Uma declaração do prefeito de Jaraguá do Sul e pré-candidato do MDB a governador, Antídio Lunelli, repercutiu no sul de Santa Catarina. 

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O prefeito disse em duas entrevistas nessa semana, uma delas à coluna, que era estudante na época da ditadura militar e que tudo funcionava bem naquele tempo no Brasil. – Mas a ditadura foi uma época dura, principalmente nas cidades maiores. A democracia é essencial e inegociável – ponderou.

Ainda nas entrevistas, ele associou quem “ficava fumando maconha” aos críticos da ditadura. Isso, para alguns emedebistas, soou como uma crítica à oposição feita pelo partido na época. – Quando me refiro a isso da maconha, é coisa que nas grandes cidades a gente escutava falar – observou. – Mas eu sou sim um patriota, que gosto da disciplina, da organização, da responsabilidade. E sou um defensor da democracia, e sempre serei – reforçou.

Em campanha, prefeito de Jaraguá do Sul ganha força para concorrer ao governo pelo MDB

Ex-secretário de administrações do MDB em Criciúma, coordenador de inúmeras campanhas e articulador reconhecido nos bastidores do partido, o hoje aposentado Eraldo Peruchi escreveu uma carta para rebater Antídio. Ele, que se considera emedebista raiz, não gostou das declarações, e lembrou que Antídio está no meio de uma acirrada concorrência pela candidatura do MDB para governador. 

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– O MDB fará prévias para indicar seu candidato ao governo. Aqui no sul há uma divisão, como em todo o estado. Tem grupo com o Antídio, com o Dário (Berger, senador), com o Celso (Maldaner, deputado federal). Em função dessa entrevista, que foi um desastre, eu não tenho interesse algum de ajudar o Antídio – apontou. – Ele diz que todo cara que era de esquerda ou estava contra a ditadura militar, fumava maconha. Daí eu resolvi rebater – referiu.

Na carta, que vamos reproduzir abaixo, Peruchi cita quatro nomes de emedebistas históricos da época do regime militar para endossar sua tese. Ele menciona os saudosos Jorge Feliciano (líder sindical), Lírio Rosso (deputado estadual) e Derlei de Lucca (professora), além da dentista Marlene Soccas. Todos foram perseguidos durante a ditadura, e militaram no “MDB velho de guerra”, como diz o autor do texto. – Jorge, Marlene e tantos outros, não fumavam maconha – destacou. – Partindo de um prefeito eleito e reeleito pelo MDB, a declaração é deplorável – sublinhou Peruchi.

Jorge, Marlene, Lírio e Derlei não fumavam maconha

A vida me deu a honra de conhecer o mineiro, líder sindical suplente de deputado estadual e candidato a prefeito de Içara, Jorge Feliciano. Por acreditar e lutar pela democracia e representar trabalhadores oprimidos foi preso, torturado e teve seus direitos políticos cassados pela ditadura militar, que governou o Brasil a partir de 1964. Da mesma forma tive o prazer de conhecer e compartilhar ações com os dentistas Marlene Soccas e Lírio Rosso e com a professora Derlei De Luca, outras vítimas da ditadura militar. Todos do “MDB velho de guerra”.

Além destes exemplos, heróis catarinenses na luta contra os “anos de chumbo”, conheci dezenas de outros brasileiros que tiveram a mesma trajetória e não se sujeitaram ao golpe militar. Em Criciúma e região, passado mais de meio século do trágico 31 de março, famílias inteiras ainda não encontraram os corpos de seus filhos, que continuam desaparecidos.

Nenhum desses que conheci e conheço se enquadram no conceito do prefeito de Jaraguá do Sul, Antídio Lunelli, para aqueles que resistiram à ditadura militar. Ele, em entrevistas nesta semana, foi enfático. Disse: “talvez isso aconteceu lá no Rio de Janeiro, na Bahia, ou sei lá onde. Onde a turma ficava fumando maconha, tocando violão o dia inteiro e esperando para um coco cair na cabeça”.

Jorge, Marlene e tantos outros não fumavam maconha ou esperavam queda de cocos.

Vindo de qualquer militante da direita conservadora ou dos apoiadores do atual presidente da República, afirmações deste tipo não surpreenderiam. Até veneno para piolho defenderam para combater a Covid-19, assim como a cloroquina. Mas, partindo de um prefeito eleito e reeleito pelo MDB catarinense, a declaração é deplorável.

Para piorar, vem de um “emedebista” que articula sua indicação para concorrer ao governo do Estado, para ocupar a mesma cadeira de Pedro Ivo Campos, Luiz Henrique da Silveira, Paulo Afonso, Casildo Maldaner e Eduardo Moreira. Com apoio do MDB? Inaceitável! Este “patriota”, como se define o “Anti Dio” (o espaço entre as silabas foi proposital), não tem lastro para reivindicar esta candidatura, ao menos no MDB. Eraldo Peruchi foi líder estudantil, presidiu a JPMDB, integrou diretórios do MDB, foi secretário dos prefeitos Eduardo Moreira e Paulo Meller em Criciúma, chefiou o gabinete do deputado Lírio Rosso, coordenou campanhas entre os anos 80 e 2000

Antídio rebate

– Eu vou receber essa carta? Quero responder – afirmou Antídio Lunelli, ao tomar conhecimento da crítica vinda do sul. O autor do contraponto ao prefeito se comprometeu em encaminhar o seu texto a ele. – Muito bom, fiquei curioso – frisou.

– As minhas lembranças são de uma época de patriotismo, de cantar o hino nacional, de ter ordem. Eu quando canto o hino nacional, me emociono. Mas a gente sabe que em grandes cidades tinha gente que ficava fumando maconha e falando contra o regime – disse. – Mas eu não vi isso. Essa é uma lembrança de um menino do interior que ouvia falar essas coisas das cidades grandes – emendou.

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Antídio Lunelli segue percorrendo Santa Catarina em busca de apoios para as prévias do MDB, que vão indicar o candidato do partido ao governo do estado em 2022.

O crítico de Antídio no MDB do sul

Eraldo Peruchi tem longa trajetória no MDB do sul catarinense. – Como tivemos uma vida pública acentuada, as pessoas nos procuram bastante aqui – comentou. Hoje, reside no Balneário Rincão onde o MDB tem o prefeito Jairo Custódio, em segundo mandato e com grande aprovação popular. Ele, que é muito próximo de Eraldo Peruchi, reelegeu-se com 87% dos votos em 2020.

Caracterizado nas últimas décadas como um dos principais articuladores do MDB do sul, Eraldo Peruchi tem estreita relação com o ex-governador Eduardo Pinho Moreira, a quem aconselha com frequência. – Falamos sempre, trocamos ideias. Acho que amanhã (hoje) ele já sai do hospital – contou.

Ele observa que, atualmente, Eduardo está inclinado a apoiar o senador Dário Berger na prévia do MDB. – E eu concordo com o Eduardo. Somos mais Dário pela história partidária, por tempo de partido e mandatos que teve – avaliou.

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Celso Maldaner, Antídio Lunelli e Dário Berger nas prévias do MDB
Celso Maldaner, Antídio Lunelli e Dário Berger nas prévias do MDB (Foto: Divulgação)

Contra Eduardo para deputado estadual

Peruchi vem se manifestando contrário à ideia do ex-governador concorrer a deputado estadual em 2022. – O Eduardo foi um grande deputado federal, foi um prefeito brilhante em Criciúma, com muita visão. Os mandatos dele como governador, ele ajudou muito a nossa região, de forma muito forte, e esse crédito ele tem para vir cobrar, mas não vir cobrar como deputado estadual. Ele tem é que conduzir o processo de escolha do candidato a governador. Escolhendo o candidato, e ele tendo peso e força na região, ele tem que conduzir esse processo para a vitória, e eleito ele ocupa um espaço forte para projetar o sul mais uma vez com força – opinou.

Para Peruchi, o MDB terá como candidatos, na região, os ex-prefeitos Murialdo Gastaldon e Tiago Zilli para deputado estadual e os deputados Ada de Luca e Luiz Fernando Vampiro buscando cadeiras em Brasília. – Eu sou contrário à candidatura do Eduardo, ele foi um bom governador, bem avaliado. O resgate disso se daria numa candidatura a vice-governador ou senador, sou contrário a ele descer a deputado estadual, a não ser que o partido fique sem, com a criminalização dos políticos os partidos terão dificuldades de ter candidaturas. Se for um chamamento partidário, para fazer legenda, daí eu concordo – registrou.

MDB vai ter cabeça de chapa

Para o emedebista Eraldo Peruchi, não há chances de o partido não ter um cabeça de chapa ao governo em 2022. E ele vê a direita catarinense com dificuldades de unificar um discurso e um projeto. – A direita está fragmentada. Tem muitos candidatos. Tem o governador Moisés, tem o Jorginho Mello, o João Rodrigues, o Raimundo Colombo e o Napoleão Bernardes, do PSD, tem o prefeito de Balneário Camboriú (Fabrício Oliveira, Podemos), tem o prefeito de Criciúma (Clésio Salvaro, PSDB) que quer mas faz bem em não se lançar ainda, e tem o PP, com o Esperidião. Todos esses estão à direita – analisou Peruchi, que coloca o MDB como “centro-esquerda”. – E a esquerda, quem tem? O Décio Lima vai pelo PT para constar, pois o PT precisa ter candidato. Mas ele vai apoiar quem apoiar o Lula em nível nacional – frisou.

Carlos Moisés entre a direita fragmentada, analisa emedebista
Carlos Moisés entre a direita fragmentada, analisa emedebista (Foto: Peterson Paul / Secom)

Sobre o futuro político do governador Carlos Moisés, que está por deixar o PSL e mirando o PP ou o Republicanos, Eraldo Peruchi não vê chances de ele surgir no MDB, como já se especulou. – Ele não tem espaço no MDB, no MDB ele teria dificuldades de ser o candidato, não passaria pelo diretório. Talvez um grupo de deputados possa até advogar a favor dele, mas vejo distante essa possibilidade – finalizou.

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