Um simpático casal de gringos sentou ao lado de nossa mesa na noite passada, em uma cervejaria. Australianos, estão viajando pela América do Sul e tinham acabado de chegar da Argentina. A passagem por Santa Catarina não estava nos planos, foi recomendada pelos amigos que eles fizeram no país vizinho. São “do eletrônico”, os gringos. Vieram conhecer o Warung.

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Puxei conversa para pedir desculpa: nossos cachorros, sem cerimônia, invadiam o espaço sob a mesa dos australianos. Os gringos não se importavam. Gostam de bicho. Quiseram saber mais sobre os dois peludos que, a essa altura, cansados da caminhada, dormiam a sono solto.

Queriam saber também do Brasil. Se a economia ia tão mal quanto a da Argentina, onde lamentaram a situação dos nossos hermanos. Se nós, brasileiros, estamos satisfeitos com a política ambiental.

Contaram que a situação da ensolarada terra dos cangurus os deixa sem chão. Falaram do incêndio que devasta a floresta e – veja só – da demora do governo para tomar uma atitude. O alto escalão, por lá, nega a crise climática. Aqui, em terras tupiniquins, temos chamado aquecimento global de “trama marxista”. É a globalização do absurdo.

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Estavam assustados, os australianos, com as estranhas políticas de defesa da liberdade religiosa no país da Oceania. A Austrália, que já foi referência na defesa dos direitos dos LGBTs, discute agora se as escolas religiosas podem negar alunos e funcionários gays. Em nome de Deus.

Eles descobriram que, no Brasil, o grande projeto para a Educação é militarizar as escolas. Queriam entender por quê, se indisciplina e problemas com drogas não são problema exclusivo dos adolescentes brasileiros. Nem por isso, militares são escalados para cuidar dos colégios no resto do mundo civilizado, lembraram os gringos. Pois é.

O rapaz australiano tem família na Inglaterra, e falou sobre o impacto que o Brexit causou na sociedade por lá. Os britânicos estão divididos. Quem não é a favor de sair da União Europeia, é contra. E ninguém se entende. Não te parece, caro leitor, um pouco com o Brasil?

Os australianos queriam saber se, por aqui, se visualiza algum caminho de consenso e pacificação. Respondi que, hoje, ela parece cada vez mais distante.

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Lamentamos juntos o fato de assistirmos, de diferentes pontos do globo, o planeta girar perigosamente para trás. E o fato das ameaças virem em comboio, como numa conspiração delirante.

Um suspiro. Outro gole de cerveja.

Eles dizem, então, que estão surpresos com a hospitalidade e a beleza do Brasil. Tinham experimentado um dia perfeito, de céu azul, muito calor e mar convidativo. Respondo que não há lugar melhor no mundo. E me convenço de que, para cada sinal de retrocesso, para cada aperto no peito, ainda temos uma natureza exuberante. E um oceano de possibilidades.

Para enfrentar um mundo às avessas, experimente uma boa conversa, uma cerveja gelada e um dia de sol. Não há desesperança que resista.