Ex-ministro da Previdência Social entre 2010 e 2011, e novamente em 2015, nos governos Lula e Dilma (PT), Carlos Eduardo Gabas palestra nesta sexta-feira em Florianópolis, no lançamento do ciclo de palestras Conversa.com, da Faculdade Anasps. Contador e funcionário de carreira do INSS, Gabas tem liderado a campanha do partido contra a reforma da previdência que tramita no Congresso Nacional.

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Em entrevista à coluna, ele critica o modelo proposto pelo governo e diz que se trata de uma política insustentável.

Um dos principais argumentos da proposta é o combate a privilégios. O senhor tem afirmado que isso não vai ocorrer. Em que se baseia?

Não combate privilégios. A medida ataca fundamentalmente o regime geral de Previdência, que é administrado pelo INSS. Mais de R$ 700 bilhões, ou seja, mais de 70% da economia que Paulo Guedes diz que tem que fazer sai do regime geral de Previdência. Quem é o regime geral? Qual é a media geral de salários que paga esses 35 milhões de benefícios por mês (do regime geral)? R$ 1400.

Para mim, quem ganha R$ 1400 não é privilegiado. Vamos falar de privilégios que existem em algumas regras. Tem servidores que recebem acima do teto. O governo não só reconhece, como proporciona alíquota diferenciada. Por que aceitar que alguém receba acima do teto constitucional? Teto é teto, ninguém pode receber acima. No entanto, tem salários ainda de R$ 80, 100, 200 mil por mês. Isso é privilégio, e ele não ataca. Não acaba com privilégios do Executivo, do Legislativo e principalmente do Judiciário.

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O senhor concorda que há déficit na Previdência?

Sempre defendemos, desde primeiro ano de governo do presidente Lula, uma reforma da Previdência. Não só defendemos como fizemos a emenda 41, depois a 47, depois regulamentação da emenda 41, em 2012, que cria o mesmo teto de contribuição e de recebimento de benefícios para todos os trabalhadores, da iniciativa privada e servidores públicos.

O resumo dessa regulamentação da criação da previdência complementar do servidor público é que, após a aprovação da lei, o servidor de qualquer poder vai se aposentar com o teto de R$ 5849, seja ministro do Supremo, juiz, procurador, médico, engenheiro, deputado, senador. Isso já foi feito. Vínhamos debatendo a continuidade desse rearranjo. Entendemos que é necessário porque a sociedade evolui, temos fontes de financiamento que foram pensadas em outro ambiente de trabalho, regras de acesso pensadas há 30, 40, 50 anos.

Não temos problemas em dizer que somos favoráveis a uma reforma da Previdência. Mas não essa que está sendo proposta, até porque temos divergência se isso é uma reforma. Para nós, é ajuste fiscal que faz o trabalhador pagar uma conta que não é dele. Nossa principal premissa para uma reforma é diálogo. Precisamos ouvir empregadores, porque vamos mexer nas fontes de financiamento, precisamos ouvir trabalhadores e aposentados. Com números abertos para as pessoas olharem quanto arrecada, quanto gasta, e a renúncias fiscais.

Quais são os pontos que o senhor considera controversos no projeto?

A previdência tem a estrutura garantida na constituição, que é algo que eles querem mexer. Querem tirar todas as regras da constituição, o que é um risco enorme, porque depois se altera com lei ordinária, Medida Provisória ou no máximo com lei complementar, sem quórum qualificado, o que fragiliza demais a proteção dos trabalhadores.

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Outra medida é substituir o sistema solidário por capitalização individual, que não tem chance de dar certo. Foi feito em 30 países no mundo e 18 já voltaram atrás, porque não tem nenhuma possibilidade de um sistema que tem característica de gerar lucro, como é a capitalização, proteger trabalhador pobre. Onde isso foi implantado, por exemplo no Chile, que é nosso país vizinho, gerou desproteção social, miséria e aumento da concentração de renda. A primeira medida pra equilibrar a previdência é ter emprego.

O fundo de financiamento da Previdência que está na constituição é composto por contribuição dos empregadores, dos trabalhadores e do governo. Paulo Guedes propõe acabar com a contribuição dos empregadores, acabar com a contribuição do governo, e ficar só a do trabalhador. Quem vai pagar o custo das atuais aposentadorias? Esse é o custo de transição, que Paulo Guedes diz que não dá para estimar, mas no Chile custou 1,36 vezes o PIB.

A Cepal (Comissão Econômica para a América Latina) estima que, no Brasil, vai custar 2 PIB. São R$ 14 trilhões de reais. Quem vai pagar essa conta? Hoje dependemos muito de folha de salários, e precisamos fazer uma migração para contribuição sobre o valor agregado. Isso tem que se debater com os empresários. Há um processo natural de substituição de gente por tecnologia, não vai parar.

Então precisamos substituir folha de salários por valor agregado. Essa é uma discussão central. Tem saída. Outros países, especialmente os europeus, mais civilizados, reorganizaram fontes de financiamento. Por que o Brasil tem que desmontar o sistema e substituir pela privatização da Previdência, que vai desamparar, vai desproteger o trabalhador? Isso também causa estagnação da economia. Precisamos fazer o contrário, botar dinheiro na economia para que a roda volte a girar.

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