Em 29 de dezembro de 1946 a Praça Nereu Ramos, no Centro de Criciúma, ganhava o Monumento ao Mineiro. A cidade vivia o auge da indústria carbonífera, atraía milhares de trabalhadores de várias partes para dar conta da rápida evolução da produção de carvão e daí veio a ideia da homenagem aos homens que operavam a mineração.

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No início dos anos 70 a estátua mudou de lugar. Saiu do alto de um pedestal de 9 metros, perto da Igreja São José, e passou para o setor onde encontra-se até hoje, abrigada em um monumento projetado pelo arquiteto Fernando Carneiro. A estátua completará 75 anos no fim de 2021. Já o atual monumento está às voltas do cinquentenário.

Mas nem a idade do mineiro o faz ser respeitado como merece. É que, desde a origem, ele carrega uma picareta na mão direita e um gasômetro (equipamento ao estilo de uma lanterna, para iluminar o interior das minas) na mão esquerda. Acontece que há alguns dias foi percebida a ausência dos dois itens.

– E o nosso mineiro… Faltam os instrumentos de trabalho: a picareta e o gasômetro, mas certamente o Zalmir e o Robson estão cuidando desse importante e fundamental detalhe! – compartilhou em sua rede social, no último dia 17, o jornalista, historiador e ex-vereador Archimedes Naspolini Filho. Os nomes referidos pelo citado são Zalmir Casagrande, presidente da Fundação Cultural de Criciúma (responsável pelo monumento) e Robson Izidro, presidente da Fundação de Meio Ambiente de Criciúma (Famcri), que responde pelo ajardinamento da praça. – Ah, estou delirando ou há arbustos altos demais ameaçando o tamanho da estátua? – completou Naspolini.

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O mineiro é uma personalidade de Criciúma
O mineiro é uma personalidade de Criciúma (Foto: Denis Luciano / NSC Total)

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A picareta de volta na mão do mineiro

Cerca de duas semanas depois da postagem do assíduo frequentador da praça, a picareta voltou para a mão do mineiro. Na manhã desta quinta-feira (30) ela já foi percebida ali. Não com o visual da original, que era metálica e da mesma cor do mineiro. Estava ainda em estado natural, com o cabo em madeira não pintada. Mas o mineiro voltou a ter a sua picareta.

– Sim, temos a picareta e também o gasômetro – confirmou no começo da semana o presidente da Fundação Cultural. – Esses materiais originais eram metálicos, então certamente e infelizmente atraíram a atenção de pessoas que furtam esses itens pela cidade – lamentou Zalmir. O gasômetro já havia sido recolocado na mão do mineiro na terça-feira (28). – Optamos, agora, por réplicas não metálicas, para ver se duram mais tempo por ali – emendou.

Sindicato quer assumir

O Monumento ao Mineiro é tombado e integra o patrimônio histórico de Criciúma. – Estamos agora trabalhando pela revitalização do entorno, melhorias no ajardinamento, para deixar tudo mais bonito – confirmou Zalmir. 

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O Sindicato dos Mineiros de Criciúma encaminhou à Fundação Cultural um pedido para assumir a gestão do monumento. Em ofício remetido no último dia 21, o presidente do sindicato, Djonatan Elias, questiona ao município a possibilidade de adotar o espaço para responder pela conservação do mesmo. – Tem um pedido deles sim. Creio que é salutar, podemos verificar isso, qual formato pode ser, adoção por exemplo. Quanto mais gente se interessar pelos bens públicos, melhor. O poder público não tem como olhar tudo simultaneamente – respondeu o presidente. – Se eles tem interesse vamos entrar sim num acordo – destacou.

O mineiro no começo da semana, antes da devolução da picareta e do gasômetro
O mineiro no começo da semana, antes da devolução da picareta e do gasômetro (Foto: Denis Luciano / NSC Total)

Na versão original do monumento, inaugurada em dezembro de 46, a estátua estava colocada acima de um pedestal no centro da praça. Foi essa estrutura que acabou desmanchada em 1971 para permitir a migração do mineiro para o local onde até hoje ele se encontra. No lugar do antigo pedestal que veio abaixo, uma fonte luminosa foi instalada, fonte que não existe mais.

A versão original, no alto de um pedestal na praça
A versão original, no alto de um pedestal na praça (Foto: Documentário Monumento do Mineiro / Reprodução)

Uma das interpretações da época era que, retirando a estátua do alto do pedestal e a colocando na superfície, o homenageado estaria mais próximo da população, o que de fato aconteceu. O local é, nas últimas cinco décadas, ponto de encontro, muitos sentam-se à borda para descansar e papear.

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A história do antigo monumento

O jornalista Nei Manique publicou, em 1996, um mini documentário em vídeo no qual referia essa história. – A estátua continua aqui, na Praça Nereu Ramos, mas o nosso patrimônio desapareceu – pontuou na ocasião, lembrando a demolição do pedestal original. 

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Ainda no documentário foi entrevistado o monsenhor Agenor Neves Marques, religioso que liderou a organização do Congresso Eucarístico de 1946 em Criciúma, evento que teve na sua programação justamente a inauguração do Monumento ao Mineiro. – O monumento foi para marcar o Congresso e o lado social de Criciúma. Ele surgiu já polêmico. A própria comissão da festa, quando discutiu sobre como seria o monumento, divergiu muito – contou, na época.

O monsenhor, falecido em 2006, relatou ainda que foram sugeridas, para o monumento, homenagens a Getúlio Vargas e aos empresários Paulo de Frontin e Henrique Lage, que tiveram destacado papel na origem da mineração em Criciúma. – Daí surgiu a minha ideia e de uma moça, filha de Elias Angeloni (ex-prefeito da cidade), essa ideia foi para a comissão, colocar em redor do monumento essas figuras expressivas mas, no topo da coluna, o homem de Criciúma que, apesar de escravizado, era quem se arriscava debaixo das pedras que desabavam, era o homem que morria eletrocutado – relatou.

“Foi um sacrilégio”

Daí veio, 25 anos depois da inauguração do monumento com o pedestal, a demolição do mesmo. – O monumento foi destruído, alegando que era sem arte, muito gigante, muito pesado, e que não ficava bem para Criciúma que estava remodelando a sua praça. Isso foi um sacrilégio – lamentou o monsenhor.

O antigo monumento era um ponto de referência do Centro e, também, lugar de brincadeiras. O empresário Guido Búrigo recordava, no mesmo documento citado acima, que certa vez ganhou uma gincana ao conseguir subir os 9 metros do pedestal e ser fotografado lá em cima, ao lado do mineiro. – Era uma das tarefas da gincana. Quem chegasse com uma fotografia revelada, feita em cima da estátua, o monumento tinha 9 metros de altura, veja a dificuldade, subir, tirar a fotografia e entregar a fotografia revelada. Foi o que nos fez ganhar a gincana – recordou.

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Houve movimentos na segunda metade dos anos 90 incentivando a reconstrução do antigo monumento, mas as ações não saíram do campo das ideias. Em meio a tudo isso, resiste o atual, agora de novo com picareta e gasômetro nas mãos. E muita história para contar.

Paulo de Frontin e Sebastião Toledo dos Santos, personalidades históricas lembradas no monumento
Paulo de Frontin e Sebastião Toledo dos Santos, personalidades históricas lembradas no monumento (Foto: Denis Luciano / NSC Total)

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