Nessas minhas andanças por movimentos sociais e entidades que estão ligadas diretamente às periferias, conheci muitos caras com histórias semelhantes a minha. Homens e mulheres, criados somente pelas mães, negros dos mais diversos guetos do nosso país. Cada um com sua trajetória de lutas, frustrações vitórias. Manoel Soares é um deles.
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Nos conhecemos há quase 20 anos, nos identificamos ideologicamente, estamos trabalhando em meios similares e evidenciando os emergentes das periferias. Toda vez que vejo o negrão na telinha, brilhando em rede nacional, o orgulho me toma. Manoel relembrou em suas redes, os tempos de moleque em que apareciam os bons samaritanos, cheios de boa intenção e chocolates para doar.
Bom, gostaria que vocês mergulhassem pelo menos um pouco, na volta ao nosso passado.
"A Páscoa para mim sempre foi algo não bem compreendido, chegavam na favela, onde eu morava quando criança, pessoas com carros bonitos e caixas cheias de chocolate distribuindo um amor que fazia falta nos outros dias.
Naquela hora era tão legal sentar no colo das tias e comer aquele pedaço gostoso de carinho adocicado que eles chamavam de Ovo de Páscoa, mas volta e meia uma criança perguntava se eles iam voltar amanhã é a resposta ficava no ar.
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No dia seguinte as embalagens brilhantes espalhadas pelo quintal eram vestígios da alegria que a foi embora. Às vezes usávamos as embalagens para decorar a parede quando o papel era bonito ou de um personagem que gostávamos, mas nossas paredes ainda eram de madeira apodrecida, os telhados ainda tinham furos e o banheiro ainda era coletivo para as quatro casas do beco.
Às vezes quando acabava o gás, quando meu irmão menor ficava mal da asma, quando minha mãe chorava a noite por ser dispensada de uma de suas faxinas, eu pedia a Deus que nos desse mais de uma Páscoa por ano. Se possível que fosse amanhã…"
Manoel Soares