mencionado, de distribuição em todo o território nacional. É o segundo maior gerador do primeiro emprego da indústria brasileira. Tem uma correspondência da ordem de 5 a 6% do PIB da indústria manufatureira brasileira.

Conecta a economia criativa

Quanto aos empregos, representa 10% dos empregos da indústria manufatureira. Pelo país. Então, ela tem uma relevância porque se conecta totalmente com vários segmentos da economia e com a economia criativa. Ela mexe com teatro, ela mexe com cinema, com design, com a academia, escolas de moda, pesquisa, tecnologia, dada a sua grande capilaridade.

E o Brasil, dentro dos países de renda média, tem a maior cadeia produtiva do ocidente. Ele preservou uma cadeia produtiva integrada da matéria-prima até o produto final, até o seu descarte. Então, ela tem muito impacto econômico, social e empregatício para o Brasil, assim como tem em diversos outros países do mundo.

Qual é o papel da indústria na geração de riquezas?

– O papel da indústria na geração de riquezas é muito claro. Para cada R$ 1 que a indústria investe, ela tem um transbordamento de mais de R$ 2. A indústria é a geradora dos postos de trabalho com mais qualificação, mais rendimento e mais formalização.

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Ela representa 66% dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento no Brasil e 55% das exportações brasileiras estão atreladas à manufatura, seja de origem mineral, seja de origem agrícola, seja ela de outras origens.

Mas é um setor que vem perdendo densidade na formação do PIB brasileiro e também vem perdendo densidade com relação ao PIB mundial manufatureiro. Isso se deu, obviamente, por escolhas equivocadas que vínhamos fazendo ao longo do tempo.

Então, a nova indústria brasileira, apresentada pelo governo em janeiro e agora em junho, com informações das missões e metas mais bem consolidadas, tem todo o apoio nosso. O Brasil precisa de uma indústria forte, dinâmica, inovadora, tecnológica e com maior integração ao cenário mundial.

Esse cenário está mais complexo hoje diante, das disputas geopolíticas que tem trazido novas relações, alterando as cadeias de suprimentos. Mas o Brasil construiu uma indústria manufatureira diversificada, ampla e com capacidade de se modernizar e de dar um novo salto à frente.

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Para isso, temos que atuar forte, de uma maneira muito intensa na redução do custo Brasil, na melhoria do ambiente de negócios e da segurança jurídica. A reforma tributária, no momento em que estiver 100% implementada vai ser um fator importante para nossa competitividade, talvez um dos mais importantes.

Agora, nós temos que atravessar esse rubicão (período difícil de transição). A reforma tributária, para estar plenamente em funcionamento serão necessários 10 anos. Então, isso tudo nós temos que ultrapassar num mundo que tem investido e procurado atualizações tecnológicas constantes.

Temos que criar esse ambiente com custo de capital mais barato, porque a indústria é intensiva em capital, precisa de investimentos recorrentes. O custo de capital que o Brasil tem estruturalmente dificulta a atuação do empresário brasileiro.

Mas nós estamos confiantes de que,  poderemos, sim, através da indústria têxtil e de confecções, com outros setores econômicos da indústria, ajudar o Brasil se reposicionar com uma pegada muito forte também na sustentabilidade, na energia limpa, no compliance.

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Tudo aquilo que nós temos, com uma base regulatória importante, com um ecossistema que pode funcionar e ajudar com universidades se aproximando mais da indústria, criando produtos inovadores, sustentáveis e que nos permitam não só atender o mercado local, como o mercado mundial.

Não há em nós nenhuma visão autárquica do país. É preciso que o Brasil tenha capacidade de disputar o mercado mundial. Não vai conseguir em tudo, evidentemente, mas que tem as suas vocações fundamentais. E a indústria têxtil e de confecção nós entendemos que pode ser uma delas.

Precisamos também avançar com os acordos econômicos parados. Não é somente o acordo União Europeia e Mercosul, que tem problemas do Brasil e as questões da Europa. Isso para reduzir as barreiras tarifárias que vão perder cada vez mais importância, mas continuam tendo relevância, e que estão sendo substituídas, de uma certa maneira, por barreiras regulatórias, com muita ênfase em mercado de carbono, em condições laborais e de governança não só das empresas, mas do país.  

Então, nós temos uma visão positiva para frente, mas é preciso resolver esses problemas que têm bloqueado o crescimento e desenvolvimento industrial do nosso país medido não só pela participação na formação do PIB interno, mas também com a nossa participação no PIB mundial manufatureiro.

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