O vaivém do processo de licenciamento ambiental da BFP, empresa que processa as sobras de pescado da Gomes da Costa, em Itajaí, pode levar o grupo espanhol Calvo, que comanda as duas marcas, a “rever investimentos” em Santa Catarina. A informação é do CEO da Gomes da Costa, Enrique Orge, que relata insegurança jurídica nas operações no Estado. A multinacional tem previsão de investimentos de R$ 300 milhões, que hoje estão em stand by.
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O problema está no odor exalado pela fábrica, que transforma as sobras de peixe em bioproteína, e fica na comunidade de Arraial dos Cunha, na zona rural de Itajaí. Reclamações da comunidade levaram a ações judiciais e à suspensão das atividades por parte do Instituto do Meio Ambiente (IMA).
Orge afirma que a empresa investiu, desde agosto do ano passado, R$ 3 milhões para fazer as adequações determinadas pelo IMA. A BFP instalou uma série de equipamentos que filtram o mau cheiro, mas a autorização para voltar a funcionar ainda não veio – no momento, a fábrica está liberada pelo IMA para operar em ritmo de teste, em dias alternados e em horário comercial.
Orge diz que a empresa é impactada por questões subjetivas.
Ocorre que Santa Catarina não tem parâmetros legais para o odor, como o estado do Paraná, por exemplo, ou países como o Canadá.
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– Estamos falando de um problema sobre o qual não existe legislação, parâmetro. Os que são exigidos sobre algumas partículas voláteis, no estado do Paraná e no Canadá, nossa fábrica atende. Atende a legislação dos lugares onde ela existe. Estamos ficando na mão de critérios subjetivos – diz.
O trabalho intermitente prejudica o escoamento dos restos de pescado, já que a Gomes da Costa, de onde vêm as aparas, trabalha 24 horas. O material que não é processado pela BFP, hoje, é levado para o aterro sanitário.
Cada dia de interdição custa à indústria o equivalente a R$ 25 mil.
– Não se consegue criar uma economia circular, de reaproveitamento total. Estamos sendo obrigados a enviar ao aterro. Fizemos tudo o que o IMA nos obrigou, não deixamos de atender a nenhum pedido. Apesar disso, não conseguimos tranquilidade de poder trabalhar com segurança – afirma Orge.
O IMA foi questionado na quinta-feira (27) sobre as questões apontadas pela empresa. Em nota, nesta sexta, informou o seguinte:
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“O IMA é órgão executivo, portanto cumpre as leis existentes. Para não ficar no vácuo normativo, os técnicos têm a competência de exigir, no processo de licenciamento, padrões de qualidade do ar. E aí podem tomar base de outras legislações não vigentes em SC. Mas o fato de não existir norma decorre da inexistência de lei federal ou estadual”.
Reunião com Moisés
Na semana que vem, Manuel Calvo, presidente mundial do grupo espanhol, virá a Santa Catarina para uma reunião com o governador Carlos Moisés (PSL). Será a segunda vez que Moisés receberá representante da Gomes da Costa. A pauta do encontro serão os investimentos futuros.
Em 2018, o grupo Calvo anunciou uma previsão de investimento de R$ 300 milhões em Itajaí, para unificar todas as plantas fabris da empresa – a maior enlatadora de pescados da América Latina – em um só lugar. O cronograma previa que, a esta altura, o terreno já estivesse definido. O que não ocorreu.
– O investidor foge do risco, e a mensagem não é boa. Qualquer um, não só nós, vai ter que pensar duas, três vezes em investir em Santa Catarina. Como posso acreditar, para continuar investindo na região? Essa é a pergunta para o governador – afirmou Orge.
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No grupo de Whatsapp que reúne os moradores de Arraial dos Cunha, há reclamações de mau cheiro vindo da fábrica nos últimos 15 dias, no período em que a indústria está operando. Nos relatos, recebidos pela coluna, os vizinhos falam de náuseas e dor de cabeça.
A empresa alega que a BFP é a indústria de farinha de peixe com melhor controle de odor do grupo, a que menos tem cheiro no Brasil. Enquanto esteve em operação, a fábrica foi filmada pela Embrapa como exemplo de indústria de beneficiamento de sobras para fazer farinha de peixe.
O grupo Calvo, por meio da Gomes da Costa, é o maior empregador privado de Itajaí, com cerca de 2 mil vagas de trabalho.