O futuro da indústria carbonifera no sul de Santa Catarina vem sendo uma preocupação crescente nos últimos anos. E se avolumou a partir de 2017, quando a Engie Brasil, gestora do Complexo Termelétrico Jorge Lacerda, em Capivari de Baixo, anunciou a descarbonização do seu portfólio. Na prática, a empresa estava decidindo finalizar as operações com queima de carvão para gerar energia o que, a rigor, retira de seus planos a usina do sul catarinense.
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> Engie faz parceria para vender a usina Jorge Lacerda
O possível fechamento do complexo térmico, com capacidade geradora de 857 megawatts de energia, foi anunciado em um evento em dezembro de 2020 pelo CEO da Engie, Eduardo Sattamini. Ele apontou uma programação de desativação da usina de forma escalonada a partir de 2023 até 2025. – Se houver uma solução que seja melhor para a sociedade, podemos revisitar o plano de fechamento – apontou Sattamini, na ocasião.
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Daí, iniciou um profundo debate. Passava a ser necessário buscar uma forma de manter a usina em ope ração, já que ela é a responsável direta pela compra de 99% do carvão mineral produzido em Criciúma e região. A operação de Jorge Lacerda envolve 5 mil empregos diretos, 21 mil indiretos e um movimento de R$ 5 bilhões na economia regional.
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Tem interessado na usina
Um grupo de trabalho foi articulado a partir de então, com duas vertentes: uma federal, no Ministério de Minas e Energia, e outra via governo do Estado, para negociar alternativas. Uma delas veio à tona em fevereiro, quando a Engie assinou um contrato de 120 dias com a Fram Capital, grupo de investimentos interessado na aquisição do complexo térmico. Uma série de requisitos estão sendo colocados para viabilizar a transação.
– Existem três grandes entraves que precisam ser resolvidos para o negócio acontecer – confirma o deputado estadual Jair Miotto (PSC), presidente da Comissão de Economia, Ciência, Tecnologia, Minas e Energia da Assembleia Legislativa (Alesc), que vem se debruçando sobre o tema nos últimos meses. – É preciso resolver com quem fica o passivo ambiental, o custo disso, qual será a responsabilidade das mineradoras e a da Engie. Há questões trabalhistas e de impostos também – acentua.

Um dos problemas elencados em reunião da comissão em 26 de abril foi a mudança do modelo de impostos sobre o carvão. A União passou a aplicar PIS e Cofins sobre a venda de carvão, o que encareceu a produção. Com a alteração da interpretação legal, o investidor quer garantias de que não terá que absorver esse custo. Do ponto de vista ambiental, a Fram Capital aponta pela contrapartida que as carboníferas devem assumir para investir no passivo ambiental futuro.
A possibilidade: postergar o subsídio
É aguardada com grande expectativa pelo setor a apresentação que o grupo de trabalho do Ministério de Minas e Energia fará nesta segunda-feira (14), em audiência na Alesc. Uma das expectativas é que o Governo Federal anuncie a prorrogação da chamada CDE (Conta de Desenvolvimento Energético) de 2027 para 2035. Trata-se de um subsídio oferecido ao segmento, decisivo para a operação da usina em Capivari de Baixo.
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– O ministério poderá fazer uma proposta de postergação do subsídio para 2035 – confirma o presidente da Celesc, Cleicio Poletto Martins, que foi designado pelo governador Carlos Moisés (PSL) como o representante do estado na articulação entre Santa Catarina e a União para encontrar uma solução ao impasse. – Mas não seria em forma de subsídio, mas sim um contrato para manter a usina até 2035. Mas para que isso aconteça, a Engie tem que vender os ativos, já que as diretrizes da Engie são acabar com as matrizes fósseis – observa o presidente.
Em recente visita ao sul, o governador Moisés foi indagado pelo prefeito Clésio Salvaro (PSDB), de Criciúma, sobre o encaminhamento da solução para a usina. – O Estado pediu uma atualização do Plano Nacional do Carvão, os empresários fizeram. Estamos falando de uma intervenção direta nas economias de Criciúma, Siderópolis, Forquilhinha, Treviso, Lauro Müller, Içara, Capivari de Baixo e de toda a região – reforça Salvaro. – Estamos cientes do problema. Há um prazo em curso e estamos no aguardo dessa prorrogação do subsídio pela União. É importante que os empregos sejam mantidos – sublinha Moisés.
Setor vai ao ministro
– Estamos com a Jorge Lacerda operando a pleno, e assim continuamos – resume o presidente da Associação Brasileira de Carvão Mineral (ABCM), Fernando Zancan, representante das carboníferas da região de Criciúma. Ele demonstra otimismo com a manutenção atual da usina, que está funcionando na sua condição máxima. – A negociação da Engie está bem encaminhada, em dois meses no máximo deve estar resolvida – afirma.
Mas o presidente da ABCM compreende que a venda da Engie para a Fram Capital não resolve o problema – Ter um dono ajuda, mas não é a solução. É preciso ampliar o subsídio – argumenta.
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Zancan tem reunião agendada para a próxima quinta-feira (17), em Brasília, com o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque. – Estamos na dependência do que o grupo de trabalho vai apresentar hoje, de como os investidores vão receber as alternativas que serão apresentadas. Ficou bem claro, com os estudos que fizemos, a necessidade que o parque térmico tem que ficar de pé. Tirar esse parque térmico está fora de cogitação. Temos é que encontrar um mecanismo – aponta.
Uma das perspectivas do segmento é que, com a crise hídrica, a União manifeste interesse em manter usinas térmicas ativas para a garantia energética.
Engie oferece PDV
A Engie apresentou aos trabalhadores, na última sexta-feira (11), um Plano de Demissão Voluntária (PDV). Em nota, a empresa negou que essa iniciativa tenha relação com o plano de descarbonização das operações, e que o PDV envolve todas as operações do grupo no Brasil.

– Esse PDV nos acena para um risco ou de enxugamento da usina, para a venda, ou de desmonte, para um fechamento – coloca o presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Energia Elétrica do Sul de Santa Catarina (Sintresc), Luiz Antônio Barbosa. – Mas ainda acreditamos na venda, para que a usina não seja paralisada – opina.
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A importância da segurança jurídica
Para que o negócio seja feito, e o grupo de investidores efetive o negócio em condições de manter o complexo térmico operando, é necessário garantir segurança jurídica. – É preciso ter clareza sobre as regras – confirma a deputada estadual Ada de Luca (MDB), representante da região na comissão da Alesc que trata do tema.
A reunião desta segunda, a partir das 14h, contará com as presenças remotas da coordenadora do grupo de trabalho do Ministério de Minas e Energia, Agnes da Costa; do presidente da Engie Brasil, Eduardo Sattamini; dos secretários de Estado Eron Giordani (Casa Civil) e Luciano Buligon (Desenvolvimento Econômico); dos deputados federais Angela Amin e Daniel Freitas, além de prefeitos da região.
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