O Ministério Público de Santa Catarina orientou a Federação Catarinense dos Municípios (Fecam) e as polícias Civil e Militar sobre a ilegalidade dos decretos municipais que fecham os limites das cidades catarinenses, e que foram editados em diversos pontos do Estado nos últimos dias. Em entrevista à coluna, o promotor de Justiça Douglas Roberto Martins, integrante do Gabinete Gestor de Crise do MPSC, coordenador do Centro de Apoio Operacional da Área da Cidadania, e um dos autores do estudo que resultou na orientação, fala sobre os limites legais das prefeituras.
Continua depois da publicidade
Ele reforça a importância de que as pessoas obedeçam a quarentena, determinada em decreto estadual, e se mantenham em isolamento social. Mas diz que a posição do MPSC é para garantir o direito de ir e vir a quem precisa, como manda a lei. Explica, ainda, que o posicionamento do órgão estadual está de acordo com regulamentação expedida pelo governo federal sobre o assunto.
ENTREVISTA: Douglas Roberto Martins, promotor de Justiça

Por que as barricadas extrapolam os limites legais?
A orientação inicial é que elas extrapolam os limites de regulamentação que são dados ao município. É preciso adotar medidas de quarentena, de fato. E os municípios têm atribuição para fazer isso, desde que haja uma pertinência dentro do território, como barreiras sanitárias, restrição de circulação, etc. Porém, as medidas de fechamento de limites de municípios restringem de forma inconstitucional o direito de ir e vir das pessoas e podem inclusive prejudicar o acesso a serviços essenciais, a estabelecimentos hospitalares, estabelecimentos de saúde. É preciso permitir que as pessoas transitem para buscar esse tipo de atendimento. Depois da publicação da orientação, o governo federal também, reforçando a nossa conclusão, editou a Medida Provisória 926 e o Decreto 10.282, em que só autoriza a adoção de qualquer medida de restrição de locomoção interestadual ou intermunicipal fundamentada em estudo da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Só com recomendação técnica da Anvisa essas medidas poderiam ser adotadas.
Neste momento, não há fundamentação técnica da Anvisa para que os municípios de Santa Catarina tomem essas medidas?
Continua depois da publicidade
Não existe. Ela pode vir a acontecer, dependendo da evolução da transmissão da Covid-19. Mas, até o momento, não existe essa orientação.
Há preocupação de alguns municípios em relação aos hospitais serem lotados por moradores de cidades vizinhas. Pode ter sido um motivo para barrar a entrada? Isso também é ilegal?
Isso é ilegal, porque é barrar o acesso a um serviço de saúde que funciona como portas abertas. O serviço de portas abertas é obrigado a receber qualquer pessoa que o procure, e oferecer o atendimento para o qual está habilitado e capacitado. Não tendo condições de dar continuidade ao tratamento, esse paciente vai ser transferido para um centro maior. Mas um pronto atendimento, um pronto socorro, não podem restringir o atendimento por local de residência. E essa barreira sanitária, se você permitir que as pessoas do município saiam e retornem, isso também evidencia a ineficiência dela. As pessoas vão continuar circulando no território, com as restrições, evidentemente.
Mas se eu permito que alguém saia e depois retorne, aquela intenção de não permitir o progresso ou o avanço da transmissão para a minha cidade já não surte mais efeito.
Emitida a orientação, a partir de agora de que maneira o Ministério Público vai agir? Por meio de denúncias?
Continua depois da publicidade
Essa recomendação foi expedida pelo procurador-Geral de Justiça, a Fecam (Federação Catarinense dos Municípios) fez com que ela chegasse aos municípios, e agora estamos agindo articulados com a Polícia Militar e a Polícia Civil para que reforcem essa orientação, num primeiro momento. E, depois, passem a garantir o acesso das pessoas e o livre trânsito delas pelas fronteiras dos municípios. Claro que respeitando eventual barreira sanitária, que é para triagem dos quadros clínicos. Isso é possível que os municípios executem. Com a atuação da Polícia Militar e da Polícia Civil, que nós temos informações que já estão operacionalizando o cumprimento, a efetivação dessas orientações, caso ainda exista a persistência (em manter as barricadas), a Polícia Militar e a Polícia Civil vão reportar ao Ministério Público para avaliar as próximas providências.
Que tipo de providências? O município é passível de uma ação, por exemplo?
Sim, com o descumprimento, e analisando todas as circunstâncias em que ele se deu, é que vamos ter a possibilidade de avaliar a dimensão da responsabilização civil, penal ou administrativa. Mas, no mínimo, a adoção de alguma medida para anular ou fazer valer o direito de ir e vir das pessoas, anulando essas medidas ilegais adotadas em decreto ou ato administrativo que o município tenha implementado.
É importante reforçar a importância das pessoas cumprirem as restrições de circulação, e só saírem quando realmente houver necessidade.
O que o Ministério Público procura, com essa orientação, é garantir que as pessoas que precisam, que necessitam transitar entre os municípios, seja para atender um familiar idoso, que não pode sair de casa, seja para acessar uma residência que tenha no município, embora o veículo tenha placa de outro, enfim, para garantir que as pessoas consigam exercer o seu direito dentro das restrições que foram estabelecidas pelo Estado, e dos cuidados sanitários que a gente já tem neste momento.
Participe do meu canal do Telegram e receba tudo o que sai aqui no blog. É só procurar por Dagmara Spautz – NSC Total ou acessar o link: https://t.me/dagmaraspautz
Continua depois da publicidade