Ex-ministro do Turismo no governo Michel Temer (MDB), e atual secretário de Estado de Saúde de São Paulo, o catarinense Vinícius Lummertz está entre os principais nomes do país para políticas públicas no setor. Em entrevista exclusiva à coluna, ele falou sobre os desafios que o turismo enfrenta neste momento de pandemia, e outros problemas históricos no país, como o ambiente de negócios, que ele classifica como inóspito. Lummertz alerta que é hora para incentivar novas frentes de investimentos e geração de emprego, e fala sobre o Centro de Eventos de Balneário Camboriú, projeto que aguarda conclusão. A conversa você acompanha em tópicos.
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Entrevista: Vinícius Lummertz
Momento pré-pandemia
Ano passado fomos agressivos nas políticas de apoio ao turismo, o governador (João Dória), como eu, vem do turismo. Minha ambição era elevar o turismo a outro patamar dentro da política pública em São Paulo. A primeira coisa foi atender a um pleito antigo, de reduzir impostos nos combustíveis de aviação, de 25 pra 12%. Isso projetou uma perda de receita anual perto de R$ 400 milhões. Era um risco muito grande. Calculamos esse risco, e demonstramos que poderíamos retomar esse imposto mediante um maior abastecimento de combustível em SP e maior movimento econômico. Isso foi feito, e em 12 meses recuperamos, antes do prazo. O turismo cresceu 5,4% ou 5,3%. Com esse crescimento, você tem impacto na cadeia. Aviões passaram a abastecer em São Paulo, que antes chegavam cheios e saíam vazios. Como metade dos voos no Brasil praticamente passa em SP, metade dos passageiros, e um terço do tráfego internacional, os números são robustos. Isso encadeou na economia com os outros benefícios, hospitalidade, transporte, feiras, eventos, uma aceleração geral.
O turismo tem essa capacidade de mobilizar 52 setores da economia e o imposto volta.
Não necessariamente pela aviação. Volta pelo transporte, lazer, tem uma conta satélite muito favorável. E é um grande empregador. Ano passado o Caged indicou 50 mil empregos gerados em São Paulo pelo turismo, o mesmo patamar que a construção civil. É da natureza da economia brasileira uma grande concentração na área de serviços. Se quiser trazer 400 empregos em uma BMW, você consegue empregos muito bem remunerados e um patamar tecnológico e competitivo invejável. Mas, se você fizer uma marina com 800 vagas de barcos, você gera mais (vagas de trabalho).
Santa Catarina tem uma barreira de preconceito enorme contra o turismo, sem ter consciência disso.
A região mais turística do hemisfério Sul inteiro talvez seja SC. A diversidade demográfica, cultural, étnica, é uma das maiores concentrações do mundo. Mas temos barreiras enormes contra marinas, pontos turísticos, resorts, barreiras muito íngremes, inóspitas.
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Tipos de barreiras
O Brasil tem o maior potencial natural para desenvolver o turismo no mundo, segundo o Fórum Econômico Mundial. É o 8º potencial cultural, uma diversidade muito grande. Santa Catarina tem isso tudo, tanto que é destaque no turismo. Só que o Brasil é o 137º pior ambiente de negócios para montar uma empresa de turismo no mundo. Isso é plano diretor, conflito com gestão ambiental, ou seja, na prática há um grande ambiente confuso, bastante ideológico. Só na era do Luiz Henrique (da Silveira) nós criamos 18 parques estaduais em SC. Qual é visitado? Os EUA tem 320 milhões de visitantes em parques naturais. O Brasil tem 12 (milhões), incluídos Iguaçú, Cristo Redentor e Fernando de Noronha. Se tirar esses três, é irrisório. Qual a política de parques naturais em SC? Santa Catarina produz mais de 50% dos barcos de lazer do Brasil, mas o sistema de marinas é irrisório. No Brasil, para montar um resort pode levar 10, 12 anos.
O grande erro é não perceber que turismo é fomentador das indústrias.
A indústria náutica tem marina, lazer, mas também tem moda, materiais, construção reparos, reformas. É uma indústria inteira, uma cadeia produtiva. Indústria de alimentação, gastronomia, SC tem tudo isso. Assim vive a França, ela usa o turismo para fomentar as suas indústrias com o conceito de localização, denominação de origem, das comidas, bebidas. Transforma o local em showroom de seus conceitos. Isso nós não compreendemos ainda.

Caminho para crescer
Em São Paulo estamos lançando programas inovadores. O (projeto) Politurismo, que tem ajuda do pessoal de SC, é o maior programa de gestão tecnológica do turismo do mundo. Uma espécie de Sapiens voltada para ensino. Inclusive com a participação de pessoas que passaram pelo Sapiens. Estamos com projeto de criação de distritos turísticos, para facilitar a instalação de parques temáticos, naturais, porque há 20 anos não nasce um parque temático no Brasil. Quando eu era ministro tiramos impostos de importação de equipamentos para a área temática. Esses impostos geravam acréscimo de 300% nos equipamentos.
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Em SP queremos mais parque temáticos, como Santa Catarina também quer.
Imagem do Brasil no exterior
Isso já tinha acontecido no mau aproveitamento da Copa e da Olimpíada. Não aproveitamos como deveríamos, porque tivemos muita instabilidade interna. Quem está gerenciando bem a crise da Covid-19 no mundo está em alta. As pessoas não estão culpando presidentes e gestores que estão fazendo seus deveres, obedecendo a ciência. Tem gente contra e a favor, mas não destruição de imagem.
A destruição de imagem existe quando as coisas estão muito além de confusas, como está acontecendo.
Teremos que lutar contra isso. Não será a primeira vez. Mas vai ser um trabalho de cada Estado, até que tenhamos um maior alinhamento nacional. Apesar do turismo internacional não ser tão expressivo em relação ao interno, ele é o primeiro item na balança comercial do Brasil que não é commodity, tem peso. Minha percepção é que essa imagem não tem apenas relação no que diz respeito a promoção e fluxo de turistas. Mas a fluxo de investimentos, que também precisamos. De parques, hotéis, marinas. A Disney tem três parques na China, a Universal tem parques no mundo inteiro, parque temáticos crescem no mundo todo e não andam no Brasl porque não temos política para isso. Nosso nível de atraso em relação às prioridades do turismo é dramático, e é um atraso de percepção.
Na última eleição para governador em Santa Catarina a palavra turismo não foi pronunciada.
É 12% do PIB do Estado, em São Paulo é 10%. Precisamos mudar esse ambiente.
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Tendência pós-pandemia
É preciso criar resiliência nos destinos, segurança. Apostar no turismo de proximidade, o turista tem que se sentir seguro pra viajar. Como SP tem o maior emissivo e receptivo, tem potencial para investir internamente. Outro estado que pode se beneficiar disso é SC, pela proximidade do RS, PR e SP. Isso, até agora, foi dado de presente pelo empreendedorismo local, não foi esforço consistente de política pública, ainda que eu respeite vários esforços. Não estou fazendo uma crítica desavisada. Com Luiz Henrique fizemos o Centro de Eventos. Eu mesmo participei e trouxe os recursos pra fazer o de Balneário Camboriú, que, diga-se de passagem, entreguei dinheiro depositado na conta para o que faltava. Entregamos pronta a obra física, (para) os equipamentos o dinheiro está depositado na caixa. E não aconteceu nada. É muito tempo. O nível de prioridade tem que ser estabelecido.