Peço licença ao leitor, mas antes de analisar o rebaixamento para a Série D, confirmado na tarde deste sábado após a derrota para o Tupi-MG, em Juiz de Fora, contarei aqui um pequeno pedaço da minha história com o Joinville Esporte Clube (JEC).

Continua depois da publicidade

Tenho quase 33 anos, provavelmente a mesma idade (ou algo próximo) de muitos torcedores do JEC. Como nasci em Joinville, acompanho o clube desde que comecei a frequentar o Estádio Ernestão, em 1992. É de 1992 a primeira lembrança que tenho de um jogo do JEC. Sempre fui levado para o estádio pelas mãos do meu pai, que também levava meus irmãos.

Meu pai teve sorte. Viu um clube nascer campeão, enfileirar oito títulos seguidos. Gritou "é campeão" dez vezes em apenas 11 anos. Meu irmão mais velho viu parte desta história, mas ainda era criança, tem poucas lembranças. Eu e meu irmão mais novo não conhecemos o Joinville soberano em Santa Catarina.

Na verdade, desde que eu acompanho o futebol de Joinville, eu sempre vi um desdém da cidade para o JEC. A frase é quase sempre a mesma: "Esse JEC só passa vergonha". E, convenhamos, as pessoas têm um pouco de razão. O apequenamento do Joinville é algo que, sem nenhum exagero, começou logo depois do título estadual de 1987.

Alguém aí pode dizer: pera aí, Elton. E os títulos de 2000/2001? E o título da Série C? E o da Série B? Calma, gente. Eu chegarei lá.

Continua depois da publicidade

Voltemos a 1987. O Joinville conquistou o décimo título catarinense em 11 anos. Fato espetacular. Mas, depois disso, passou quase 13 anos sem ganhar um título estadual. Na década de 90, foi para duas finais apenas (1996 e 2000). Ou seja, a geração de torcedores que nasceu nos anos 80 só foi ver o JEC campeão em 2000. Pouco para quem era tão avassalador.

Foi na década de 90 que o Joinville começou a jogar a Série C. Antes, só esteve na Série A e na Série B. Voltou à Série B, em 1996, por uma série de desistências – naquela época, a Série B era uma esculhambação (só não era pior do que a C). Em resumo: na década de 1990, o JEC teve uma amostra de como seria o clube se não fosse administrado com muito zelo.

O bicampeonato em 2001 foi histórico, mas também iludiu. Na Série B daquele mesmo ano, o JEC sequer passou para a segunda fase. No mesmo ano, o Figueirense ascendeu à Série A – onde ficou durante sete anos. O Avaí, no mesmo ano, jogou o quadrangular do acesso. No ano seguinte, o Criciúma foi campeão da Série B. Ou seja, os rivais se mexeram. O JEC se acomodou.

O primeiro choque poderia ter vindo em 2002. Naquele ano, o Joinville começou a temporada jogando a Copa Sul-Minas com os 16 melhores qualificados dos quatro estados. Foi o último colocado com apenas nove pontos em 15 partidas. Ficou atrás de Tubarão, Malutrom, Mamoré e Pelotas (clubes sem a mesma representatividade do JEC no Brasil). Seria rebaixado não fosse a extinção do campeonato.

Continua depois da publicidade

Dois anos depois, o choque real: o rebaixamento para a Série C. No mesmo ano, Criciúma e Figueirense jogavam a Série A. O Tigre até caiu, mas passou duas temporadas na elite. O Avaí estava na Série B. O JEC foi para a C.

Em 2005, com a mudança de casa (para a Arena Joinville) havia a esperança de que as coisas mudariam. Nada disso. O JEC caiu nas primeiras fases da Série C e passou a comemorar títulos inexpressivos, como a Série A2 do Catarinense e a Divisão Especial (torneios criados para manter as equipes fora da Série A e B em atividade).

Em 2006, o JEC viu o Criciúma jogar a Série C. No mesmo ano, o Tigre subiu e foi campeão. O JEC ficou na C. O Figueirense continuava na Série A e o Avaí na Série B.

Em 2007, o Joinville terminou entre os dois piores do Campeonato Catarinense. Foi salvo do rebaixamento por um regulamento sem sentido, que previa um quadrangular entre os dois últimos (JEC e Próspera) contra duas equipes da Segunda Divisão (Camboriuense e Videira). Ainda assim, o JEC se salvou por um ponto e levou uma goleada histórica do Camboriuense em casa.

Continua depois da publicidade

No ano seguinte, ficou fora da Série C. Desesperado, tentou voltar a Série C sem mérito e passou a ser notícia nacional (de forma vergonhosa) quando o então prefeito e presidente do conselho deliberativo, sugeriu, numa reunião do conselho, a compra da vaga na Série C. Nesta época, o Criciúma já estava de volta à Série B, o Avaí conseguiu o acesso à Série A e o Figueirense deixou a elite após sete anos.

Em 2009, o JEC ficou fora de série outra vez. Justamente no ano em que a Chapecoense estreou na Série D e já subiu para a Série C. O Avaí continuou na A e o Figueirense na B. Neste período, todos os rivais já tinham ganhado ao menos uma vez o Estadual. O JEC não.

O JEC só voltou a um Campeonato Brasileiro em 2010. Perdeu o acesso no campo e só o conseguiu no tapetão (de maneira justa, mas, no campo, foi derrotado). Daí em diante, venceu a Série C, em 2011, fez bons campeonatos na Série B de 2012 e 2013, e finalmente subiu à Série A de 2015, em 2014, com o título da Série B.

E os rivais neste período? Bom, a Chape subiu para a B em 2012. Avaí, Figueirense e Criciúma nunca mais jogaram a Série C. O Tigre voltou à Série A em 2013 e só caiu em 2014. O Figueirense voltou em 2011, caiu em 2012, voltou em 2014 e só caiu em 2016. O Avaí caiu em 2011, voltou em 2015, caiu, mas voltou em 2017. A Chape subiu jogou a Série A e lá permanece – já disputou Libertadores, Copa Sul-americana, perdeu jogadores, staff e direção numa tragédia, mas se reergueu.

Continua depois da publicidade

E o JEC? O JEC jogou a Série A em 2015, a Série B em 2016, a Série C em 2017 e 2018 e agora jogará a Série D em 2019.

Vocês conseguem perceber a diferença entre os cinco grandes? O JEC é o clube que menos ganhou estaduais desde 1987; o que vive o maior jejum de títulos; o que menos jogou a Série A; o que mais demorou para jogar a Série A na década de 2010; o que caiu para a Série C mais vezes; o único que caiu para a Série D.

E não é só no profissional. Desde 1989, no Campeonato Catarinense Júnior, o Criciúma faturou 12 títulos, contra seis do Avaí, seis do Figueirense, três do JEC e dois da Chapecoense.

A conclusão é que, desde 1987, o JEC sempre correu atrás dos outros três grandes (Avaí, Criciúma e Figueirense). Teve brilharecos, mas passou mais tempo em séries inferiores em relação aos demais. Viu até nascer um quinto grande, a Chapecoense, que o ultrapassou em resultados nos últimos anos – e pode ultrapassá-lo em títulos recentes na base também.

Continua depois da publicidade

Dá para dizer que o JEC teve sete anos bons desde então. Em 1998 (quando quase ascendeu à Série A); 2000/2001 (que só tiveram os títulos estaduais, mas nada nos Brasileiros); 2011/2012/2013 e 2014 – com títulos nacionais e boas campanhas. Nestes anos, não houve vexame, não houve humilhação, nada disso. Mesmo de 1996 e 2004, na Série B, o JEC sempre passou mais tempo lutando para não ser rebaixado do que brilhando no topo.

Pergunte a um torcedor de Avaí, Figueirense, Criciúma ou Chapecoense, nascido na década de 80, se ele passou por tantos vexames quanto o do JEC? Certamente eles dirão não.

Alguém pode gritar: o JEC ganhou títulos nacionais! Figueirense e Chapecoense não. Bom, é verdade, mas os títulos não ajudaram a criar uma estrutura sólida quanto a dos rivais, que não levantaram taça, mas estão bem distantes da Série D. O JEC é o único dos cinco que jogará a competição, criada em 2009, pela segunda vez.

Deu para entender o motivo pelo qual eu e meu irmão mais novo, nascidos na década de 80, nunca vimos o JEC soberano no Estado? Quando a gente achava que veria (2000/2001), alguém subia para a Série A. Quando ganhava um título nacional (2011), alguém estava uma divisão acima. Quando ganhou outro (2014), a Série A de 2015 teve quatro representantes de SC e, neste ano, o JEC foi o primeiro a cair.

Continua depois da publicidade

Aquele clube campeoníssimo, hoje vive apenas de seu passado. Perdeu a ambição que os rivais mantêm. Eles, ano após ano, lutam para crescer (e vivem as mesmas dificuldades financeiras do JEC). Até tomam sustos, mas não caem.

Na verdade, para cair, você precisa ser muito incompetente. Da B para a C, já é preciso um grande esforço. Da C para a D, você é realmente ruim (um time que cai sem nenhum gol fora de casa é, realmente, muito ruim). Por isso, vez ou outra, ouve-se em Joinville que o "JEC só passa vergonha". Óbvio. O clube convive mais com derrota do que com vitórias.

Para mudar este cenário, será necessário muita humildade, dedicação e estudo. Humildade para aprender e ouvir as críticas, fazendo delas algo motivador; dedicação para o futebol, que exige muito mais do que meio período no clube; e estudo para entender como se joga a Série D, a Série C, a Série B, a Série A. Confiar que as coisas simplesmente vão acontecer é algo ultrapassado, da época que o futebol era muito amador.

Qual é a diferença do conhecimento de futebol de um diretor do JEC para um torcedor? Nenhuma. Nenhum deles têm estudo específico da área. Hoje, em Joinville, tem gente na imprensa (eu e o repórter Gabriel Fronzi) que já fez cursos específicos para entender melhor o futebol. No JEC, onde isso deveria ser quase uma regra, não há nenhum diretor com este conhecimento.

Continua depois da publicidade

O texto é longo, mas agora chegará ao fim. Diante de todo esse histórico, a coluna só pede uma coisa: respeitem o torcedor do Joinville. Chega dele ser tão humilhado. O meu irmão mais novo quer ver o JEC soberano. O meu pai quer lembrar a década de 80.

Se você não é capacitado, não dirija o Joinville. Só o faça se tiver disposição para ser humilde, ter muito tempo de dedicação e ter vontade de estudar. O profissionalismo do futebol exige isso. E se não houver, vai demorar para o JEC frequentar a Série C, a Série B, a Série A.

Talvez, surja até outra força no Estado com estes conceitos (como fez a Chapecoense) e ultrapasse o JEC. A fila está andando e o Norte do Estado está ficando no passado, para trás, sem vislumbrar um futuro melhor.

Mais uma vez, respeitem o torcedor do Joinville! Vocês não sabem o quanto é duro para os torcedores serem a "quinta roda da carroça" há tanto tempo. Se houver um pingo de humildade para alguns dos protagonistas deste rebaixamento, que eles tenham a hombridade de se retirar do clube. Ou, se estão dispostos a continuar, que sejam MUITO humildes. Chega de ver o JEC passar tantos vexames. Joinville não merece ver seu time de futebol como motivo de vergonha.

Continua depois da publicidade

Leia outras publicações de Elton Carvalho