Os nervos estão à flor da pele. Quando olhamos para o mundo e suas chacinas, extermínios a esmo, demonstrações gratuitas de intolerância, vemos que a pele caçada é preta. O racismo rebatizado de conservadorismo faz com que nós, pretos, nos tornemos, cada vez mais, alvos da crueldade cultural e histórica.

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Quando decidimos ocupar espaços de visibilidade, nos candidatar a algum cargo público, estamos na verdade, buscando dias melhores para os demais pretos e, obviamente, para a sociedade de um modo geral. Chegamos num ponto que o velado se tornou escancarado, explícito e cara de pau. Matar pretos e praticar atos racistas parece ter sido autorizado no mundo. Nosso Brasil está mergulhado num mar em que o absurdo é não ter os padrões europeus que as grandes mídias nos vendem. 

O ódio disparado contra a nossa queridíssima vereadora preta de Joinville é uma demonstração da coragem que muitos outros têm. Se de um lado estamos angustiados e entristecidos com os episódios de ameaças, do outro há gente sorrindo porque a dor negra está sendo pauta. Até quando vamos dar a atenção equivocada para casos como este? Até quando vamos somente assistir e ler que um afrodescendente foi assassinado, xingado, ofendido, maltratado ou ameaçado? Precisamos ver atitudes antirracistas em todos os meios de comunicação, nos três Poderes, nas ruas, no comportamento de todos aqueles que, mesmo não sendo pretos, abominam esses criminosos e seus delitos.

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Desde quando imobilizar alguém é matar? O vídeo que mostra o irmão do Rio Grande do Sul sendo assassinado a golpes expõe a vontade que todo racista tem, bater no descendente das pessoas escravizadas como se os grilhões, correntes e troncos fizessem parte dos dias atuais. 

Quer saber? Gostaria muito de ver algum ser bendito mudando a lei que classifica injúria e racismo. Se todos estes atos fossem considerados racistas, lotaríamos as cadeias e tornaríamos as celas multirraciais. Pois vocês sabem bem que as galerias dos presídios estão cheias de pretos porque a história não nos permite ter os mesmos acessos. Enquanto estivermos divididos e as submissões históricas forem nosso cartão de visita, estaremos dando margem para o próximo ser morto injustamente.

Carol Maier, modelo
Carol Maier, modelo (Foto: Pedro Machado)

Não pensem que tais episódios acontecem somente quando a televisão mostra. Estamos morrendo todos os dias. Nos guetos, no asfalto, dentro de casa, no caminho para o trabalho, brincando, ou até mesmo gozando o direito de ir e vir. Quantos de nós nos tornamos reféns da famosa fé pública, em que relatórios nos colocam como agressores e não como agredidos. Morremos e está tudo bem. Amanhã será dia de mostrar algo novo, mais uma morte de algum preto, americano ou brasileiro. Quem acompanha e torna notícia os processos onde esses monstros se safam das condenações? Sonho com o dia em que antirracistas, pretos rebelados, mídia e todos que se dizem de bem exijam, todos os dias, providências severas para o fim do racismo. 

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Para terminar, gostaria de dizer que mesmo diante de tanta crueldade, mesmo com todo esse ódio sendo despejado em nossa direção, continuamos de pé, lutando, prosperando, fabricando protagonistas sucessores e revolucionários. Se não conseguirmos avançar pelo amor, vai ser pela dor. Como sempre foi.

*As fotos que ilustram o nosso papo de hoje foram me enviadas de presente pela galerinha do Espaço Orisà, que trabalha com o empoderamento preto através de penteados, vestimentas, tranças e cultura.

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