Nenhuma escultura de Michelangelo tem sido mais reproduzida ao longo dos séculos do que a Pietà. Para além da genialidade do italiano, responsável por algumas das mais incríveis obras do Renascimento, ela é icônica pela universalidade do que representa. Cravada no mármore frio está a dor de uma mãe que segura nos braços o filho morto. É uma dor universal. Transcende crenças, idiomas, ultrapassa o tempo. Não há lágrimas no talhe do mestre fiorentino. Mas um olhar doloroso, ao mesmo tempo profundo e vazio.
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Esse olhar me voltou à memória muitas vezes ao longo dos últimos dias quando penso nas mães que perderam seus filhos no ataque à creche de Blumenau, em meio à Semana Santa. Nem de longe conseguimos mensurar o tamanho dessa perda. Não há lágrimas suficientes para uma dor tão desumana, pungente, brutal. Só o vazio, como nos olhos da Pietà.
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Nenhuma mãe deveria enterrar um filho. Falhamos, todos nós, quando a escola deixa de ser um ambiente lúdico, seguro e alegre para se transformar no palco de uma tragédia. Quando não conseguimos identificar e parar a tempo os potenciais riscos. Quando permitimos que mães e pais que deixaram seus filhos pela manhã na creche nunca mais possam levá-los para casa, para dormir em paz e sonhar seus sonhos infantis.
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E seguimos falhando com nossas crianças, em muitos outros aspectos. Quando deixamos que morram atingidas por balas perdidas em meio à guerra do tráfico. Quando são violentadas por adultos que deveriam protegê-las. Quando são negligenciadas, maltratadas. Quando morrem sem acesso a um tratamento de saúde.
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Quando há mães que hoje, neste domingo de Páscoa, não têm o que dar de comer a seus filhos. Mesmo em Santa Catarina, estado que tem o menor número de pessoas em situação de vulnerabilidade alimentar no Brasil, são 153 mil moradores abaixo da linha da pobreza. Entre eles, há muitas crianças.
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Este ficará marcado como um domingo de Páscoa amargo, manchado pelo horror. Que a emoção provocada pela tragédia desperte em todos nós a responsabilidade que temos com nossas crianças. E que o olhar vazio e triste de suas mães encontre razões para recomeçar.
