Quem é mãe, quem é pai e cumpre o doce, sagrado e suave dever de amar incondicionalmente seus filhos se chocou com dois episódios separados por poucos dias no Sul de Santa Catarina. Está por completar uma semana o covarde ataque de um “pai” à casa onde estavam seus filhos. Drogado, matou a mais velha. Cinco dias depois, o flagrante do abandono de uma menina desnudou outra versão cruel dessa perspectiva preocupante, da frieza em relações que só deveriam ser pautadas por amor.
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No caso mais recente, a Polícia Militar flagrou nesta quinta-feira (19), em Braço do Norte, a degradante condição à qual uma mãe expunha a própria filha de 8 anos. Esta senhora, de 37 anos, deixava a criança trancada em casa das 7h às 18h. Trancada mesmo, de porta fechada. E sozinha. E com um caderno de tarefas a cumprir. Se ela não lavasse a louça, não deixasse a casa em dia, apanhava.
Ok, virão alguns e lembrarão que, antigamente, os filhos ajudavam os pais em casa e tomavam uns cascudos quando falhavam nas suas tarefas. E que não caiu pedaço, e que afinal aprenderam até com isso para a vida. Mas uma criança de 8 anos? Sozinha e trancada em casa? Sem banheiro e com comida escassa? Isso estravasa qualquer raia do bom senso e o pior, cria danos psicológicos a uma inocente que, no fim das contas, não tem culpa dos infortúnios pessoais de quem a colocou no mundo.
Nós, que somos pais naquele sublinhar indispensável do amor sublime, entendemos que existem as dificuldades. Que faltam recursos. Que cada vez mais pessoas estão empobrecidas. É compreensível. Mas o que se torna inadmissível é que uma mãe não encontre uma alternativa. Não existe um espaço, um lugar, uma pessoa, um vizinho, alguém para acolher essa criança no turno alternativo ao da escola? É de duvidar que em Braço do Norte, uma cidade de 30,6 mil habitantes, não exista uma opção. Se não encontrou jeito, bate na porta do Conselho Tutelar e expõe a situação. Mas não faz isso com o seu próprio filho. É desumano. É degradante.
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Mas é inegável, também, que o ocorrido em Criciúma na madrugada do último sábado é muito pior. Um sujeito, absolutamente incapaz de ser pai, consumido pela droga e pela covardia, invade a casa, desfere facadas contra os próprios filhos e, não satisfeito na sua ruindade, coloca fogo na residência. O laudo da polícia confirmou: a Alexia, de 13 anos e com tanta vida pela frente, não morreu das facadas, mas sim carbonizada. Ainda mais cruel.

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Este caso tenebroso de Criciúma serve de exemplo para expôr uma deficiência intelectual do Brasil. Enquanto nossos governantes estão a discutir bobagens secundárias, terciárias, como fundo eleitoral, impressão de voto ou validade de vacina, enquanto se discute esse rosário de asneiras não se encaram de frente problemas efetivamente grandiosos, como esse da real imputação penal para crimes hediondos como esse. Ou o dito cujo que matou a própria filha queimada poderá estar nas ruas em breves tempos ameaçando nossos filhos? Poderá, já que os legisladores do Brasil, em vez de chamarem o Judiciário à discussão de um sistema penal que exclua gente desse naipe efetivamente do convívio social, estão mais preocupados em alimentar as sandices que engordam seus currais. Natural de um país que sofre da endêmica doença da pequenez de conteúdo de sua classe política, salvo honrosas exceções.
E voltando à responsabilidade dos pais e dos “pais” (menos mal que a grande maioria é formada por gente amorosa, decente e dedicada), uma criança espera o básico de sua família. Na essência, criança não requer grandes luxos, nem roupas caras, nem brinquedos sofisticados. Nós que acostumamos elas com tais demandas. Na simplicidade, é possível criar muito bem os nossos filhos, existem maiúsculas provas disso à volta.
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E a menina que vivia trancada em casa deu uma prova imensa disso. Ao ser questionada pelos policiais sobre o que queria, a menina respondeu: “comer”. Os PMs, então, com a sensibilidade que tal tipo de relação requer, providenciaram uma coxinha, um chocolate e um suco. Pronto, foi o suficiente para a criança estar feliz. Outra aula dos pequenos nos marmanjos acabou tragicamente dada no episódio da jovem Alexia em Criciúma. Ao ser morta pelo pai, ela estava a defender os irmãos. Ela serviu de escudo para que outros três fugissem do monstro que as atacava. Essas crianças carregarão para sempre, em suas vidas, a certeza de que foram salvas por alguém que, naquela madrugada triste, lhe ensinou muito mais do que o projeto de pai que deveria mofar na cadeia, mas talvez não vá por força da fraqueza das omissas leis brasileiras.

Nos resta a certeza de que muitos pais e mães de verdade estão enlutados, tristes mesmo por histórias como estas ainda acontecerem. E capricharão ainda mais para que seus filhos cresçam cada vez mais distantes de realidades tão opostas ao universo merecido pelos pequenos. Afinal, as crianças não podem pagar pelos erros dos pais.
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