*Keli Magri, interina
Ari de Césaro lembra como se fosse hoje o dia em que o prefeito de Chapecó, Milton Sander, levou as máquinas para a comunidade da Linha Caravagio e ao lado de lideranças municipais e estaduais anunciou o início das obras da “estrada velha”, o sonhado Contorno Viário Leste que abriria uma rota para caminhões contornando a cidade e a ligando à BR-282, em Cordilheira Alta, município vizinho.
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– Teve até foguete – conta o morador.
Era início da década de 80. Embora ousado para a época, o traçado previsto por Sander era simples e a cidade ainda não vivia o boom imobiliário, nem era conhecida como a Capital do Agronegócio, setor que hoje representa 75% de toda a riqueza do município e quase 4% do PIB do Estado.
Quatro décadas depois, a estrada continua velha e o contorno ainda não saiu do papel. O município viu o perímetro urbano crescer, o Plano Diretor mudar, outros três traçados serem apresentados e a cada novo governo, recebeu uma nova promessa.
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A última foi em dezembro de 2015, quando o novo projeto foi apresentado à comunidade, com alterações no traçado e, com dinheiro assegurado pelo programa Pacto Por Santa Catarina do governo do Estado, a promessa de início das obras em dois anos.
Dois anos e um mês depois, nem obras, nem dinheiro e nem previsão. Sabe-se que não é qualquer obra. São 23 quilômetros de asfalto ao custo de R$ 135 milhões. O traçado inicia no Distrito Industrial Flávio Baldissera, na BR-480 em Chapecó, passa pelas comunidades Água Amarela e Caravagio, até as proximidades da empresa Ludovico Tozzo, na BR-282, em Cordilheira Alta, atingindo 114 propriedades (61 em Chapecó) em uma área contornada de 1,4 milhão de metros quadrados, 75% dela em território chapecoense. A obra liga o trecho ao Contorno Oeste já entregue e completa o Anel Viário da cidade.
O investimento contempla a construção de dois trevos, três viadutos, seis interseções, 36 paradas de ônibus e 19 acessos projetados para ligar comunidades e propriedades rurais.
De acordo com o projeto, a pista terá duas faixas, com 3,50 metros de largura cada uma e a faixa de domínio será de 30 metros de cada lado da pista. Em alguns trechos, a obra prevê também a inclusão de faixas adicionais e a construção de calçadas nos dois lados da rodovia.
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Por desafogar o centro da cidade e tirar de circulação no perímetro urbano mais de 250 caminhões por dia, o Contorno virou bandeira das lideranças empresariais no município, que questionam: Por que a obra não anda?
Desapropriação é um entrave
Maior desafio em qualquer grande obra, as desapropriações de terra são o problema a ser resolvido pelas prefeituras dos dois municípios. Isso porque o Estado passou a exigir dos governos municipais as desapropriações como contrapartida às grandes obras de infraestrutura. Medida que busca reduzir os custos aos cofres públicos estaduais. Porém, impõe mais responsabilidades aos governos locais.
Em 2009, o então prefeito de Chapecó, João Rodrigues, chegou a desapropriar as 61 propriedades por decretos, revogados em 2014 pelo prefeito José Cláudio Caramori, após a reação dos proprietários e mudanças no traçado.
Agora, o prefeito Luciano Buligon aguarda a sinalização dos recursos para as obras pelo governo do Estado para começar a negociar com as famílias. Segundo o prefeito, o município pretende ofertar a compensação de área de terras aos proprietários atingidos pelo traçado.
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– O município poderia criar uma lei dizendo que aqueles proprietários que doarem área de terra para a obra terão uma compensação ao fazerem um loteamento, por exemplo. É um atrativo para os empresários não cobrarem indenização, que é a parte mais cara da obra e um grande obstáculo.
A modalidade só funcionaria, inicialmente, com empresários. Para Ari de Césaro, que é um deles e tem área de terra atingida pelo traçado, a ideia agrada.
– Para fazer loteamento no município, precisa compensá-lo com área verde e institucional. Se eu puder doar a terra atingida para este fim na hora de construir, é uma boa troca.
Já para o agricultor Alcides Lorensetti, que tem suas terras próximas ao bairro Pinheirinho, só o pagamento justo pelos 23,9 mil metros quadrados atingidos pelo traçado são capazes de tirá-lo da propriedade em que vive há 66 anos.
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– Se sair, o Contorno vai passar na minha melhor área de terra. Não tenho interesse em construir loteamento. Só quero a minha terra ou um preço justo por ela. Caso contrário, não saio.
Para começar a negociar com as famílias, no entanto, o município aguarda a garantia dos recursos pelo governo do Estado e a assinatura do convênio com o Estado e com o município vizinho, Cordilheira Alta.
Estado não tem recursos
Depois de ser contemplada pelo programa Pacto Por Santa Catarina, do governo estadual, a obra do Contorno Viário Leste de Chapecó contava com recursos garantidos para execução. Seria via empréstimo pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) ou Banco do Brasil, instituições bancárias que financiaram as obras do Pacto no Estado.
Porém, o discurso do governo agora é outro. De acordo com o secretário de Infraestrutura do Estado, Luiz Fernando Cardoso, Vampiro, devido às alterações no projeto e a necessidade de desapropriações, a obra foi retirada do Pacto.
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– É uma obra que está na prateleira. O projeto está pronto, só falta abrir um programa novo para encostar o recurso, via BID ou Banco do Brasil. No momento não há essa abertura de crédito. Quando abrir, o governo analisa as prioridades elencadas e faz a destinação.
Neste ano, segundo o secretário, a prioridade do governo não é investir em novas obras, mas concluir as 148 em andamento, que representam R$ 1,2 bilhão aportado.
O não andamento das obras e a revisão de prioridades pelo governo reforçam a dúvida sobre a retirada do projeto da prateleira citada pelo secretário.
– Não acredito que o projeto saia do papel neste ano. Apesar da nossa cobrança ser recorrente, não vimos avanços. Parece que o governo do Estado não entendeu a importância econômica da obra. Em pleno 2018, a quinta maior cidade de Santa Catarina ter caminhões de suínos atravessando o centro não é mais admissível – criticou o presidente da Associação Comercial e Industrial de Chapecó (Acic), Cidnei Barozzi.
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– Quanto mais demorar a obra, mais a cidade vai crescer e mais difícil vai se tornar a execução dela. Pelo andamento lento, não acredito que vou viver para ver o Contorno – completou o morador Ari de Césaro.
– O poder público do município está ávido desta decisão, mas depende dos governos do Estado e federal. Não acredito que a obra aconteça neste ano, porque o processo é demorado. Já fico satisfeitíssimo se tivéssemos a licitação em 2018 – disse o prefeito Luciano Buligon.
Mesmo depois da inclusão da obra na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e na Lei Orçamentária Anual (LOA) do Estado, via emendas da deputada Luciane Carminatti aprovadas pela Assembleia Legislativa em 2017, não há garantias de que o contorno saia do papel.
Questionado, o vice-governador Eduardo Pinho Moreira, que assume o governo em fevereiro, disse, por meio da assessoria, que a prioridade dele agora é montar o novo colegiado para depois discutir prioridades.
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