A Marinha do Brasil formalizou na terça-feira, durante a feira internacional de defesa e segurança LAAD Defense & Security, no Rio de Janeiro, a conclusão da concorrência pública para encomenda de quatro navios militares. Um negócio estimado em US$ 1,6 bilhão, que envolve alta tecnologia, e que tem relação direta com Santa Catarina. As embarcações serão construídas no estaleiro Oceana, em Itajaí, parceiro do consórcio Águas Azuis, que é formado por gigantes como a alemã Thyessenkrupp Marine e a Embraer.

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O anúncio, que já havia sido adiantado pela Marinha na última quinta-feira (28), abre um novo nicho de mercado na construção naval em Santa Catarina, e traz respiro a um setor que foi atingido em cheio pela crise do petróleo. A empreitada tem previsão de gerar dois mil empregos diretos -mais que o dobro do atual volume de trabalhadores na indústria de construção naval no Estado – e pode alcançar 6 mil empregos indiretos no auge de produção, que deve se estender até 2028.

O polo da indústria de construção naval offshore catarinense, que se concentra em Itajaí e Navegantes, chegou a empregar 10 mil pessoas durante o boom da exploração de petróleo e gás no país. Hoje não há mais do que 1,5 mil trabalhadores, segundo dados do Sindicato da Indústria de Construção Naval (Sinconavin). Resultado de uma desastrosa combinação entre a baixa do preço do petróleo, que freou investimentos em todo o mundo, e a crise interna vivida pela Petrobras depois de ter sido deflagrada a Operação Lava Jato.

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A estatal, que era a principal cliente dos estaleiros, não faz novas encomendas desde 2015 – o que fez com que os empregos caíssem gradativamente em todo o país. Os contratos do setor são de longo prazo, e conforme foram vencendo, o espaço ocioso passou a ser ocupado por novos projetos, como a construção de rebocadores portuários. A entrada de um novo nicho, de embarcações militares, abre as portas para novas oportunidades.

– É uma excelente oportunidade para termos, em nosso polo naval, um novo produto a ser oferecido. Já temos apoio logístico, portuário, e agora embarcações de defesa. É um know how que poucos possuem, e abre espaço para transferência de tecnologia – observa Rafael Theiss, presidente do Sinconavin.

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Estaleiro em Itajaí
Estaleiro em Itajaí (Foto: Diorgenes Pandini)

O estaleiro Oceana, onde serão construídos os navios, esteve em período de “hibernação” nos últimos meses, sem produção ativa. Não é o único. Dos estaleiros de construção naval ativos em Itajaí e Navegantes, apenas três mantêm produção – mas apostaram em projetos alternativos. Constroem embarcações de apoio portuário, como rebocadores, e prestam serviços de manutenção.

A decisão das empresas que estão com as atividades suspensas, em não desmobilizar os estaleiros, é um sinal de confiança do setor na retomada de mercado. Por isso a chegada de novas encomendas, no setor de defesa, é alvo de expectativas. Espera-se que, se o projeto for bem-sucedido, a Marinha mantenha o consórcio Águas Azuis – e o estaleiro Oceana – como fornecedor para novos projetos.

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Estaleiro em Itajaí
Estaleiro em Itajaí (Foto: Diorgenes Pandini)

Produção dos navios começa em 2020

Embora a Marinha tenha assinado ontem a Declaração da Melhor Oferta, formalizando o consórcio como vencedor, o contrato ainda não foi oficializado. O compromisso do governo é que a assinatura ocorra até dezembro, depois de esmiuçados os termos. Nesta fase, os valores previstos estão em negociação.

Ainda que a construção dos navios inicie só no ano que vem, já é grande a movimentação de profissionais do setor deixando currículo no estaleiro Oceana. Uma placa, no portão da empresa, indica a escolha para a produção dos navios para a Marinha brasileira, e a geração futura de vagas.

Na segunda-feira, quatro dias após o anúncio de que o estaleiro vai construir as embarcações, Adilson Almeida, 32 anos, deixou currículo na empresa. Com sete anos de experiência no setor, onde atuou na construção de módulos para plataformas de petróleo, ele hoje está empregado como ajudante em um terminal logístico.

– Tenho vontade de voltar para o setor naval. A gente vem acompanhando desde que soube que o Oceana estava concorrendo – comentou.

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É um sopro de otimismo em um setor que já teve uma demanda de trabalhadores tão alta, menos de uma década atrás, que as empresas anunciavam as vagas abertas em carros de som pela região. Itajaí e Navegantes têm tradição na indústria naval, e uma mão de obra treinada, que se torna um ativo importante dos estaleiros na busca por novos negócios.

– São trabalhadores especializados, diferenciados. E há toda uma cadeia de prestadores de serviço e fornecedores que vão se instalar – espera o prefeito de Itajaí, Volnei Morastoni (MDB), que acompanhou de perto o longo período de concorrência pública, que iniciou em 2017.

Em fevereiro, o embaixador da Alemanha, Georg Witschel, e o cônsul Thomas Schmitt chegaram a visitar o governador Carlos Moisés em busca de apoio para a negociação. Embora a decisão tenha levado em conta critérios técnicos, Santa Catarina terá retorno econômico com a contratação.

Armamento
Armamento (Foto: Reprodução)

Armamento de última geração integra projeto

Os navios que serão construídos em Itajaí pelo consórcio Águas Azuis são corvetas Classe Tamandaré, com 170 metros de comprimento, 15 metros de boca, e forte arsenal militar – inclusive antiaéreo. As embarcações serão equipadas com mísseis, metralhadora, sistema de despistamento, sonar, radar e sensores de última geração.

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O design e o revestimento, por exemplo, são projetados para dificultar a detecção por sensores de rastreamento. Os navios terão capacidade “stealth” (de furtividade), para despistar eventuais inimigos. A compra faz parte de um programa estratégico da Marinha,de Construção do Núcleo do Poder Naval, e demandou uma longa concorrência de 15 meses, que envolveu empresas interessadas em todo o mundo.

Sensores
Sensores (Foto: Reprodução)

O projeto escolhido tem como base a corveta alemã Meko A100, adaptada para as necessidades da Marinha do Brasil. A construção prevê transferência de tecnologia entre as empresas alemãs e brasileiras que integram o negócio, o que pode capacitar a indústria naval catarinense para novos projetos. Está previsto o treinamento de trabalhadores brasileiros na Alemanha, para tocar o projeto.

A Marinha do Brasil determinou, ainda, que cada embarcação tenha, no mínimo, 30% a 40% de conteúdo nacional – o que promete movimentar os fornecedores em torno da construção dos navios.

– Tendo sucesso, espera-se que a Marinha precise mais ativos, mais embarcações no futuro. Abrem-se portas para construir mais para a Marinha brasileira e para outros países também. É um alento – diz o gerente do estaleiro Oceana, Paul Kempers.

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Saiba mais

– O Consórcio Águas Azuis é fomado pela Atech Negócios em Tecnologias, Embraer e Thyssenkrupp Marine Systems. São subcontratadas a Atlas Elektronik, Estaleiro Aliança/Oceana, e M3 Mapps.

– Os termos do contrato seguem em negociação até a assinatura, no fim do ano. O valor de US$ 1,6 bilhão pode saltar para até US$ 2 bilhões.

– Os dois mil empregos previstos devem ser gerados gradativamente, conforme avance a construção das corvetas.

Os navios

Comprimento – 107,2 m

Boca Máxima (largura) – 15,95 m

Calado – 5,2 m

Deslocamento – 3455 ton

Propulsão – 4 Motores MAN 12V 28/33 DSTC

Velocidade Econômica – 14 nós

Energia Elétrica – 4 Diesel Geradores Caterpillar C32