Considerado ícone nacional da humanização nas prisões brasileiras, o médico e escritor Drauzio Varela foi o palestrante de abertura da 2ª mostra nacional laboral do sistema prisional brasileiro, na noite desta terça-feira, em Florianópolis.

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Em rápida conversa com jornalistas, antes do evento, defendeu o trabalho prisional e considerou Santa Catarina o Estado pioneiro com esse tipo de atividade. Demonstrou grande preocupação com a superlotação, a legislação ultrapassada e a falta de prevenção dos brasileiros com a saúde.

– O sedentarismo existe até mesmo em universitários, em pessoas com conhecimento, o que não consigo entender – lamentou Drauzio.

Confira algumas partes da apresentação do médico ao público, no auditório do Centro de Eventos Luiz Henrique da Silveira, em Canasvieiras:

Florianópolis

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“Conheci nos anos 60. Era uma cidade pacata, sem trânsito. Hoje levei mais de uma hora para chegar do aeroporto até aqui. Hoje tem trânsito pesado e é uma cidade com problemas de cidades grandes”.

Início do trabalho nas cadeias

“Sempre fui fascinado por filmes de cadeia. Comecei em visitas durante a epidemia da Aids e tuberculose. Pensei: ‘tenho que fazer um trabalho’”.

Cocaína na veia

“A droga da moda era a cocaína injetável. Comecei dando palestras. Diziam sobre a casa de detenção (Carandiru) : ‘isso aqui é o esgoto da cidade, tudo que não presta vem para cá’. Mas era bem administrada. Mas ninguém ia me levar a sério se dissesse aos presos: ‘diga não às drogas’. Então falei: ‘não pode é injetar (cocaína) na veia’. Consegui acabar com a cocaína na veia e me achei o máximo. Em 1992 entrou o crack”.

Dia a dia nas cadeias

“Atendia nos pavilhões. Para ter segurança andava no meio dos presos. Nunca tive nenhum problema nesses 29 anos de cadeia. Não é um trabalho maravilhoso, vou lá e atendo os doentes”.

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Agentes penitenciários

“No início a cadeia era segurada do jeito que desse, não eram treinados como é hoje. Aprendi que o agente penitenciário é desconfiado. Alguns perguntavam se eu ia me candidatar a deputado, se eu era dos direitos humanos. Mas fui aprendendo com eles”.

Facções

“Não conheço um agente penitenciário que me diga que antes não tinha facção. Sempre houve facções no sistema. O problema era não deixar que uma impusesse suas regras para as demais. Era uma época de violência absurda. As facções vieram para ficar”.

Massacre do Carandiru

“Ataque absurdo, não tinha razão nenhuma para acontecer. Não tinha refém. Foi um divisor de águas no sistema. O PCC veio para vingar o massacre do Carandiru. Foi a linha divisória porque os funcionários foram expelidos para fora das cadeias”.

Mortes

“Qual é o maior drama de quem está preso? Não é a liberdade. É não morrer na cadeia”.

Tráfico de drogas

“A sociedade brasileira não tem noção do risco que corremos. Isso (legislação) tem que ser modificado. Temos agora quadrilhas se matando e dominando completamente as drogas e o tráfico aqui e nos países vizinhos. Não sei qual é a solução”.

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Prisões

“A sociedade diz que tem que prender, mas ninguém pensa onde vai pôr essa gente. Quando comecei tinham 90 mil presos, hoje são mais de 700 mil presos. Só em São Paulo faltam 84 mil vagas masculinas. Não é que a polícia não prende. Melhorou a segurança? Só piorou porque as cadeias viraram depósitos de pessoas. Não dá para continuar a prender indistintamente com esse atual código penal”.

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